Recurso extraordinário interposto com base no art. 102, inc. III, alínea a, da Constituiçãoda República contra o seguinte julgado do Tribunal Regional Federal da 4ª Região: "TRIBUTÁRIO. DESEMBARAÇO ADUANEIRO. SUBFATURAMENTO. MERCADORIA. PENA DE PERDIMENTO. IMPOSSIBILIDADE.
1. O Mandado de segurança não é meio hábil para pleitear restituição de valores relativos às despesas de armazenagem, aluguel de contêineres e demais custos decorrentes da retenção das mercadorias.
2. Não comprovado pelo impetrante que o valor da transação corresponde ao preço normal que o produto, ou seu similar, alcançaria, ao tempo da importação, em uma venda em condições de livre concorrência, o ato impugnado deve ser mantido.
3. O subfaturamento de mercadorias importadas sem comprovação de fraude não enseja pena de perdimento de bens" (fl. 141, doc. 2). Os embargos de declaração opostos foram acolhidos para fins de prequestionamento (fls. 161-166). 2. A Recorrente alega que o Tribunal de origem teria contrariado os arts. 1º, inc. IV, e170, parágrafo único, daConstituição da República. Sustenta que "equivocou-se [o] v. acórdão recorrido ao consagrar que a SRF não pode reter mercadoria importada, objeto da prática de subfaturamento reconhecida pelo v. acórdão recorrido, ao entendimento de que o condicionamento da liberação da mercadoria ao pagamento da multa devida pela prática do subfaturamento (art. 88 da MP 2.158-35-2001) implica violação ao princípio da livre iniciativa exercido de atividade econômica (art. 1º, IV, e art. 170 e § único da CRFB), nos termos da Súmula 323 deste e. Pretório" (fl. 188, doc. 2). Assevera que "a não liberação da mercadoria importada não é expediente utilizado como meio coercitivo para pagamento de exação. A retenção combatida decorre, sim, da não implção de condição necessária para prosseguimento do de importação e internação das mercadorias importadas em território nacional" (fl. 192, doc. 2). Apreciada a matéria trazida na espécie, DECIDO. 3. Razão jurídica não assiste à Recorrente.
4. O Tribunal de origem decidiu: "Da análise dos autos, verifica-se que a retenção das mercadorias fiou-se em indício de falsidade na Declaração de Importação apresentada pela impetrante quando do procedimento de desembaraço aduaneiro, conforme auto de infração das fls. 208. Assim, a impetrante buscou o desembaraço aduaneiro de 16.236 kg de meia feminina, tamanho acima do joelho, fabricadas em fibras sintéticas, importadas de empresa chinesa, tendo sido a mercadoria apreendida por suspeita de subfaturamento. O subfaturamento na importação caracteriza efetivamente falsidade ideológica. Assim, a autoridade aduaneira enquadra a conduta do importador no art.105, VI do DL 37/66 e o art. 618,VI, do Decreto n. 4.543/2002, os quais preveem que a pena de perdimento de mercadorias dar-se-á na hipótese de importação efetuada com documento necessário ao desembaraço, falsificado ou adulterado. Também enquadra no art. 66, I, da INSRF n. 206/2002 (falsidade na declaração da classificação fiscal, do preço efetivamente pago ou a pagar). Esta Primeira Turma tem se posicionado no sentido de que o art. 105, incisoVI, do DL n. 37/66, se aplica geralmente quando se trata de falsidade material, não abrange o subfaturamento (falsidade ideológica), pois há norma específica para essa conduta, que caracteriza infração administrativa, com incidência da multa de 100% sobre a diferença dos preços, conforme art. 88 e § único da MedProv n. 2.158-35, de 28/08/2001, c/c art.108, § único, do Decreto-lei n.37/66, e art. 633, I, do Decreto n.4.543, de 26/12/2002. Desse modo, embora o subfaturamento caracterize falsidade (ideológica), foi opção do legislador excluí-lo das hipóteses de aplicação da pena de perdimento. O fato pode, no máximo, ensejar a instauração do procedimento de valoração aduaneira com a exigência do depósito (ou garantia) da diferença dos tributos de acordo com o valor apurado pela autoridade aduaneira, mas não a pena de perdimento. Com efeito, não há fundamento legal para se aplicar a pena de perdimento da mercadoria pela simples constatação de divergência de preço na operação de importação, pois não haveria sentido em cobrar eventuais diferenças de tributos decorrentes do reconhecimento de subfaturamento, uma vez que sempre ocorreria falsidade ideológica e, portanto, ensejaria a aplicação da pena de perdimento, não se falando em exigência complementar do crédito tributário. No caso dos autos, o procedimento administrativo ora questionado foi instaurado em razão de suspeita quanto ao preço efetivamente pago ou a pagar declarado para as mercadorias, contaminando os documentos