segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Supremo julga acesso a informações fiscais

VALOR ECONÔMICO - LEGISLAÇÃO & TRIBUTOS
  Supremo julga acesso a informações fiscais
 
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu julgar, em repercussão geral, o direito de os contribuintes terem acesso aos dados da Receita Federal por meio de um recurso, até agora, pouco utilizado no direito tributário: o habeas data. O instrumento previsto na Constituição Federal garante acesso a informações de banco de dados de entidades governamentais ou de caráter público. 

No caso que será analisado, a Receita negou a uma empresa de Minas Gerais o acesso a valores recolhidos e de dívidas registradas em seu nome desde 1991, que constam do Sistema de Conta Corrente de Pessoa Jurídica (Sincor). O contribuinte quer saber se fez pagamentos a mais e tem direito a créditos fiscais. Na resposta, a Receita justificou que é de responsabilidade da empresa ter o controle das informações, que ela mesma fornece ao Fisco. 

Ao julgar o caso, o Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região rejeitou o pedido de habeas data por outro motivo. Para os desembargadores, o banco de dados da Receita não se enquadra na hipótese de cadastro público. 

O Supremo já havia analisado o mérito de um habeas data. Em 2010, a ministra Cármen Lúcia decidiu que o Sincor é de uso interno da Receita Federal e "não se reveste de caráter público". Afirmou ainda que não se pode confundir registro público com "registro existente em repartição pública". 

O entendimento do Judiciário, porém, não é unânime. Em 2010, a Justiça de Minas Gerais concedeu a uma empresa o direito de obter da Receita o valor do prejuízo fiscal que teve em novembro de 2008. A informação foi requisitada por causa do Refis da Crise, que deu a oportunidade de o contribuinte quitar juros e multa de débitos com prejuízo fiscal. Em fevereiro, uma empresa de telecomunicações conseguiu em São Paulo acesso a dados de uma certidão fiscal. 

Embora utilizem pouco o habeas data, tributaristas defendem o amplo acesso ao banco de dados da Receita. Segundo Aldo de Paula Junior, do escritório Azevedo Sette, o direito é garantido pelo princípio da publicidade, que só pode ser afastado se houver restrição à intimidade de outras pessoas. "É surpreendente ainda estarmos nessa discussão quando o Brasil já tem uma lei de acesso à informação genérica", diz. 

Em nota, o procurador da Fazenda Nacional Augusto Leal afirma que o Sincor é de uso privativo do Fisco e que os contribuintes têm acesso, na via administrativa, a cópias de declarações fiscais apresentadas. "Não é necessário sobrecarregar ainda mais a Justiça com esse tipo de ação", afirma. 

Bárbara Pombo - De Brasília

Novas normas contábeis dão transparência e crédito


FILIPE OLIVEIRA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

 

Desde 2008, as Normas Internacionais de Contabilidade (IFRS, do inglês) são o padrão de contabilidade oficial do Brasil.

Porém, apesar de sua obrigatoriedade e de haver uma versão resumida da IFRS para pequenas e médias empresas, ainda são poucas as que fornecem balanços nesse padrão.

O panorama tende a mudar com a maior exigência do mercado e a utilização desses balanços para fins tributários no futuro.

Quem se adapta às novas normas pode se beneficiar com relatórios mais apurados sobre a real situação da empresa e fornecer informações mais consistentes para investidores e bancos.

Para Adriano Gilioli, conselheiro do CRC-SP, a baixa adesão se deve em parte à cultura do empresário brasileiro, que ainda tende a ver a contabilidade como algo que é feito apenas para pagamento de impostos.

Outro fator de desmotivação é o fato de que, para fins de tributação, a IFRS ainda não é utilizada plenamente.

Há no Brasil um Regime Transitório de Tributação (RTT) que diz que, para pagamento de impostos, vale a contabilidade feita até 2007.

Porém a lei que institui o regime perde sua validade em 2013. Isso dará novo impulso para maior adequação das empresas, diz Gilioli.

VALORES JUSTOS

Charles Holland, diretor-executivo da Anefac, resume as diferenças da contabilidade antiga para a nova: "Agora é necessário pensar mais para encontrar valores justos".
Dessa forma, o valor de um imóvel, por exemplo, dependerá de seu valor real no mercado, e não de uma taxa fixa e padronizada de depreciação.

Para o gerente de negócios da FTI Consulting, Luis Fagundes, o novo padrão de contabilidade traz aos balanços um nível maior de transparência.

Dessa forma, acionistas, instituições financeiras e o próprio empresário terão condições de tomar melhores decisões sobre a empresa, afirma Fagundes.

"O atrativo principal é a questão do crédito. Os bancos estão preparados para ler os balanços em IFRS."

CUSTOS

Para Marcello Lopes, sócio da LCC Auditores e Consultores, o processo de adaptação à IFRS depende de algumas mudanças na gestão do negócio.

Segundo ele, para fornecer as informações exigidas, o empresário muitas vezes deve ter controles melhores, informações mais adequadas, especialmente no que se refere a controle de estoque, controle de entrada e saída e das informações do departamento financeiro.

Fagundes estima que o custo para elaborar o balanço em IFRS seja atualmente o de realizar uma contabilidade paralela.

MAIS CRÉDITO

Francisco Romano, 55, era gerente-geral da Biosep, empresa do ramo de biodiesel, quando foi orientado pelo auditor a adequar os balanços à IFRS em 2010.

