terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Contribuinte deve protestar, e não ser protestado

Justiça Tributária


Por Raul Haidar

A lei 12.767, publicada no dia 28 de dezembro de 2012, resulta da
conversão da MP 577, de 27 de agosto 2012, e sua ementa diz que ela
trata de assuntos relacionados a energia elétrica e termina afirmando
que "dá outras providências". Dentre tais providências, uma delas
certamente é causar um grande choque nos contribuintes e nas pessoas
que se preocupam com a Justiça Tributária.

Esse choque está contido no seu artigo 25, que altera a lei
9.242/1997, que trata de protesto de títulos e documentos de dívida.

O artigo 1º dessa lei era claro e objetivo:

"Art. 1º- Protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a
inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e
outros documentos de dívida."

Agora, a lei que trata de energia elétrica resolveu inventar um
parágrafo único, com a seguinte fraude legislativa :

"Parágrafo único. Incluem-se entre os títulos sujeitos a protesto as
certidões de dívida ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal,
dos Municípios e das respectivas autarquias e fundações públicas."

Alterar uma lei específica, que trata de um determinado assunto,
mediante o artifício de incluir a mudança em outro diploma legal
sorrateiramente, como uma verdadeira muamba ou contrabando, é uma
forma de fraudar o processo legislativo. Em nossa coluna anterior já
registramos nosso protesto:

"A Lei Complementar 95 de 26/2/1998 é muito clara em seu artigo 7º,
inciso II a ordenar que a lei não conterá matéria estranha a seu
objeto ou a este não vinculada por afinidade, pertinência ou conexão.

Ora, cada lei deveria tratar exclusivamente de um determinado assunto,
exposto com clareza em sua ementa. Caso contrário, quando alterar o
Código de Transito, o congresso pode enfiar um adendo regulando o uso
da maconha, ou ao legislar sobre a criação de gado, por exemplo,
tentar ali regular o exercício da prostituição. Como se sabe, a
imaginação dessa gente não tem limites."

Todos sabemos que as Medidas Provisórias são permitidas nas condições
determinadas pelo artigo 62 da Constituição Federal. O caput do artigo
exige duas condições básicas: relevância e urgência.

A MP 577 é de agosto de 2012 e na sua redação original não havia
qualquer menção à lei 9.492 ou a títulos de crédito, dividas ou
protestos, assuntos que, obviamente, não fazem parte daquele grupo de
matérias que admite uma MP: relevância e urgência. Se alguém pretende
mudar a lei de 97, deve apresentar projeto ao congresso, não ficar de
tocaia em algum gabinete para lá inserir sua muamba.

Por outro lado, não encontramos nenhuma indicação de que esse
acréscimo (o tal parágrafo único) tenha sido debatido por alguém. Não
se sabe quem seja o autor dessa monstruosidade. Todavia, há fortes
indícios de que tal norma, que muda uma lei com mais de 15 anos de
vigência, seja resultado de mecanismo não democrático, criado por
alguém que tenha interesse em aumentar o lucro dos cartórios ou
sacanear ainda mais os contribuintes brasileiros. Ou mesmo, quem sabe,
ofender, menosprezar e ridicularizar o Poder Judiciário. Talvez seja
uma safadeza contra o Judiciário, mais especificamente contra o STJ,
corte que nessa matéria diz a palavra final, posto que se trata de
questão infraconstitucional.

Quem pesquisar verá, sem grandes dificuldades, que o STJ inúmeras
vezes decidiu (sempre no mesmo sentido) que:

"Se a CDA comprova o inadimplemento do débito fiscal, gozando
inclusive de presunção de certeza e lilquidez, não há sentido em
admitir que ela seja levada a protesto, porque a finalidade deste, nos
termos do art. 1º da Lei 9.492/1997 é a prova do inadimplemento e o
decumprimento da obrigação originada em títulos e outros documentos de
dívida. A única forma de se cobrar dívida fiscal é por meio de
execução fiscal e, para tanto, basta que a Fazenda Pública instrua a
petição inicial executiva com a CDA. Assim, o protesto não se enquadra
no procedimento legal previsto para a cobrança da dívida ativa."
(AgrRg no Rec. Esp. 1.277.348, Relator Min. Cesar Asfor Rocha).

O Conselho Federal da OAB obteve sentença datada de 14 de setembro de
2012 – Processo 30732-61.2012.4.01.3400, em que o juiz Marcelo Velasco
Nascimento Albernaz, da 13ª Vara da Justiça Federal no Distrito
Federal, julgou procedente o pedido para anular a Portaria
Interministerial 574-A de 20/12/2010, onde se pretendia legitimar os
aludidos protestos.

Ao que parece essa aberração jurídica, que se materializou na muamba
legislativa, teve inspiração no Ministério da Fazenda, que imagina ser
possível o contribuinte em débito pagar sua dívida fiscal para evitar
o protesto.

Não são necessárias grandes e dispendiosas pesquisas para saber que o
protesto neste caso serve apenas para prejudicar um pouco mais aquele
que já está prejudicado pelos índices pífios de crescimento econômico,
pela carga tributária insuportável e pela burocracia asfixiante.

