Existe exportação de serviços? | |
Elaborado em 09/2013 Dentro da política de que não se deve exportar tributos para o exterior o inciso II, do § 3º, doart. 156 da CF, relativamente ao ISS, determina que cabe à lei complementar "excluir da sua incidência exportação de serviços para o exterior." Posto que o ISS não grava o serviço, mas a sua efetiva prestação, tem-se em uma interpretação literal que aConstituiçãodetermina a exoneração por lei complementar da tributação pelo ISS a prestação de serviços no exterior, o que não passaria de uma declaração acaciana. Só se exonera da tributação algo que a ela está sujeito e não aquilo que está fora do alcance da tributação pelas leis brasileiras que só surtem efeitos no território nacional. Apenas um tratado ou uma convenção internacional às avessas poderia possibilitar a dupla tributação dos serviços postados n'um e n'outro território. Considerando que a Constituição não contém, nem deve conter dispositivos inúteis, cabe ao intérprete conferir àquele texto constitucional uma interpretação que confira algum efeito jurídico. Pela interpretação sistemática das normas constitucionais e pela interpretação teleológica chega-se à conclusão de que a Carta Política manda exonerar da tributação os serviços contratados por pessoas físicas ou jurídicas domiciliadas no estrangeiro, mediante pagamento do respectivo preço por fonte igualmente situada no exterior do país. É a única interpretação cabível, não sendo possível cogitar-se de exportar serviços ou exportar a sua prestação, pois eles não são passíveis de viagem, como acontece com as exportações de produtos industrializados e de mercadorias, para exonerar da incidência do IPI e do ICMS, respectivamente. É que o IPI e o ICMS resultam de operações que se traduzem por uma obrigação de dar, ao passo que o ISS resulta de uma operação que se traduz por uma obrigação de fazer. Serviço significa esforço humano que resulta na produção de um bem imaterial para a fruição do tomador. Na obrigação de dar é possível a destinação de produtos ou mercadorias ao exterior. Na obrigação de fazer que gera o serviço, ou seja, o ato de servir ou prestar serviço, não é passível de exportação. Contudo, essa única interpretação constitucional possível restou invalidada peloart. 2º da Lei Complementar nº 116/03que assim dispôs: "Art. 2º. O imposto não incide sobre: Ao invés de conferir à norma constitucional a única interpretação cabível para a exoneração do ISS, o preceito da lei complementar, confundindo o resultado com o efeito, torna letra morta aquele preceito da Constituição, bem como a sua própria prescrição. Ora, quando o prestador aqui localizado executa um serviço, o resultado só pode ser produzido aqui. Só que a execução do serviço, por si só, não gera a obrigação de pagar imposto. É preciso que esse serviço executado surta efeito imediato em relação ao tomador. Se o tomador não puder usufruir do serviço contratado não haverá prestação de serviço e assim não ocorrerá o fato gerador do ISS. É o caso, por exemplo, de um consulente contratar a elaboração de um parecer jurídico. Ainda que pronto e acabado o parecer, portanto, produzido o resultado, o fato gerador do ISS somente ocorrerá com a fruição desse parecer jurídico pelo tomador, o que pressupõe a sua entrega ao encomendante. Implícita está a obrigação de dar (atividade meio) para concretizar a obrigação de fazer (atividade fim). Um exemplo poderá aclarar melhor as ideias na questão sob exame. Quando um tomador domiciliado no exterior contrata os serviços de um artista plástico aqui residente para pintar um determinado quadro, a prestação efetiva de serviço somente acontecerá quando o tomador receber o quadro (resultado da ação do pintor) para a fruição de seus efeitos imediatos. Se o quadro (resultado) continuar no atelier do artista plástico não haverá prestação de serviço, donde se conclui que o fato gerador só ocorrerá no exterior, hipótese em que a lei brasileira não poderá alcançar aquele fato gerador, por força do princípio da territorialidade das leis. Somente mediante tratado ou convenção, às avessas, como dissemos, poderá ser tributado o serviço prestado no exterior do País. Confesso que o tema não é fácil. No nosso livro "ISS doutrina e prática" escrito em 2008, seguindo a doutrina majoritária, sustentamos a tese também adotada pela jurisprudência do STJ no sentido de que haverá exoneração do ISS sempre que o serviço executado surtir efeito no exterior como, por exemplo, a elaboração de um projeto de usina hidroelétrica a ser construída no exterior. Outros autores citam exemplos de pesquisas de mercado encomendadas por uma empresa localizada no exterior para, mediante análise dos dados pela sua Diretoria Executiva, decidir quanto ao investimento ou não do Brasil. Nesses casos não haveria incidência do ISS porque o resultado (na verdade, efeito) seria produzido no exterior. A afirmativa não está incorreta, porém a não incidência nesses casos não deriva da norma doart. 2º, II da Lei Complementar nº 116/03, mas da inocorrência do fato gerador no Brasil e sim no exterior. Esse novo posicionamento nosso mantém a coerência com o que afirmamos a respeito da incidência do ISS sobre os serviços procedentes do exterior, como determina o § 1º, doart. 1º da Lei Complementar nº 116/03. Conforme afirmamos: "Esse preceito viola, às escâncaras, o princípio da territorialidade das normas, ligado ao aspecto espacial do fato gerador da obrigação tributária, ou seja, onde ocorre o fato gerador concretamente. Serviço prestado no exterior não pode gerar efeito jurídico no território municipal do Brasil, a menos que haja um tratado ou convenção internacional, bilateral ou multilateral, firmado, às avessas, não para evitar a dupla tributação, como acontece na área do imposto de renda, mas para possibilitar a dupla incidência tributária." (01) Mas, certamente, muitas tintas serão gastas até a pacificação dessa controvertida matéria suscitada pela má redação do texto constitucional sob exame. Nota (01) Cf. nosso ISS doutrina e prática. São Paulo: Atlas, 2008, p. 40.
