segunda-feira, 17 de outubro de 2011

DESCAMINHO. MOTORISTA DE VEÍCULO TRANSPORTADOR DE PASSAGEIROS. MERCADORIA SEM IDENTIFICAÇÃO. RESPONSABILIDADE PENAL OBJETIVA. INCABIMENTO.

PENAL. DESCAMINHO. MOTORISTA DE VEÍCULO TRANSPORTADOR DE PASSAGEIROS. MERCADORIA SEM IDENTIFICAÇÃO. PRESUNÇÃO DE PROPRIEDADE. ART. 74 DA LEI N. 10.833/2003. EFEITOS FISCAIS. RESPONSABILIDADE PENAL OBJETIVA. INCABIMENTO. FALTA DE PROVA SUFICIENTE PARA CONDENAÇÃO.

O art. 74 da Lei nº 10.833/2003 dispõe que "o transportador de passageiros, em viagem internacional, ou que transite por zona de vigilância aduaneira, fica obrigado a identificar os volumes transportados como bagagem em compartimento isolado dos viajantes, e seus respectivos proprietários." O parágrafo 3º desse dispositivo preceitua que "presume-se de propriedade do transportador, para efeitos fiscais, a mercadoria transportada sem a identificação do respectivo proprietário, na forma estabelecida no caput ou nos §§ 1º e 2º deste artigo." Essa presunção legal vale para efeitos fiscais, mas não para fins penais, sob pena de aplicação da responsabilidade penal objetiva. Não havendo provas de que o motorista do veículo transportador tenha contribuído para o descaminho ou contrabando perpetrado
por seus passageiros, impõe-se a sua absolvição.

(TRF4, APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0002705-75.2008.404.7005, 7ª TURMA, DES. FEDERAL ÉLCIO PINHEIRO DE CASTRO, POR MAIORIA,
VENCIDO O RELATOR, D.E. 26.08.2011)

APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDÊNCIÁRIA. ARTIGO 168-A, §1º, I, DO CÓDIGO PENAL_PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA.

PENAL. PROCESSUAL PENAL. REVISÃO CRIMINAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDÊNCIÁRIA. ARTIGO 168-A, §1º, I, DO CÓDIGO PENAL. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCÁRIAS INCIDENTES SOBRE A COMERCIALIZAÇÃO DA PRODUÇÃO RURAL. FUNRURAL. INCONSTITUCIONALIDADE. CONDUTA ATÍPICA. CONTRIBUIÇÕES AO SENAR. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INCIDÊNCIA.

1. Afastada, pelo Supremo Tribunal Federal, a obrigação de retenção e recolhimento da contribuição social, ou de recolhimento por sub-rogação, sobre a receita bruta proveniente da comercialização de produção rural (Funrural), atípica a conduta daquele que deixa de repassar tais tributos declarados inconstitucionais.

2. Sendo o valor dos tributos iludidos inferior ao parâmetro jurisprudencial adotado pelas Cortes Superiores (R$ 10.000,00), o reconhecimento da incidência do princípio despenalizante é medida que se impõe.

(TRF4, REVISÃO CRIMINAL Nº 0031445-38.2010.404.0000, 4ª SEÇÃO, DES. FEDERAL VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS, POR
UNANIMIDADE, D.E. 30.08.2011)

Reforma tributária e constrições políticas

Sacha Calmon


Na hora de encerrar suas atividades no Brasil, as empresas são obrigadas a enfrentar exigências burocráticas para concluírem o processo. E só conseguem se livrar dos empecilhos por meio do Poder Judiciário. Recente decisão judicial assegurou a uma empresa estrangeira no Brasil o direito de encerrar suas atividades, mesmo sem ter passado o período de cinco anos que a Receita Federal tem para fiscalizar as compensações tributárias. Na decisão, a juíza da 2ª vara de Araraquara da Seção Judiciária de São Paulo determinou à Receita Federal que, no prazo de 120 dias, finalizasse os processos com os pedidos de compensação apresentados pela empresa nos últimos cinco anos de atividade. Formalizado o pedido de compensação de débito tributário, ele é homologado tacitamente e o crédito é extinto definitivamente, no prazo de cinco anos, de acordo com a lei 9.430 (clique aqui), de 1996. No caso, porém, a empresa queria encerrar as atividades no Brasil antes de transcorrido esse período. Apesar de estar em situação regular perante a Receita, não conseguia dar baixa no CNPJ.

