segunda-feira, 2 de abril de 2012

Recurso do MPF contra ilegalidade de quebra de sigilo baseada em relatório do Coaf vai ao STF


O vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Felix Fischer, admitiu recurso extraordinário do Ministério Público Federal (MPF) contra decisão da Sexta Turma do Tribunal que decretou a ilegalidade da quebra de sigilo baseada apenas em relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). O caso será agora remetido ao Supremo Tribunal Federal (STF).

A decisão da Sexta Turma foi tomada no julgamento de habeas corpus impetrado em favor de João Odilon Soares Filho, investigado em operação da Polícia Federal que também envolve Fernando Sarney (filho do presidente do Senado, José Sarney) e sua mulher, Teresa Cristina Murad Sarney. As investigações começaram em 2006, para apurar suspeitas de lavagem de dinheiro e crimes contra a ordem tributária no Maranhão.

Para a Sexta Turma, o relatório de inteligência financeira do Coaf indica apenas movimentações atípicas, sem indicar a ocorrência de crimes. E a polícia não teria demonstrado a impossibilidade de uso de outros meios de investigação que não a quebra de sigilo bancário, fiscal e telefônico.

Conforme os ministros do colegiado, a quebra do sigilo foi a verdadeira origem da investigação e foi usada sem demonstração concreta de sua necessidade. A Sexta Turma, em setembro de 2011, considerou que todas as provas decorrentes da quebra de sigilo irregular também estavam contaminadas pela ilegalidade, e não poderiam ser usadas no processo.

Para o MPF, a decisão viola diversos dispositivos da Constituição Federal. Por isso, o caso deveria ser analisado pelo STF. O MPF alega que o argumento da Sexta Turma quanto ao esgotamento de outros meios de prova, como condição para a quebra de sigilo, é "frágil" e "insustentável".

A decisão do ministro Felix Fischer, publicada nesta segunda-feira (2) no Diário da Justiça, reconheceu a existência dos pressupostos de admissibilidade do recurso, como a preliminar formal de repercussão geral, e determinou a remessa dos autos ao Supremo.

HC 191378

Fazenda não pode exigir diferença de taxas de juros

VALOR ECONÔMICO - LEGISLAÇÃO & TRIBUTOS
 
A 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que é ilegal exigir do contribuinte o pagamento de um complemento sobre depósito judicial, quando o valor apresentado corresponder à integralidade do débito tributário em discussão. A decisão é um importante precedente contra prática adotada por alguns Estados, com a redução gradual da taxa básica de juros (Selic) pelo Banco Central. Eles cobram a diferença entre o valor do depósito, atualizado normalmente pela Selic, e o montante que seria gerado com a aplicação de taxas mais altas, estabelecidas por leis estaduais para a correção de impostos. Cabe recurso da decisão. 

O depósito judicial garante ao Fisco o pagamento do débito tributário em caso de derrota do contribuinte. Na decisão, o ministro relator Benedito Gonçalves entendeu que a apresentação dessa garantia impede que o contribuinte venha a ser surpreendido com a cobrança de qualquer outro ônus financeiro decorrente do atraso no pagamento do débito tributário. "O contribuinte é parte ilegítima para responder demanda que busca questionar diferenças de correção monetária sobre depósito judicial por ele realizado", declarou Gonçalves em seu voto, que foi seguido pelos demais ministros. "A discussão sobre a correção monetária do depósito deve ser travada diretamente contra a instituição financeira." 

Os ministros julgaram um recurso do Estado de Minas Gerais contra a Datamed Instrumentos Científicos e Médicos. A Procuradoria-Geral do Estado (PGE) quer receber o complemento do valor depositado pela empresa em juízo, corrigido por índice inferior à Selic. Por meio de nota, o órgão informou que o caso está sob análise. 

O entendimento favorável ao contribuinte pode ser aplicado em discussões semelhantes e nortear decisões das instâncias inferiores, segundo o advogado Pedro Gomes Miranda e Moreira, do escritório Celso Cordeiro de Almeida e Silva Advogados. "O contribuinte cumpriu com a parte dele ao fazer o depósito judicial. Assim, não pode arcar com esse ônus", afirma. 

Na Justiça Federal, de acordo com o tributarista Maurício Faro, do escritório BM&A Advogados, não há esse problema. Os depósitos são feitos na Caixa Econômica Federal (CEF) e vão para o Tesouro Nacional, com a aplicação automática da Selic. "Na Justiça Estadual, vale o que determina a lei local. Por isso, há quem diga que o Estado deveria cobrar essa diferença do banco", diz. 

Segundo Carlos Pelá, diretor setorial tributário da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), somente instituições financeiras públicas recebem depósitos judiciais, e todas aplicam a correção determinada pela legislação. Para o advogado Luiz Roberto Peroba Barbosa, do escritório Pinheiro Neto Advogados, a decisão é correta do ponto de vista técnico porque, se o contribuinte fez o depósito integral, não está em atraso, segundo o Código Tributário Nacional (CTN). "Essa diferença de valores não tem nenhuma relação com ele", afirma. 

No Ceará, por exemplo, a legislação determina a aplicação do índice da poupança para a correção de depósitos judiciais. "Cada Estado tem liberdade para estabelecer um índice de correção de débitos tributários. Esse valor só não pode ultrapassar a Selic", explica o advogado tributarista Júlio de Oliveira, do escritório Machado Associados. 

Em São Paulo, por meio da Lei nº 13.918, de 2009, a Fazenda deixou de cobrar a Selic e passou a aplicar juros de mora de 0,10% a 0,13% ao dia sobre débitos tributários. "É uma taxa extremamente elevada, que pode chegar a quase 40% ao ano", afirma o advogado Igor Mauler Santiago, do escritório Sacha Calmon e Misabel Derzi Consultores e Advogados. Por isso, o advogado teme que, se o contribuinte perder um processo, a Fazenda passe a cobrar essa diferença entre o valor do depósito, corrigido pela Selic, e o montante que seria gerado com a aplicação do índice instituído pela Lei 13.918. "A medida poderá inibir o uso de depósito judicial para garantia de débito fiscal", diz. 

Hoje, a Procuradoria-Geral do Estado de São Paulo (PGE-SP) não faz a cobrança judicial dessa diferença. A informação é do subprocurador-geral do Estado, Eduardo José Fagundes. "Se o depósito é integral, ele suspende a exigibilidade do crédito tributário na data em que é depositado. Se não é integral, ele não suspende a exigibilidade. Mas com o levantamento do crédito, fica caracterizado que houve pagamento espontâneo", afirma Fagundes. 

Laura Ignacio - De São Paulo
02.04.2012