segunda-feira, 4 de junho de 2012
PIS e Cofins são regulados por 75 leis
Já é inusitado o bastante haver no Brasil dois tributos federais, o PIS-Pasep e a Cofins, incidindo sobre as mesmas operações e frequentemente tratados como apenas um, PIS/Cofins.
Há mais, no entanto. O exotismo tributário mereceu uma "Coletânea da legislação", elaborada pela Receita Federal, com 1.246 páginas.
No calhamaço estão 73 leis ordinárias e complementares, além de algumas centenas de decretos, portarias, instruções normativas e atos declaratórios para orientar a cobrança e a destinação dos recursos do PIS/Cofins.
Entre as leis listadas, 46 foram sancionadas ao longo da administração petista, quando os tributos se tornaram os mais complexos do já intricado sistema federal de impostos, contribuições e taxas.
Alíquotas variam de acordo com o setor da economia e os objetivos das empresas. Há regras especiais, entre dezenas de exemplos, para portos, aeroportos, exportações, exibições cinematográficas e construção de estádios para a Copa do Mundo.
Mas a coletânea da Receita, feita no fim de março, já está desatualizada: mais uma lei foi publicada no "Diário Oficial" do último dia 18.
E a 75ª está a caminho: o governo Dilma Rousseff propôs alterações na legislação com o lançamento de sua nova política industrial, batizada de Plano Brasil Maior -e outras medidas provisórias e projetos alterando os tributos que tramitam no Congresso.
PIS (Programa de Integração Social) e Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social) são, como indicam as siglas, duas contribuições destinadas a financiar políticas sociais.
O primeiro alimenta o FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), cujos recursos vão para financiamentos do BNDES e seguro-desemprego. A segunda, com peso muito maior na arrecadação federal, banca programas nas áreas de saúde, previdência e assistência social.
UNIFICAÇÃO
Hoje, com 42 anos de existência do PIS e 30 da Cofins, o governo volta a falar em unificar formalmente os dois tributos, para diminuir a burocracia enfrentada pelas empresas contribuintes.
Mas muito mais difícil será desembaraçar o cipoal legislativo desenvolvido nos últimos dez anos.
Até 2002, o PIS/Cofins encabeçava a lista dos tributos vistos como nocivos para a economia, por incidir sobre o faturamento das empresas, independentemente de haver lucro, e em todas as etapas do processo produtivo -da matéria-prima ao bem vendido ao consumidor.
No fim do governo FHC, a cobrança do PIS mudou para alguns setores, especialmente na indústria, que passaram a poder descontar as despesas com insumos. Sob Lula, a alteração foi estendida à Cofins. Nos dois casos, com alíquotas maiores.
A arrecadação disparou, ainda mais porque o tributo também passou a ser cobrado dos importados.
De lá para cá, isenções e regimes especiais do PIS/Cofins se tornaram o principal instrumento para estimular setores estratégicos ou de apelo político -do queijo minas a produtos para pessoas com deficiência visual.
Até programas de isenção são alvo de críticas
Até para participar de programas de incentivo, em que há isenção de tributos, as empresas reclamam de confusão na dedução do pagamento de PIS e Cofins.
Um fabricante de estruturas de aço foi autuado após uma construtora do Nordeste (que obteve isenção dos dois tributos por participar de programa de incentivo na área portuária) não usar o material comprado desse fornecedor na obra que deveria, no porto de Sauipe (BA).
O fornecedor deduziu o valor de PIS e Cofins em seu acerto de contas com o fisco, avisando que vendia para a construtora.
Ao fiscalizar o trabalho, os auditores notaram o desvio das estruturas para outra obra. Resultado: a construtora que tinha o direito ao crédito não foi autuada, mas sim o fornecedor.
"Que culpa tem o fornecedor? O profissional da área fiscal tem de atuar como consultor de negócios. E informar como as empresas devem fazer contratos para evitar ser punidas ao participar de programas de incentivo. Mas isso exige preparo e custa mais", diz Gilberto Tadeu Alves, diretor do Conselho Fiscal Empresarial Brasileiro.
Segundo Patrícia Kayo, do Rivitti e Dias Advogados, para evitar autuação, parte das empresas opta por recolher os tributos em vez de ter benefícios.
"O fornecedor não tem como controlar e saber se o cliente usará o insumo de forma correta. Prefere pagar mais imposto a ser autuado."
Fusão de tributos não desata nó tributário, dizem analistas
A fusão do PIS e da Cofins, proposta em estudo no governo federal, não é suficiente para resolver o nó tributário que afeta os negócios das empresas, segundo avaliam especialistas e empresas.
"Não adianta unificar as contribuições, ampliar os insumos que geram créditos
[usados pelas empresas para reduzir os pagamentos dos tributos] e depois aumentar a alíquota para compensar perdas de receita", diz João Eloi Olenike, presidente do IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário). "Puniria as empresas."