O motivo era esse prazo de cinco anos, ainda não terminado. "Realmente não é razoável exigir do contribuinte que ele fique à mercê do Fisco", afirmou a magistrada na decisão. Especialistas chamam esse tipo de situação de constrição política. São exigências feitas pelos órgãos de fiscalização para obrigar o contribuinte a pagar os impostos que supostamente deve. Assim como no encerramento da atividade, nas incorporações as empresas também sofrem. Há decisões judiciais da Justiça Federal que liberam as incorporadas de apresentar certidão negativa de débitos à Junta Comercial para registro da operação. A incorporada também precisa dar baixa no CNPJ junto à Receita Federal. Nesse sentido, liminar da 14ª vara Federal do Rio de Janeiro: "Trata-se de sanção política porque a Receita tem outros meios, como a execução fiscal, para cobrar tributos".

Aliás, um país que arrecada R$1,3 trilhão (União, Estados e municípios), valor equivalente a 38% do PIB, pode se queixar? O Estado no Brasil, além de inepto administrativamente falando, cobra tributos demais, mas nos presta péssimos serviços públicos. O povo não tem saúde, segurança, educação e saneamento. Além disso, não paga o que deve, nos três níveis da Federação. Aliás, os precatórios não pagos são mais elevados que a dívida ativa. Ao contrário dos precatórios, que são derivados de sentenças judiciais irrecorríveis, líquidos e certos, 80% das execuções fiscais são ínfimas, os devedores sumiram ou o tributo não é devido, nasceu do arbítrio. Isso mostra que o Estado é o maior transgressor das leis em nosso país, caso contrário não teria tantas condenações. Como se não bastasse, atrapalha a vida dos contribuintes, os que fazem o país crescer. Precisamos, presidente Dilma, de uma nova Secretaria Nacional de Desburocratização.

A Receita tem muitos processos, mas executa pouco (converte 20% em renda). Tentam vender instrumentos de cobrança, tipo execução administrativa. O melhor é evitar autuações indevidas, digitalizar os controles e reduzir as interpretações fiscalistas da lei. Aliás, 15% das empresas garantem 90% da arrecadação Federal. Chega de burocracia e perseguição tributária a aterrorizar a iniciativa privada, motor do crescimento do país.

Uma reforma tributária que acabe paulatinamente com o IPI e recrie o ICMS, neutro, não cumulativo, com alíquotas únicas, sem qualquer tipo de exoneração fiscal, um grande e abrangente imposto sobre consumo de bens e serviços envolvendo as três ordens de governo se faz urgente. Uma forma inteligente de financiamento da seguridade social (assistência social, saúde, previdência), assim como maior progressividade, sem exageros, sobre a renda e o patrimônio é o que o país necessita.

Quanto aos pequenos e médios negócios: o simples, como predica a Constituição. No mais, certos Estados membros estão prejudicando a Federação e os demais Estados. Reduzem o ICMS/importação, em seus portos, dos insumos destinados a outros Estados. A China fica satisfeita. O ICMS extrafiscal é pior que a saúva, o inimigo público nº 1 de um sistema tributário sadio, assim como os desgraçados PIS e Cofins que são impostos sobre a renda bruta, a tributar o caixa das empresas, mesmo que tenham prejuízos no balanço. Nova CPMF, nem pensar. A saúde e a previdência contam com a Cofins, as contribuições sobre a folha de salários e as contribuições de autônomos, empregadores e empregados, além da contribuição social sobre o lucro das empresas. Na verdade, há desvio de finalidade e falta gestão. Governadores rápeces querem tirar a sardinha da brasa com mão alheia. Melhor fariam se se limitassem a governar. Que Vossa Excelência, presidente, não se deixe embair pelas vingativas vozes dos jacobinos a querer tributar as grandes fortunas. O país precisa delas, são ariscas e fugidias e ficam onde se lhe reconheçam mérito e serventia.