Quem já está com dívida ativa inscrita e sujeito a execução fiscal,
pode ter seus bens penhorados e suas contas bancárias bloqueadas. Se
além disso tudo ainda tiver protesto, certamente ficará impedido de
exercer suas atividades básicas, como, por exemplo, manter conta
bancária, operar com cartões de crédito, fazer compras a prazo, etc.-
Ou seja: não se trata de cobrança, mas, do ponto de vista comercial,
trata-se de PENA DE MORTE! O empresário que tiver título protestado
não conseguirá, por exemplo, descontar uma duplicata que lhe permita
pagar o salário de seus empregados. A morte economica será do
empresário, mas terá reflexos amplos na sociedade.

Muitas e muitas vezes essas CDAs decorrem de dívidas inexistentes,
prescritas ou resultantes de autuações sem fundamento. Já tivemos
oportunidade de cancelar execuções fiscais utilizando singela exceção,
ante a ocorrência de prescrição quinquenal. Aliás, o simples fato de
encaminhar a juizo uma execução flagrantemente prescrita, deveria
resultar em pena pecuniária ao exequente e pena disciplinar a seu
advogado que negligenciou no trabalho.

Já é muito difícil para o contribuinte defender-se desses abusos, pois
na execução fiscal é obrigado a oferecer garantias ou ter bens
penhorados. Para sua defesa terá que contratar advogado e
eventualmente custear perícias ou produção de outras provas, enfim,
desde o início coloca-se como vítima ou, na melhor das hipóteses, na
desconfortável posição do litigante que já entra na briga desarmado,
diminuído, pois todas as vantagens e presunções pertencem ao
exequente, inclusive com prazos judiciais absurdamente mais amplos.
Como se sabe, no judiciário brasileiro só nós, advogados, é que
estamos sujeitos a prazos.

A Constituição garante a todos os seus direitos, assegurados o
contraditório e a ampla defesa. A Fazenda Pública já tem a seu favor a
presunção de certeza e liquidez da sua dívida ativa. Já são
privilégios exagerados, especialmente se levarmos em conta a
enormidade de abusos que as autoridades perpetram contra as pessoas
comuns.

Uma lei que resulta de MP sobre assunto realmente relevante e urgente
(energia elétrica), não pode ser legitimada se acaba desviando seu
foco e alterando outras normas legais que em nada se relacionam com o
objetivo anunciado. A questão do protesto não fazia parte da redação
original da MP e nem consta a existência de qualquer debate sobre esse
acréscimo. Embora a matéria possa ser de iniciativa privativa da
presidente (Constituição Federal artigo 61, parágrafo 1º), é bom
lembrar que ainda não se ressuscitou aquele monstro chamado
decreto-lei. Quem tem que protestar somos nós! Temos que protestar,
não ser protestados!

Raul Haidar é advogado tributarista, ex-presidente do Tribunal de
Ética e Disciplina da OAB-SP e integrante do Conselho Editorial da
revista ConJur.

Revista Consultor Jurídico, 7 de janeiro de 2013

AGU manifesta-se pela validade de resolução que estabelece alíquota diferenciada para o ICMS sobre produtos do exterior

A Advocacia-Geral da União (AGU) elaborou manifestação para o Supremo
Tribunal Federal (STF) em que defende a validade da Resolução nº
13/2012 do Senado Federal. A norma estabelece alíquotas diferenciadas
do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e
sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e
Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) nas operações com bens e
mercadorias importadas do exterior.

A Mesa Diretora da Assembleia Legislativa do Estado do Espírito Santo
propôs a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4858 alegando
que a Resolução teria criado normas destinadas à proteção da indústria
nacional, invadindo a competência do Congresso Nacional para tratar da
matéria.

A Secretaria-Geral de Contencioso (SGCT), órgão da AGU, defendeu a
constitucionalidade da norma, afirmando que o Senado Federal possui
atribuição para fixar alíquota aplicável em operações interestaduais
de produtos de fora do país. Assim, uma vez importada a mercadoria, o
ICMS incidirá em benefícios do Estado onde estiver situar o domicílio
do destinatário.

Na ação, os membros da Assembleia Legislativa sustentam que a norma
violou a Constituição ao introduzir classes de alíquotas diferenciadas
para determinados produtos ou serviços em razão de sua origem.

De acordo com o órgão da AGU, o Senado já esclareceu que a sua
competência para dispor sobre as alíquotas do ICMS atrela-se à
finalidade de propiciar um partilha igual da arrecadação entre os
entes da Federação.

A autora da ação afirma ainda que Resolução ofenderia os princípios da
separação de Poderes e da reserva legal em matéria tributária, pois
sendo insuficiente delegou competência para órgãos do Poder Executivo
(Conselho Nacional de Política Fazendária e Câmara de Comércio
Exterior) editarem as regras necessárias à definição da incidência da
nova alíquota.

Quanto a isso, a AGU rebate que não há que se falar em violações, uma
vez que o ato normativo atacado atribui ao Conselho somente a
possibilidade de fixação de critérios e procedimentos para a
certificação do conteúdo de importação, com o intuito de que essa
certificação ocorra de modo uniforme no território nacional.
Estabelece ainda que a Câmara apenas define a incidência de ICMS caso
as mercadorias não tenham similar nacional.

A ação é analisada no STF pelo ministro Ricardo Lewandowski.

A SGCT é o órgão da AGU responsável pelo assessoramento do
Advogado-Geral da União nas atividades relacionadas à atuação da União
perante o Supremo

ADI nº 4858 - STF