10 de outubro de 2011
O prazo para o exercício dos direitos tributários é um tema polêmico. Todos querem maximizar benefícios: o Fisco no desejo de esticar o prazo ao máximo para cobrar tributos e os contribuintes pretendendo reduzi-lo ao mínimo para diminuir o risco de autuação.
Em um estado democrático de direito, o exercício dos direitos é limitado no tempo, em nome da segurança jurídica que deve garantir a certeza e a previsibilidade nas relações tributárias. Surgem a decadência e a prescrição, temas sobre os quais nunca houve consenso na doutrina ou na jurisprudência.
O Judiciário definiu o assunto. Nem todos concordam com o resultado, mas é melhor haver regras claras do que perdurar a indefinição das interpretações subjetivas.
Os novos institutos da repercussão geral (SupremoTribunal Federal – STF) e recurso repetitivo (Superior Tribunal de Justiça – STJ) perenizam uma interpretação, evitando divergência nas instâncias judiciais e administrativas. Registre-se que, em nome da agilidade e eficiência, foi editada a Portaria MF nº 586, de 2010, impondo aos julgadores administrativos o dever de cumprir o decidido pelo STF e pelo STJ.
As saudáveis balizas começaram com o STF (RE 556.664 – repercussão geral), decidindo que apenas lei complementar pode reger a decadência e a prescrição. Nenhuma lei ordinária poderá estender o limite quinquenal ou criar hipóteses de suspensão ou interrupção de prescrição. Tal lei complementar, o Código Tributário Nacional (CTN), deverá ser seguida por todos os entes federativos. Assim, chega-se ao equilíbrio: cinco anos para constituição e exercício de direitos tanto para o Fisco como para o contribuinte.
Alguns julgadores insistem em ignorar o que foi decidido pelo STJ
Outra grande controvérsia era a definição do marco inicial da contagem dos prazos, o que agora também ficou estabelecido pelo STJ, que tem competência para tanto (vide recente AI 808.332).
O STJ, após despacho monocrático do ministro Luiz Fux, em 18 de maio de 2009, demarcou o que seria decidido em recurso repetitivo no REsp 973.733: a) termo inicial para a decadência; b) quando não há declaração ou pagamento; c) dirimir controvérsia sobre a conhecida tese dos cinco mais cinco.
Assim foi julgado em 12 de agosto de 2009 que: a) se não houver declaração ou pagamento, o prazo decadencial para o lançamento de ofício conta-se do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado (artigo 173, I, do CTN); b) sendo certo que o primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado corresponde ao primeiro dia do exercício seguinte à ocorrência do fato gerador; e) é inadmissível a cumulação de cinco mais cinco anos.
Chama-se a atenção para a não aplicação do artigo 173, I, aos casos em que há pagamento ou declaração, aos quais se aplica o artigo 150, parágrafo 4º (cinco anos do fato gerador). Enterra-se de vez a interpretação de que apenas o pagamento afasta o artigo 173, I. A simples declaração tem o mesmo efeito, não tendo o STJ feito qualquer distinção. Portanto, não caberá ao intérprete distinguir, importa apenas que a declaração dê conhecimento ao Fisco de fatos relacionados ao tributo; o que é igual no caso do pagamento, pois qualquer valor, ainda que mínimo (0,01) já afasta a incidência do artigo 173, I, do CTN.
Essa inovação está em linha com a modernidade da escrituração eletrônica, do acompanhamento das empresas pelo sped e com as 36 declarações que devem ser prestadas pelos contribuintes, suficientes para o Fisco acompanhar a vida de todos full time. Note-se, ainda, que quando a lei passou a exigir antecipações de impostos (estimativas e carnê-leão) e criou períodos trimestrais e mensais, paralelamente estava encurtando prazos para o Fisco, pois este já pode conhecer antecipadamente fatos que possibilitam o exercício de direitos. São ônus e bônus.
Quanto à prescrição, o STJ também já decidiu (REsp 1.120.295 – recurso repetitivo – 12.05.2010) que o prazo para a Fazenda executar judicialmente os créditos tributários é de cinco anos (artigo 174 do CTN), contados da data do vencimento para o pagamento da obrigação no caso de o contribuinte haver apresentado declaração. É que não havendo pagamento a declaração já pode ser executada.
A decisão do STJ é importante, também, no caso de tributos já pagos ou parcelados, inclusive no Refis IV, pois se já tinham sido alcançados pela decadência ou prescrição poderão ser objeto de restituição ou redução do parcelamento, inclusive questionados judicialmente (REsp 1.133.027).
Apesar de tudo estar expressamente definido, alguns julgadores insistem em desconhecer o decidido pelo STJ, para entender que só com o pagamento é que poderá ser aplicado o prazo do artigo 150, parágrafo 4º do CTN. Com isso, provocam-se mais litígios, pois os contribuintes irão recorrer ao Judiciário alegando violação da legalidade e do Regimento do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf).
Esperamos que a decisão do STJ seja definitiva e cumprida, independentemente da posição doutrinária assumida. É que se teme a máxima de que no Brasil "até o passado é incerto" – lembranças da Cofins das sociedades civis. Só resta a todos cumprir o decidido para buscar um melhor entendimento entre Fisco e contribuintes, que resulte em amansar o leão e acalmar as inquietudes dos contribuintes.
Mary Elbe Queiroz, Valor Econômico