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*Sacha Calmon é advogado tributarista e sócio do escritório Sacha Calmon - Misabel Derzi Consultores e Advogados. Professor titular de Direito Financeiro e Tributário da UFRJ e presidente da Associação Brasileira de Direito Financeiro (ABDF)

Falta de procurações não prejudica processo com muitos recorrentes




Se há grande número de recorrentes, a exigência legal da apresentação de cópias das procurações de todos eles no agravo de instrumento pode ser mitigada. O entendimento foi dado em processo no qual um grupo de 858 pessoas ajuizou ação de indenização contra a Telegoiás S/A, posteriormente incorporada pela Brasil Telecom S/A. A relatora, ministra Isabel Gallotti, considerou que a falta de apenas duas procurações do grupo, representado pelo mesmo advogado, em um dos sucessivos recursos na fase de liquidação de sentença, não deveria prejudicar o processo.

Os autores celebraram contrato com a construtora Graham Bell para investimentos no projeto comunitário de telefonia Proconte. Além de usuários, os autores se tornaram cotistas da empresa. Posteriormente, a Graham Bell transferiu as instalações de telefonia por ela construídas para a Telegoiás, o que – alegou-se – causou prejuízos para o grupo de investidores. No total seriam devidas indenizações em valor superior a R$ 10 milhões.

A Brasil Telecom interpôs agravo regimental contra decisão anterior da ministra relatora, que negou seu recurso contra acórdão do Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO), proferido no julgamento de agravo de instrumento em fase de liquidação de sentença. A empresa contestou a renovação dos cálculos das indenizações com a aplicação da taxa de 1% ao mês a título de juros de mora, a partir de 12 de janeiro de 2003, data de entrada em vigor do novo Código Civil. A defesa da empresa de telecomunicações sustentou ainda que a falta das duas procurações violaria o artigo 525, inciso I, do Código de Processo Civil.

Seria obrigação do grupo de acionistas prover as procurações e eventuais erros não seriam desculpa para sua ausência. Mesmo com múltiplas partes e advogados, segundo a empresa, as procurações ou a demonstração da cadeia completa de representação dos advogados são exigidas. Alegou também que deveria ser comprovado o valor completo do investimento dos acionistas, mas que os documentos apresentados seriam inidôneos e não comprovariam o real recebimento dos valores pela Brasil Telecom.

Erro notório

Entretanto, no seu voto, a ministra Isabel Gallotti considerou que a interpretação do TJGO, de que a falta das duas procurações no agravo de instrumento deve ser relevada, é correta. Ela apontou que os nomes dos dois acionistas foram citados em outras páginas dos autos e não há dúvida de que todos os 858 autores estão representados no processo pelos mesmos advogados. O que houve foi um "notório erro" na cópia dos autos.

Para a relatora, mesmo que se considerassem indispensáveis as cópias das duas procurações nessa fase de cumprimento de sentença, o efeito disso não prejudicaria os demais autores. "A consequência seria o não conhecimento do agravo apenas em relação a esses dois litisconsortes, impondo-se reconhecer a perfeição do traslado no tocante aos demais 856", destacou.

A ministra lembrou que a jurisprudência do STJ, embora considere obrigatória a juntada das procurações de todos os recorrentes, admite, em situações excepcionais, havendo grande quantidade de litisconsortes, que pode ser relevado o erro material no traslado de um número insignificante dessas procurações.

Quanto aos documentos apresentados como comprovação de pagamento pelos autores da ação, a ministra considerou que os contratos celebrados com a Graham Bell e os respectivos recibos são suficientes, conforme entendeu o TJGO ao analisar as provas do processo – análise que não pode ser refeita pelo STJ, em razão de sua Súmula 7.

Consectários legais

Reportando-se ao entendimento fixado pelo tribunal estadual, a ministra observou que os pagamentos foram feitos à construtora e não à Telegoiás, logo, é mesmo a primeira a ter legitimidade para emitir os recibos. Para a ministra, não estaria em discussão se houve eventual falta de pagamento de alguma parcela, por parte de algum dos acionistas, ou a validade dos contratos, mas o valor a ser recebido por eles com base no benefício auferido pela empresa telefônica e no investimento de cada um.

Por fim, Isabel Gallotti confirmou que a fixação dos juros, conforme orientação já firmada pelo STJ, deve levar em conta a legislação vigente no momento de sua incidência. A sentença que reconheceu o direito dos acionistas foi proferida ainda sob o Código Civil de 1916, mas a disciplina dos juros foi alterada no novo código, de 2002, que entrou em vigor em 2003.