Apesar de a empresa ter capital fechado, estar de acordo com as normas foi importante para conseguir linhas de crédito com a Petrobras e empréstimos em bancos.

"Você passa a ver de forma global os resultados da empresa. Melhora a interpretação dos resultados", diz.

Editoria de Arte/Folhapress
NORMAS INTERNACIONAIS - O que são e quais as vantagens de ter os balanços da empresa adequados
NORMAS INTERNACIONAIS - O que são e quais as vantagens de ter os balanços da empresa adequados

 
Folha de S.Paulo

PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO COM ÁGIO É ALVO Nº 1 DO FISCO

AUTUAÇÕES BILIONÁRIAS


Por Alessandro Cristo

O aproveitamento do ágio interno, gerado em operações societárias dentro do mesmo grupo empresarial como forma de burlar a cobrança de Imposto de Renda e Constribuição Social sobre o Lucro Líquido, é hoje o principal alvo da Receita Federal. Com autuações que somam anualmente R$ 100 bilhões, esse tipo de planejamento tributário, já tido pelo fisco como uma nova "tese tributária", é o inimigo público número 1, ao lado do abatimento de insumos indevidos no cálculo do PIS e da Cofins não cumulativos e do envio não tributado de lucros a coligadas e subsidiárias no exterior. A afirmação é do procurador-chefe da Fazenda Nacional no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, Paulo Roberto Riscado Júnior (foto).

Em palestra feita em São Paulo nesta quinta-feira (1º/11), oprocurador falou sobre a proliferação de planejamentos tributários com operações societárias fictícias para gerar ágio e abater tributos. "É uma decisão perigosa. A chance de se ganhar um auto de infração é de 99% e o lançamento tributário é ótimo: glosa-se o ágio usado, tributa-se o ganho de capital da operação e aplica-se multa agravada", alertou.

O assunto foi discutido no III Seminário do Instituto Cidadania Tributária, organizado em São Paulo para debater questões controvertidas no Carf. Além de Riscado, estiveram presentes nomes de peso no ramo tributário como o professor Eliseu Martins, da Faculdade de Economia e Administração da USP; Heleno Taveira Torres, professor de Direito Tributário da USP; Roberto Quiroga Mosquera, professor da FGV e CEO do escritório Mattos Filho Advogados; Eurico Marcos Diniz de Santi; também professor da FGV; e o presidente do Carf, Otácílio Cartaxo, entre outros.

A discussão gira em torno do ágio absorvido nas operações de aquisição de empresas. A Lei 9.532/1997 permite que o valor a mais pago pela compradora por conta da rentabilidade futura do negócio, estimada por quem vende, possa ser deduzido, como despesa, da base de cálculo do IRPJ e da CSLL. Na época em que foi editada, a norma tinha como objetivo incentivar as privatizações.

O uso do ágio era tabu até 2010, quando o dilema foi julgado pelo Carf. A decisão, que beneficiou o laboratório Diagnósticos da América S/A (Dasa) em operação que envolveu a compra da concorrente Delboni, declarou perfeitamente possível deduzir da base de cálculo dos tributos valores pagos a mais na aquisição de companhias. De acordo com a Lei 9.532, o contribuinte pode parcelar a amortização, a cada mês, à fração de 1/60 do valor do ágio, quando tiver lucro tributável. A Receita pode, no entanto, considerar o aproveitamento ilegítimo.

Gerdau, Vivo e Santander também conseguiram decisões paradigmáticas no Conselho. No caso do banco espanhol, a cobrança por aproveitamento indevido de ágio pela compra do Banespa chegava a R$ 4 bilhões.

No entanto, o assunto ainda não está pacificado. O fisco, que acumula acórdãos favoráveis, permanece dizendo que é preciso comprovar, nessas operações, o propósito negocial da mudança societária. Ou seja, economizar em tributos deve ser uma consequência, não um objetivo. É a chamada "substância econômica" que importa, não a formalidade jurídica. Já para os contribuintes, a lei protege a liberdade de autoorganização e não diferencia as operações em "genuínas" e "fictícias". Não pode haver interpretação econômica de operações societárias. No bordão doutrinário, a tipicidade é "cerrada".

Para Riscado, o entendimento dos contribuintes pela interpretação literal da lei coloca o fisco contra a parede, o que pode se voltar contra as próprias empresas. "Isso leva a uma produção exagerada de leis e à redação de hipóteses abertas de incidência tributária, que delegam ao fisco a interpretação do que deve ou não ser cobrado", afirma. Como exemplo, ele citou as leis 10.637/2002 e 10.833/2003, que criaram o regime não-cumulativo para o recolhimento do PIS e da Cofins, mas deixaram em aberto o que são insumos dedutíveis da base de cálculo dos tributos. Há intenso debate questionando se a lista de insumos mencionada nas leis é exaustiva ou exemplificativa.

Segundo o procurador, porém, nem todo ágio gerado dentro do grupo societário é proibido. Basta que se prove que a operação não é artificial e que a avaliação do ágio por auditoria externa seja confiável.

"Pensar o contrário é admitir que a lei positivou um ágio claramente artificial, como se o governo tivesse dado uma subvenção ao contribuinte, mediante o oferecimento de uma despesa fictícia dedutível, uma espécie de renúncia fiscal", disse. "Se a contabilidade, seguindo a ética, é obrigada a ver a operação como artificial, o direito vai fechar os olhos e atentar só para o formalismo?" 

Alessandro Cristo é editor da revista Consultor Jurídico

Revista Consultor Jurídico, 3 de novembro de 2012