O Supremo Tribunal Federal (STF) reafirmou seu entendimento no sentido de reconhecer a desnecessidade de submissão de demanda judicial à regra da reserva de plenário na hipótese em que a decisão judicial estiver fundada em jurisprudência do Plenário do STF ou em súmula da Corte. A questão foi analisada pelo Plenário Virtual ao julgar o Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 914045, que teve repercussão geral conhecida. O Tribunal ainda reiterou entendimento em relação à matéria de fundo do recurso, pela inconstitucionalidade de restrições impostas pelo Estado ao livre exercício de atividade econômica ou profissional, quando essas forem utilizadas como meio de cobrança indireta de tributos.
No caso dos autos, um cidadão acionou a Justiça de Minas Gerais após ter requerimento de inscrição em cadastro de produtor rural indeferido pelo Poder Público, em razão de situação de irregularidade fiscal, e obteve a concessão da ordem em mandado de segurança. O Tribunal de Justiça local (TJ-MG), ao manter sentença de primeira instância, entendeu que condicionar o deferimento da inscrição em cadastro à regularização de débitos fiscais constitui óbice à atividade profissional lícita, contrariando o princípio constitucional da livre iniciativa.
Ao recorrer ao STF, o Estado de Minas Gerais alegou que o acórdão da 6ª Câmara Cível do TJ-MG teria violado a cláusula de reserva de plenário, prevista no artigo 97 da Constituição Federal e na Súmula Vinculante 10, ao afastar a aplicação de dispositivos de legislação tributária estadual. Sustentou ainda que, na hipótese, não há impedimento ao exercício de atividades profissionais, mas sim a necessidade "de fiel observância" da legislação estadual.
Jurisprudência
O ministro Edson Fachin, relator do processo, destacou que a controvérsia discutida no ARE 914045 apresenta relevância nas dimensões jurídica, política, econômica e social da repercussão geral. "Aqui não ocorre limitação aos interesses jurídicos das partes, porquanto está em xeque um conflito concreto entre direitos fundamentais entre Estado e contribuinte, replicável em uma infinidade de lides jurídicas", observou.
O ministro afirmou que a decisão do TJ-MG não diverge da jurisprudência do Supremo, que considera inconstitucional a imposição de restrições ao exercício de atividade econômica ou profissional do contribuinte, quando este se encontra em débito para com o fisco. Além de diversos precedentes nesse sentido, o relator citou os enunciados das Súmulas 70, 323 e 547 do STF, para reafirmar a invalidade dessas limitações impostas pelo Estado como meio de cobrança indireta de tributos.
Quanto ao tema da cláusula de reserva de plenário, o ministro destacou que a questão se refere à interpretação do artigo 97 da Constituição Federal, que exige o voto da maioria absoluta dos membros de tribunal ou de seu órgão especial para declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público. Ele explicou que o artigo 481, parágrafo único, do Código de Processo Civil excepciona tal regra quando já houver pronunciamento do próprio tribunal ou do Plenário do STF sobre a matéria. Segundo o ministro Edson Fachin, a jurisprudência consolidada do Supremo é no sentido de que não há violação ao artigo 97 do Texto Constitucional quando existir pronunciamento plenário do STF acerca da matéria de fundo.
No caso concreto, o relator destacou que não houve erro por parte do TJ-MG, uma vez que a decisão questionada teve como fundamento a Súmula 547 do STF, "o que, por óbvio, demandou reiterados julgamentos do Tribunal Pleno para propiciar a cristalização do entendimento jurisprudencial em enunciado sumular".
Assim, o ministro conheceu do agravo para negar seguimento ao recurso extraordinário e assentou a inconstitucionalidade incidental do inciso III do parágrafo 1º do artigo 219 da Lei estadual 6.763/1975. A manifestação do relator pelo reconhecimento de repercussão geral e, no mérito, pela reafirmação da jurisprudencial dominante sobre a matéria foi seguida, por maioria, em deliberação no Plenário Virtual da Corte.