Ao julgar o REsp 1.111.117, no regime dos recursos repetitivos, a Corte Especial do STJ decidiu que "os juros são consectários legais da obrigação principal", e por isso "devem ser regulados pela lei vigente à época de sua incidência". De acordo com esse entendimento, ao dar a sentença, o juiz deve fixá-los conforme a lei em vigor naquele instante. Se houver norma superveniente sobre juros, a adequação do título judicial à nova regra não viola o princípio da coisa julgada.


AREsp 13359
REsp 1111117
STJ

A restituição do IR e o estelionato praticado pelo Fisco

Justiça Tributária


Por Raul Haidar

À procura da verdadeira e única JUSTIÇA TRIBUTÁRIA deparamo-nos com inúmeras situações em que o contribuinte brasileiro é vítima da espoliação, da mentira, do engodo, enfim de verdadeiro estelionato. Como qualquer dos leitores sabe que o conceito básico de justiça é dar a cada um o que é seu. Mas nós brasileiros estamos dando mais do que devemos e recebendo bem menos do que temos direito.

Anuncia-se que a Receita Federal está liberando o maior lote de restituição da história, devolvendo cerca de R$ 2,5 bilhões para 2.690.743 contribuintes, valores retidos a maior no exercício de 2011 e ainda os valores correspondentes à chamada malha fina de 2008 a 2010.

Ainda que os números impressionem, a média é de pouco mais de R$ 1.000,00 para cada vítima. Não é muito, mas poderia ter sido aplicado pelo contribuinte e esses R$ 2,5 bilhões poderiam ser mais úteis girando na economia do que nos tenebrosos caminhos financeiros do tesouro nacional.

Embora alguém possa afirmar que a restituição é positiva, pois indica que a Receita analisou, conferiu e concordou com as declarações, há uma visão mais precisa do fato, que nos encaminha para uma figura criminosa: o estelionato praticado pelo fisco.  A primeira razão para vermos tudo isso como uma grande farsa é a ausência de uma atualização real, verdadeira, legítima, dos limites da tabela do imposto, especialmente em relação aos assalariados, as princípais vítimas dessa grande injustiça.

Hoje o limite de isenção é de R$ 1.556,61. Uma rápida leitura do artigo 6º da Constituição Federal, especialmente no inciso IV, deixa clara a impossibilidade de que alguém tenha alguma RENDA com menos de R$ 3.000,00, que deveria hoje (aproximadamente) ser aquele limite.

Salário não é renda. Isso tem sido repetido há décadas pelos nossos políticos às vésperas das eleições. Mas ainda que muitos deles sejam mentirosos profissionais, o conceito clássico de renda é a quantia que resta ao trabalhador depois de atendidas as suas necessidades básicas. Todavia, todos sabemos que com aquele limite de isenção tais necessidades não são atendidas, principalmente nos grandes centros urbanos onde hoje está a maior parte da população.

Também é uma ofensa o valor mensal de R$ 157,47 a título de manutenção de um dependente. Isso nem merece comentário. Pior que isso o valor anual de R$ 2.968,23 a título de despesa com instrução. Em qualquer local civilizado, educação é investimento, não despesa. Em vários países tal investimento é incentivado. Aqui, é punido. A menos que alguém encontre uma escola que cobre mensalidade de R$ 250,00. Trata-se de uma grande mentira.

Recentemente (22/08/2011), tratamos aqui neste espaço de uma sacanagem que foi feita contra um contribuinte assalariado, onde o fisco simplesmente cancelou todas as deduções legítimas (inclusive pensão alimentícia) ante o grave pecado de ter o executivo viajado a trabalho quando o fisco mandou uma intimação que ele não recebeu. Não se esforçou a fiscalização sequer para consultar seus registros, onde a beneficiária da pensão e a fonte pagadora haviam informado o pagamento e o recebimento do benefício. A identificação de ambos estava nas declarações do contribuinte.