instrutivos do despacho de importação. A conclusão do relatório fiscal foi pela existência de subvaloração, conforme fundamentos lá expostos (fls. 32/43) estando no mesmo sentido do Auto de Infração (fl. 29), a partir do conjunto de indícios reunidos pela fiscalização, como os preços praticados para os produtos similares da concorrência e a comparação com os custos da produção. Assim, concluiu a Autoridade Fiscal que os valores mencionados na fatura comercial internacional representam mero percentual do valor da matéria prima empregada na manufatura do produto. Nesse compasso, entendo que a Autoridade Fiscal não provou efetivamente o alegado subfaturamenteo, ocorrendo mera presunção que teria havido subfaturamento do preço da mercadoria em questão, e presunção esta baseada unicamente em laudo merceológico elaborado pela ABIT. Com efeito, a teor das informações constantes do auto de infração fls. 208 e seguintes, é incontroverso que a fiscalização chegou à conclusão de que teria havido subfaturamento com base apenas em presunções, sem ter existido qualquer investigação técnica acerca da situação em exame, pois não vieram aos autos elementos consistentes que permitam afirmar que os valores atribuídos às mercadorias importadas possam ser caracterizados como subfaturados. Portanto, por absoluta falta de prova do subfaturamento alegado pela fiscalização, afasto a pena de perdimento, bem como a multa aplicada na sentença recorrida" (fls. 122-123, doc. 2, grifos nossos). Concluir de forma diversa do que decidido pelas instâncias originárias demandaria a análise do conjunto probatório constante dos autos, procedimento incabível de ser adotado validamente em recurso extraordinário, conforme dispõe a Súmula n. 279 do Supremo Tribunal Federal. O reexame do acórdão impugnado imporia, ainda, a interpretação da legislação infraconstitucional aplicável à espécie (Decreto-Lei n. 37/1966, Decreto n.4.543/2002, Instrução Normativa Receita Federal n. 206/2002 e Medida Provisória n.2.158-35/2001). Assim, a alegada contrariedade à Constituição da República, se tivesse ocorrido, seria indireta, o que não viabiliza o processamento do recurso extraordinário. Nesse sentido: "Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Fundamentos não atacados. Súmula n 283. Princípios do contraditório e da ampla defesa. Ilícito fiscal. Perdimento de bens. Ofensa reflexa. Reexame de provas. Súmula n. 279. 1. A jurisprudência de ambas as Turmas deste Tribunal é no sentido de negar provimento ao agravo quando, como no caso, não são impugnados todos os fundamentos da decisão agravada. Incide, na espécie, a inteligência da Súmula nº.283 desta Corte. 2. A ponderação da situação em que foram apreendidos os bens, da boa-fé do condutor do veículo e da aplicação, ou não, da pena imposta, como deseja a agravante, demandaria o reexame do conjunto fático-probatório dos autos e a análise da legislação infraconstitucional (Decreto-Lei n. 37/66 e Decreto n4.543/02), o que não é cabível em sede de recurso extraordinário. 3. Agravo regimental não provido" (ARE 662.564-AgR, Rel. Min. Dias Toffoli, Primeira Turma, DJe 3.8.2012, grifos nossos). "Não pode conhecido recurso extraordinário que, para reapreciar questão sobre perdimento de bem importado irregularmente, dependeria do reexame de normas subalternas" (RE 251.008-AgR, Rel. Min. Cezar Peluso, Primeira Turma, DJ 16.6.2006). "Agravo regimental em recurso extraordinário 2. Tributário. Processo administrativo-fiscal. Perdimento de bens. 3. Alegação de negativa de prestação jurisdicional. Decisão fundamentada apesar de contrária aos interesses da parte. AI-QO-RG 791.292.4. Necessário o reexame do conjunto fático-probatório constante dos autos. Óbice do enunciado da Súmula 279. Precedentes. 5. Agravo regimental a que se nega provimento" (RE 404.781-AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, DJe 13.3.2012). "AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TRIBUTÁRIO. IMPORTAÇÃO DE GARRAFAS E ENGRADADOS USADOS. GUIA DE IMPORTAÇÃO. REVISÃO ADUANEIRA. PENA DE PERDIMENTO DE BENS. IMPOSSIBILIDADE DA ANÁLISE DA LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL. OFENSA CONSTITUCIONAL INDIRETA. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO" (RE 508.324-AgR, de minha relatoria, Primeira Turma, DJe 16.10.2009). Não há, pois, o que prover quanto às alegações da Recorrente. 5. Pelo exposto, nego seguimento ao recurso extraordinário (art. 557, caput, doCódigo de Processo Civil e art. 21, § 1º, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal). Publique-se. Brasília, 18 de fevereiro de 2013.Ministra CÁRMEN LÚCIARelatora