O aumento das alíquotas (correspondem a 9,25% sobre o faturamento) pode ser necessário, segundo técnicos da Fazenda, porque a ampliação dos créditos tributários tem impacto na receita do governo com cobrança de impostos, taxas e contribuições.
De janeiro a abril, dos
R$ 336,8 bilhões arrecadados pela Receita Federal, quase um quinto se refere à arrecadação de PIS e Cofins.
As duas contribuições representam a segunda maior fonte de arrecadação federal, com recolhimento de 4,8% do PIB, no ano passado. Só perdem para o Imposto de Renda, que (no conjunto de pessoas físicas e jurídicas) rende 6% do PIB ao governo.
"É necessário fazer a reforma tributária, mesmo que seja de forma fatiada. A unificação dos tributos pode facilitar apenas a fiscalização", diz o presidente do IBPT.
Para empresários, a tributação das contribuições não deveria ocorrer antes de apurado o lucro da empresa.
Antônio Teixeira, consultor tributário da IOB Folhamatic, ressalta que o maior problema é a complexidade das leis. "E isso pode não se resolver apenas unindo as duas contribuições."
MERCADO
O especialista destaca que hoje existe um "mercado de PIS-Cofins", com cursos, seminários, consultorias, auditorias e empresas de software. "Ao ajudar o contribuinte, acaba também encarecendo os custos das empresas, que precisam dos serviços para entender a lei."
Pesquisa com 628 empresas mostra que 53% delas têm dificuldades para integrar os sistemas fiscais e contábeis.
"Não é à toa que 95% das empresas responderam que, se pudessem simular uma fiscalização eletrônica em seus arquivos, antes de entregá-los ao fisco, elas buscariam essa alternativa", diz Ulisses Brondi, sócio da Asis Projetos, empresa de inteligência fiscal e projetos.
O custo de um projeto hoje pode variar de R$ 20 mil a R$ 100 mil, dependendo do porte da empresa.
GUSTAVO PATU
DE BRASÍLIA
CLAUDIA ROLLI
DE SÃO PAULO
Cooperativas devem entregar escrituração
As cooperativas devem entregar a escrituração fiscal digital de PIS e Cofins (EFD-Contribuições). No documento, são declarados o faturamento, o valor recolhido e os créditos tomados dos tributos. O entendimento é da Superintendência da Receita Federal em Minas Gerais (6ª Região Fiscal) e consta da Solução de Consulta nº 52, publicada nesta semana no Diário Oficial da União (DOU).
Para o Fisco, as cooperativas devem apresentar o documento mensalmente, mesmo que tenham decisão liminar que suspenda a cobrança dos tributos.
A orientação, entretanto, contraria o posicionamento da Superintendência da Receita Federal na Bahia e Sergipe (5ª Região Fiscal). Em 2009, ao responder outra solução de consulta formulada por um contribuinte, o Fisco entendeu que as cooperativas são sociedades simples e, por isso, não estão obrigadas a adotar a EFD-Contribuições.
A divergência abre espaço para que a Receita Federal em Brasília unifique o entendimento. De acordo com o advogado Rodrigo Rigo Pinheiro, do escritório Braga & Moreno Advogados e Consultores, como as cooperativas não têm fins lucrativos e são classificadas como sociedades simples não entrariam no conceito de "sociedade empresária e comercial", que são obrigadas a entregar a escrituração fiscal digital. "Alguns contribuintes apresentam por segurança. Mas outros não porque a implantação do sistema é cara", afirma. "Falta segurança para saber se há obrigação ou não de escriturar."
A multa prevista na legislação para o contribuinte que deixa de entregar o documento é de R$ 5 mil por mês.
Bárbara Pombo - De São Paulo
Fisco cobra ICMS sobre peças não usadas para exportação
O fisco do Rio Grande do Sul pode cobrar o Imposto de Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) de peças importadas pela modalidade drawback-suspensão e não utilizadas em máquinas agrícolas destinadas ao mercado externo. Foi o que decidiu, de forma unânime, a 21ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, ao dar provimento a apelo do fisco estadual numa demanda contra a AGCO do Brasil Comércio e Indústria, com sede no Município de Canoas. A decisão é do dia 25 de abril.
A empresa importou peças, partes e componentes para fabricação e montagem de seus produtos (tratores e colheitadeiras), pela modalidade drawback-suspensão. Neste regime, o ICMS das peças não é cobrado caso o produto final seja destinado para exportação. Portanto, a exigibilidade do imposto fica suspensa até a comprovação da efetiva comercialização das máquinas para o exterior.
No entanto, a empresa autora não conseguiu utilizar todas as peças em sua produção. Apresentou, então, à Fazenda Estadual, pedido de reenquadramento das peças, dando baixa do drawback-suspensão e alterando para o regime de diferimento aplicado ao setor automotivo — ficando, assim, isenta do recolhimento de ICMS. Por conhecer o entendimento da Fazenda Estadual pela cobrança do imposto em casos semelhantes, ajuizou Ação Cautelar na Justiça.