Ou seja: nós, as vítimas, somos culpados até prova em contrário e o fisco se esforça para que a prova não seja produzida ou aceita. Para o fisco, basta a chamada presunção da legitimidade do ato administrativo, que Rui Barbosa comentou há 80 anos:

 

"Essa presunpção de terem, de ordinário, razão contra o resto do mundo,nenhuma lei a reconhece à Fazenda, ao Governo ou ao Estado. Antes, se admissível fosse qualquer presumpção , havia de ser em sentido contrário. Pois essas entidades são as mais irresponsáveis, as que mais abundam em meios de corromper, as que exercem as perseguições,administrativas, políticas e policiais, as que, demitindo funcionários indemissíveis, rasgando contratos solenes, consumando lesões de toda a ordem (por não serem os perpetradores de taes atentados os que por eles pagam), acumulam, continuadamente sobre o Tesouro Público, terríveis responsabilidades. No Brasil, durante o Império, os liberais tinham por artigo do seu programa cercear os privilégios, já espantosos, da Fazenda Nacional. Pasmoso é que eles na República, se cemdobrem ainda, concultando-se até, a Constituição em pontos de alto melindre, para assegurar ao Fisco essa situação monstruosa; e ainda haja quem, sobre todas essas conquistas, lhe queira granjear a de um lugar de predileções e vantagens na consciência judiciária,no fôro íntimo de cada magistrado." (Oração aos Moços, Rio, 1932).

Finalmente, é bom lembrar que ainda que a retenção venha supostamente corrigida, o contribuinte só recebe a restituição porque houve pagamento a maior. Ninguém deve pagar mais do que deve.

Consta que certo líder religioso, quando indagado sobre a legitimidade do tributo que o imperador cobrava, respondeu a seus seguidores: dai a Cesar o que é de Cesar. Mas se o tal Cesar estivesse cobrando o que não fosse seu, talvez a resposta fosse outra. Em síntese: o fisco, não reajustando a tabela e as deduções e sacaneando o contribuinte numa tal malha fina, formada na prática de grandes grosserias, pratica contra todos nós um grande estelionato.

Raul Haidar é advogado tributarista, ex-presidente do Tribunal de Ética e disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da revista ConJur.

Revista Consultor Jurídico, 17 de outubro de 2011

Importação de itens de consumo para a Copa terá isenção de impostos

Por João Villaverde | Valor

BRASÍLIA – Dentro de 45 dias, no máximo, as importações de itens de consumo não-duráveis e duráveis relacionados à Copa do Mundo de 2014 terão isenção dos impostos federais que incidem sobre o produto adquirido do exterior. Decreto publicado no Diário Oficial da União (DOU) desta quinta-feira, 13, detalha os itens que poderão ser isentos de impostos no ato de importação. Mas a Receita Federal ainda precisa disciplinar as condições para essas operações – e tem 45 dias, a partir de hoje, para isso.

A importação de alimentos, suprimentos médicos, produtos farmacêutico, combustíveis, materiais de escritório, equipamento técnico-esportivo, equipamento médico  e equipamento de escritório será isenta de IPI, PIS/Cofins, Cide e Imposto de Importação.

O decreto publicado hoje inclui uma medida que não estava prevista na lei: o governo também isentou de Cide a comercialização de combustíveis. Na lei, apenas a importação de combustíveis estava isenta de Cide.

 

A Receita ainda não se pronunciou quanto tratamento tributário que será aplicado à bagagem dos viajantes estrangeiros ao Brasil. Isto é, como serão enquadrados os itens que receberam a isenção de impostos e vierem na bagagem de estrangeiros. No DOU, a Receita anuncia que "poderá editar atos normativos específicos" a esta questão, mas não avisa quando.

(João Villaverde | Valor)

Governo desmoraliza Camex e erra em comércio exterior Imprimir E-mail


   
Estranho paradoxo o do governo Dilma, que percorre as reuniões internacionais clamando por maior coordenação e união no combate à crise internacional e, ao mesmo tempo em que a presidente da República critica lá fora o protecionismo, sua equipe no Brasil levanta barreiras comerciais sem coordenação entre os ministérios. Há dez anos, foi criada a Câmara de Comércio Exterior, para ordenar as ações dos órgãos do governo em temas comerciais. E em seu aniversário, a Camex foi ignorada para que o país embarcasse no protecionismo.