Kiyoshi Harada Sócio fundador da Harada Advogados Associados. Especialista em Direito Tributário e em Ciência das Finanças pela FADUSP. Professor de Direito Financeiro, Tributário e Administrativo. Presidente do Centro de Pesquisas e Estudos Jurídicos - CEPEJUR. Conselheiro do Instituto dos Advogados de São Paulo e ex-Diretor da Escola Paulista de Advocacia.
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segunda-feira, 27 de janeiro de 2014
Existe exportação de serviços?
Mais um vez, contribuinte ganha briga pela cobrança do IPI
NÃO-CUMULATIVIDADE
Mais um vez, contribuinte ganha briga pela cobrança do IPI
Por Livia Scocuglia
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Mais uma vez os contribuintes saíram ganhando na briga pela cobrança do Imposto sobre Produtos Industrializados na revenda de mercadorias importadas. No Tribunal Regional Federal da 1ª região, o argumento pela não exigibilidade do imposto é fundamentado no artigo 557 do Código de Processo Civil, que libera o relator de dar provimento ao recurso, caso a decisão recorrida esteja em confronto com súmula ou jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal.
Essa decisão, segundo Augusto Fauvel de Moraes, do escritório Fauvel e Moraes Sociedade de Advogados, demonstrou que a decisão está pacificada, no sentido de que pessoa física não deve pagar IPI na importação de veículo para uso próprio.
No caso, o pedido para declarar a inexigibilidade do IPI na importação para pessoa física para uso próprio foi negado em primeira instância. O fundamento foi de que não pode haver distinção de pessoa física e jurídica na incidência do IPI.
O contribuinte recorreu ao TRF-1 com Agravo de Instrumento e fez o pedido de antecipação de tutela dentro do recurso. Dessa vez, o tribunal decidiu pela não incidência do tributo. Foi dada a liminar que autorizou o desembaraço aduaneiro sem incidência do IPI, com base no princípio da não-cumulatividade.
A Fazenda então recorreu dessa liminar e interpôs Agravo Regimental. Para ela, a legislação tributária prevê que importador é toda pessoa que promove a entrada de mercadoria estrangeira no território nacional — não importa se é pessoa física ou pessoa jurídica de fins civis ou comerciais. Para o fisco, todos são contribuintes.
Entretanto, o TRF-1 manteve o entendimento e negou provimento ao agravo da Fazenda. O relator, desembargador Reynaldo Fonseca, usou vários julgados para fundamentar o seu voto. Em todos eles foi citada jurisprudência do STF e do Superior Tribunal de Justiça que "abona a não incidência de IPI sobre a importação de veículo por pessoa física não comerciante e não empresária", diz um dos julgados.
A não incidência do IPI vale para qualquer importação feita por pessoa física para uso próprio, podendo ser veículos, aeronaves, embarcações, motocicletas, entre outros. "Os contribuintes pessoa física que recolheram o IPI, poderão pleitear a restituição, caso não tenha ultrapassado cinco anos da data do registro da Declaração de Importação", alerta o advogado.
Discussão antiga
A possibilidade de cobrar IPI na revenda de importados causa divergência nos tribunais brasileiros. Desde 2006, o entendimento mantido em todos os julgados era o da 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, firmado no Recurso Especial 841.269, favorável aos contribuintes. O argumento principal que fundamenta a decisão pela não incidência de IPI na revenda de produtos importados era a vedação à bitributação. Ou seja, tratando-se de empresa importadora, o fato gerador ocorre no desembaraço aduaneiro, não sendo viável nova cobrança do IPI na saída do produto por comercialização.
Entretanto, em novembro de 2013 a 2ª Turma do mesmo tribunal entendeu que o IPI deve ser tributado tanto na importação quanto no momento da saída do mesmo produto do estabelecimento importador. Esse entendimento foi seguido pela 8ª Vara Federal de São Paulo em decisão de novembro.
Nesse último caso, o juiz Clecio Braschi afirmou que o Código Tributário Nacional diz serem contribuintes tanto o importador quanto quem coloca o produto no mercado. Sendo assim, são dois fatos geradores. "Não tem relevância o fato de o importador ter recolhido o IPI na importação, quando do desembaraço aduaneiro do produto industrializado importado, tampouco não tê-lo industrializado antes da saída desse produto do estabelecimento para venda no mercado interno. A Constituição do Brasil autoriza a tributação de produtos industrializados, e não apenas a operação de industrialização do produto", afirmou Braschi.
O precedente da 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça levava o assunto pelo mesmo caminho. Para a turma, o imposto é devido tanto na importação quanto no momento da saída do estabelecimento comercial para os varejistas. Isso porque o fato de o nome do tributo ser "Imposto sobre Produtos Industrializados" não significa que seu fato gerador esteja necessariamente atrelado a uma imediata operação de industrialização.
Para o ministro Mauro Campbell Marques, relator do processo na 2ª Turma do STJ, a incidência do tributo sobre o produto industrializado significa apenas que é necessário que essa operação de industrialização em algum momento tenha ocorrido, "pois a circulação que se tributa é de um produto industrializado, mas não que ela tenha que ocorrer simultaneamente a cada vez que ocorra uma hipótese de incidência do tributo (fato gerador)". A divergência ainda terá de ser resolvida pela 1ª Seção do STJ.
Clique aqui para ler a decisão.
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Livia Scocuglia é repórter da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 27 de janeiro de 2014
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