Em decisão de primeiro grau, foi reconhecido o direito da empresa de não fazer o pagamento do ICMS referente às peças não utilizadas em produtos para exportação. O Estado recorreu da sentença.
O relator do recurso no Tribunal de Justiça, desembargador Genaro José Baroni Borges, enfatizou que o ramo de atuação da empresa — fabricação de tratores agrícolas e colheitadeiras — submete-se ao regime de diferimento, previsto no artigo 53, inciso II, Livro I, do RICMS e Apêndice XVII. No entanto, ponderou, esse diferimento é aplicável somente no caso em que a importação não foi feita pelo sistema drawback-suspensão, e sim pelo regime normal, no qual as mercadorias vindas do exterior não se destinam à fabricação de produtos para exportação.
O relator entendeu que o fato de a autora não ter reenviado ao exterior a totalidade dos bens importados por este regime não retira a validade do benefício, apenas determina a incidência tributária. Acatou o apelo do Estado, determinando o pagamento de ICMS, multa e juros contados a partir da data do desembaraço aduaneiro das peças importadas que não foram destinadas a produtos para exportação.
Acompanharam o voto do relator os desembargadores Arminio José Abreu Lima da Rosa e Francisco José Moesch.
Apelação Cível nº 70042459222
TJRS
Convenções contra bitributação prevalecem sobre legislação de Imposto de Renda
A fazenda nacional não pode exigir retenção de Imposto de Renda na fonte em caso de serviços prestados a cliente nacional por empresa estrangeira não estabelecida no Brasil. Para a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), os acordos internacionais contra bitributação são especiais em relação à lei que trata do Imposto de Renda.
O caso diz respeito a convenções firmadas pelo Brasil com Alemanha e Canadá. A decisão contraria a pretensão da fazenda de cobrar, na fonte, a título de imposto sobre rendimento, 25% do pagamento feito pela empresa nacional à estrangeira. Os serviços dizem respeito a contratos de prestação de assistência técnica e de serviços técnicos sem transferência de tecnologia.
Segundo a fazenda, o montante não poderia ser classificado como lucro da empresa estrangeira, já que esse lucro só seria conhecido ao final do exercício. O pagamento não constituiria lucro, mas apenas envio de receita. A convenção excluiria apenas a incidência da tributação sobre lucros. Além disso, a lei nacional deveria se sobrepor às convenções, anteriores à Constituição.
Lucro operacional
O ministro Castro Meira, porém, apontou que o conceito de lucro apresentado pela fazenda nacional não corresponde ao previsto nas convenções. Conforme o relator, o termo "lucro da empresa estrangeira" contido nas duas convenções não se refere ao "lucro real", mas ao "lucro operacional".
"A tese é engenhosa, mas não convence", afirmou o ministro. "É regra de hermenêutica que devem ser rechaçadas as interpretações que levem ao absurdo, como é o caso da interpretação aqui defendida pela fazenda nacional", completou.
"Do contrário, não haveria materialidade possível sobre a qual incidir o dispositivo, porque todo e qualquer pagamento ou remuneração remetido ao estrangeiro está – e estará sempre – sujeito a adições e subtrações ao longo do exercício financeiro", esclareceu.
"A tributação do rendimento somente no estado de destino permite que lá sejam realizados os ajustes necessários à apuração do lucro efetivamente tributável. Caso se admita a retenção antecipada – e portanto, definitiva – do tributo na fonte pagadora, como pretende a fazenda nacional, serão inviáveis os referidos ajustes, afastando-se a possibilidade de compensação se apurado lucro real negativo no final do exercício financeiro", afirmou Castro Meira.
Revogação funcional
Quanto ao alegado conflito entre a lei tributária interna e as convenções internacionais, o ministro apontou que ele deve ser resolvido segundo o critério de especialidade da norma. Não se trataria, portanto, de revogação própria da lei pela convenção.
"A norma interna perde a sua aplicabilidade naquele caso específico, mas não perde a sua existência ou validade em relação ao sistema normativo interno. Ocorre uma revogação funcional", afirmou o relator.
"A prevalência dos tratados internacionais tributários decorre não do fato de serem normas internacionais, e muito menos de qualquer relação hierárquica, mas de serem especiais em relação às normas internas", completou.
Globalização
O ministro apontou ainda que a bitributação vincula-se à soberania nacional e pode ser exercida pelos estados nacionais. Porém, constitui "patologia tributária", combatida por meio de acordos bi ou multilaterais, por meio dos quais as partes transacionam a não incidência de certos tributos em certas condições.
"Ocorre que, na prática, quando os rendimentos são disponibilizados e devem ser submetidos à tributação, o fisco quase sempre adota uma interpretação literal e restritiva das normas convencionais, o que culmina com a não aplicação do acordo. É justamente o caso dos autos", asseverou.
REsp 1161467
STJ