O Brasil parece, mais e mais, espelhar-se no exemplo da vizinha Argentina, adepta das medidas informais de administração do comércio ou pouco atenta aos compromissos com o sistema multilateral. O problema do exemplo é sua ineficiência: as estatísticas da própria Argentina mostram perda crescente da competitividade dos produtos manufaturados locais, para prejuízo da população e do país.

São preocupantes as informações que saem, por exemplo, do Grupo de Acompanhamento Conjuntural (GAC), criado para troca de impressões entre o governo e o setor privado. Segundo relato dos próprios empresários, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, parece encantado com boa parte das sugestões protecionistas levantadas nesse grupo, mesmo as que claramente rompem regras internacionais e sujeitam o país a questionamentos na Organização Mundial do Comércio (OMC).

De olho no curto prazo, equipe econômica põe credibilidade em risco

Uma das últimas medidas postas em estudo por Mantega é a sugestão de proibir o desembarque de certas mercadorias a não ser em portos especialmente designados - uma maneira de dificultar a vida dos importadores. Se adotada a proposta, portos como Santos e Paranaguá seriam fechados a determinados manufaturados, criando uma barreira de custo e logística aos importados.

O Brasil não seria o único a contrariar as regras da OMC. Mas, como país em desenvolvimento, pacífico, de tamanho ainda reduzido no comércio e no mercado financeiro internacional, deveria ser um dos primeiros interessados em fortalecer, não minar, o sistema de normas multilaterais, que, até agora, só tem beneficiado os interesses brasileiros. Deflagrar conflitos comerciais com violações explícitas às regras internacionais não parece uma estratégia sensata, nem se ajusta ao discurso de Dilma Rousseff nos palcos internacionais.

Desde as ações contra barreiras à gasolina nos EUA e questionamento dos subsídios à Embraer, pelo Canadá, o Brasil coleciona vitórias na OMC, a última delas contra os subsídios ao algodão americano. A OMC serve para desencorajar o mero uso da força bruta na proteção a mercados, estabelecer regras aceitáveis para comercialização de mercadorias e arrancar de parceiros faltosos compensações como o inédito financiamento dos EUA a pesquisas e tecnologia para o algodão brasileiro.

O problema das decisões repentinas e voluntariosas, como a tomada em setembro no Brasil, de aumentar em 30 pontos percentuais o imposto sobre produtos industrializados dos automóveis, vai além de sua vulnerabilidade jurídica, com liminares espalhadas para garantir importação sem IPI, no país, e movimentação, no exterior, dos parceiros do Brasil para questionar a ação protecionista. O exemplo das barreiras levantadas atabalhoadamente obriga a diplomacia brasileira a defender chicanas protecionistas que podem, muito bem, ser usadas contra o Brasil no futuro.

Além disso, desmoralizar a Camex como local de acerto de ponteiros dos ministérios é abrir espaço para mais decisões capengas e indefensáveis que exigem sucessivos retoques, como vem acontecendo com o aumento do IPI para carros. Abriu-se uma exceção para importações do México e Argentina, porque interessava às grandes montadoras instaladas no país. Por ordem de Dilma, a pedido do amigo presidente uruguaio, José Mujica, abriu-se outra exceção para os 20 mil carros importados do Uruguai, majoritariamente chineses. Anuncia-se discutir mudanças, caso a caso, para montadoras com planos de instalação no país.

Discutindo na Camex, quem sabe os ministros teriam evitado essa sucessão de casuísmos e adotado medidas mais sofisticadas e mais proveitosas para o consumidor. Uma delas foi apontada à repórter Francine de Lorenzo, do Valor, pela professora Vera Thorstensen, uma das maiores especialistas em comércio internacional no país - que deplorou o amadorismo do imposto que discrimina, contra a lei, entre produto nacional e produto importado já internalizado no mercado nacional. O governo poderia ter criado um programa de desenvolvimento tecnológico, que permitiria incentivos à indústria instalada no país, aponta Thorstensen.

O programa cobraria investimento na melhoria do produto nacional, em troca de proteção. Essa ideia foi levantada e abandonada no calor das conversas com as montadoras. Agora, os países de origem dessas mesmas montadoras exigem que o Brasil justifique na OMC o injustificável aumento seletivo de imposto.

Sergio Leo é repórter especial e escreve às segundas-feiras
Valor Econômico/Por Sergio Leo

Processos fiscais tramitam on-line

   
  segunda-feira, 17 de outubro de 2011    

        VALOR ECONÔMICO - LEGISLAÇÃO & TRIBUTOS
       
         

Um processo administrativo fiscal pode levar até cinco anos para ser resolvido. Parte desse tempo é gasto hoje com o vaivém de papel. Recursos contra decisões das delegacias da Receita Federal chegam no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) em malotes, e voltam à origem, em caso de vitória dos contribuintes, da mesma maneira. A situação, no entanto, deve mudar em breve com a digitalização de todos os processos sobre a cobrança de tributos federais e a realização de julgamentos virtuais, previstos no projeto "E-processo", coordenado pelo Ministério da Fazenda. Com isso, espera-se que o prazo para a solução de um conflito caia para três anos e meio.

O objetivo do projeto E-processo é resolver com maior celeridade e economia as discussões administrativas entre a Fazenda Nacional e os contribuintes. A implantação do projeto vai abranger desde as delegacias da Receita Federal, passando pelo Carf, até a inscrição do débito tributário na dívida ativa da União.

No Carf, por exemplo, falta pouco para a eliminação total do papel. Já foram digitalizados cerca de 65% dos processos em estoque. Segundo o presidente do conselho, Otacílio Dantas Cartaxo, até o fim do ano esse estoque deverá ser zerado, o que agilizará a tramitação desses processos. "Depois da criação da nova estrutura organizacional, com a unificação dos conselhos de contribuintes, essa é a segunda revolução no Carf", diz ele, acrescentando que as pessoas que lidam com o conselho terão que se adaptar à nova cultura. "O resultado será positivo."

Depois da digitalização, começam, no ano que vem, os testes para os julgamentos virtuais no Carf. Conselheiros, partes e advogados participarão das audiências nas respectivas delegacias regionais da Receita Federal. Assim, haverá economia com passagens aéreas, estadia e tempo dos conselheiros - que não são remunerados para atuar no órgão federal. Para o procurador-chefe da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) no Carf, Paulo Riscado, também haverá uma grande economia com compra de arquivos, papel e impressão. "Ficará mais fácil acompanhar os processos e transmitir informações para outras áreas da procuradoria e da Receita envolvidas no acompanhamento dos casos", afirma o procurador-chefe no Carf.

Os contribuintes também poderão ganhar agilidade com o E-processo, segundo advogados. "A implantação do processo digital será um importante passo rumo a um processo administrativo tributário mais célere", diz o advogado Flávio de Carvalho, do escritório Souza, Schneider,Pugliese e Sztokfisz Advogados. Carvalho afirma que já percebe a diferença com a implantação do E-processo. "Até pouco tempo atrás, um processo que era remetido de uma delegacia da Receita ao Carf demorava, às vezes, mais de três meses para chegar a Brasília. Hoje, em menos de um mês já está tramitando no conselho", afirma.

Todas as delegacias e superintendências da Receita deverão ser adaptadas. Na 8ª Região (São Paulo), que tem o maior volume de processos do país, os autos de infração novos são todos digitais desde janeiro. E a intenção é digitalizar 80% do estoque de processos até o fim de 2012. Para o funcionamento do novo sistema no país, a Receita comprou cerca de quatro mil scanners, num investimento total de R$ 9 milhões. "As regionais com estoque todo digitalizado já perceberam uma redução de 20% a 30% no tempo de tramitação do processo", afirma João Paulo Martins da Silva, coordenador-geral de arrecadação e cobrança da Receita. Segundo ele, hoje, já há mais de 600 mil processos digitalizados.

A perspectiva é de que o E-processo também alcance as execuções fiscais no futuro. Segundo o diretor de gestão da dívida ativa da União, Paulo Ricardo de Souza Cardoso, até o fim do ano todas as unidades da PGFN estarão com condições de receber os processos eletrônicos da Receita Federal. Mas as execuções fiscais continuarão, por ora, a tramitar em papel. "Já estamos nos articulando nos tribunais federais para harmonizar todos os sistemas eletrônicos", afirma Cardoso. Segundo ele, o objetivo é realizar, num futuro próximo, julgamentos virtuais de todas as execuções fiscais no país.

Laura Ignacio - De São Paulo