segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Restrição ao direito de transferência de créditos de ICMS acumulados por exportadores


 Elaborado em 09/2012

O grupo de câmaras de direito público do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina (TJSC), em 9.2.2012, ao julgar o Mandado de Segurança nº 2011.087309-8, impetrado por empresa preponderantemente exportadora, decidiu, em votação unânime, por afastar a aplicação doart. 45-A do Decreto Estadual nº 2.870/2001(01), que restringia o direito dos contribuintes catarinenses de transferir a terceiros saldos credores provenientes de operações de exportação.

Ao fundamentar sua decisão, o Desembargador Relator, Luiz Cezar Medeiros, invocou aLei Complementar nº 87/96para asseverar que não é dado ao Fisco Estadual a liberalidade de fixar limites ao montante de crédito transferível de ICMS em um determinado período, quando aLei Complementar nº 87/96não estabelece qualquer restrição nesse sentido.

Logo em seguida, o Relator ressaltou que a manutenção e o aproveitamento do crédito de ICMS por contribuintes que destinem mercadorias ao exterior são direitos expressamente previstos noart. 155, § 2º, inc. X, da Carta Magna.

Fato curioso e digno de nota se refere à edição doDecreto Estadual nº 801, de 9.2.2012que, no mesmo dia em que foi proferida a mencionada decisão do TJSC, revogou oart. 45-A do RICMS/SC.

No entanto, o referido ato normativo acrescentou, nos parágrafos 4º e 5º doart. 40 do Regulamento Catarinense, restrições muito semelhantes àquelas então existentes no revogadoart. 45-A.

Basicamente o legislador estadual, sob a alegação de que se deve observar a disponibilidade financeira do erário, acabou por limitar nos mencionados parágrafos o direito de transferência do saldo credor acumulado por contribuintes exportadores.

E pior! O legislador estadual, antes de autorizar a transferência do saldo credor decorrente de operações de exportação, irá considerar o ressarcimento efetuado pela União nos termos daLei Complementar nº 87, de 1996.

Talvez este último tipo de restrição seja a mais nefasta aos detentores de créditos acumulados, pois, na tentativa de inibir a transferência de desses créditos, o Estado literalmente joga a culpa da sua ineficiência nas costas de terceiro (União Federal). Com isso, pretende deslocar o foco da questão jurídica para adentrar em discussões econômicas que fogem ao alcance de juristas, operadores do Direito, magistrados, entre outros.

A revogação de dispositivos cuja constitucionalidade e legalidade são questionadas, seguida da edição de novas normas de conteúdo semelhante ao daquela anteriormente existente não é estratégia exclusiva do Estado de Santa Catarina. Este tipo de "manobra política" tem sido muito utilizado por parte das Unidades Federadas.

Com isso, após a revogação de legislação inconstitucional e/ou ilegal, as ações judiciais propostas pelos contribuintes que se sentiram lesados, não raro, são extintas precipitadamente pelos tribunais pátrios por perda de objeto.

Situação análoga ocorreu com a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) 3390, ajuizada pela Confederação Nacional da Indústria para suspender a eficácia de norma editada pelo Estado do Rio de Janeiro, que impunha restrições ao aproveitamento e à utilização de créditos decorrentes de exportação. Após a concessão de medida liminar pelo Ministro Relator Joaquim Barbosa, o dispositivo atacado foi revogado pelo legislador estadual, tendo a ADIN sido julgada extinta por perda superveniente de objeto.

Seja como for, os contribuintes que pretendem questionar as restrições impostas pelos Estados na transferência de seus saldos credores de ICMS, seja para estabelecimentos do mesmo titular, seja para o pagamento de fornecedores, seja para terceiros, podem contar com o entendimento consolidado da 1ª e 2ª Turmas do Superior Tribunal de Justiça (STJ), as quais formam a 1ª Seção, que é a responsável pela uniformização da jurisprudência relativa a questões tributárias, conforme se verifica dos julgados abaixo transcritos:

"TRIBUTÁRIO - ICMS - CRÉDITOS ACUMULADOS - TRANSFERÊNCIA A TERCEIROS (CF/88, ART. 155, § 2º, XII e ART. 25, § 1º, II, LC 87/96)
1. O legislador constitucional estabeleceu hipótese de transferência de crédito acumulado, mas delegou à lei complementar a disciplina desta imunidade ou isenção heterônoma.
2. A LC 87/96 estabeleceu no art. 25 duas hipóteses de transferência de crédito acumulado do ICMS. No § 1º, os créditos oriundos de operações de exploração de matéria-prima ou produtos industrializados, como previsto no art. 3º inciso II. No § 2º, delegou ao legislador estadual a escolha das hipóteses, quando pretendesse o contribuinte transferir o seu crédito a terceiro.
3. Hipótese dos autos em que a transferência a terceiros refere-se a créditos oriundos de operações disciplinadas no art. 3º, II, da LC 87/96.
4. Recurso provido (02)."

Ainda com relação a este julgado, vale transcrever a parte final do voto proferido pela Min. Eliana Calmon:

"Pelo texto, não é dado ao legislador estadual qualquer vedação ao aproveitamento dos créditos do ICMS, sob pena de infringir o princípio da não-cumulatividade, quando este aproveitamento se fizer em benefício de qualquer outro estabelecimento seu, no mesmo Estado, ou de terceiras pessoas, observando-se para tanto a origem no art. 3º. É exatamente esta última a hipótese dos autos, porque a empresa objetiva transferir os créditos acumulados para terceiros.
Parece que o Tribunal a quo, ao examinar a querela, olvidou o § 1º e partiu para a interpretação da hipótese do inciso II do § 2º do art. 25 da LC 87/96, o qual não tem aplicação à espécie.
Assim sendo, concluo que têm as recorrentes inteira razão, quando afirmam o equívoco do Tribunal na interpretação do texto pertinente com o pedido, o que lhes garante, sem nenhuma legislação estadual, obter a declaração de crédito de que fala o inciso II, § 1º, da Lei Complementar 87/96, razão pela qual dou provimento ao recurso para conceder a segurança nos termos do pedido."

Mais recentemente, foi publicado relevante precedente (Recurso Especial nº 1.252.683) em que o STJ, reiterando a sua própria jurisprudência, reconhece com precisão a autoaplicabilidade dos direitos concedidos pelaLC 87/96aos exportadores:

"TRIBUTÁRIO. ICMS. LC 87/96. TRANSFERÊNCIA A TERCEIROS DE CRÉDITOS ACUMULADOS EM DECORRÊNCIA DE OPERAÇÕES DE EXPORTAÇÃO. ART. 25, § 1º, DA LC 87/96. NORMA DE EFICÁCIA PLENA. DESNECESSIDADE DE EDIÇÃO DE LEI ESTADUAL REGULAMENTADORA. INVIABILIDADE DE VEDAÇÃO À TRANSFERÊNCIA.
1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça entende que, conforme o disposto no art. 25 da Lei Complementar n. 87/96, há duas hipóteses de transferência de crédito acumulado de ICMS a contribuintes do mesmo Estado: (a) nos termos do § 1º, os créditos oriundos de operações e prestações que destinem ao exterior mercadorias, inclusive produtos primários e produtos industrializados semielaborados, ou serviços; e (b) nos termos do § 2º, os demais casos de saldos credores acumulados, a serem definidos pelo legislador estadual.
2. A primeira hipótese prescinde de lei estadual regulamentadora, pois se trata de norma de eficácia plena. Neste sentido, o Min. Teori Albino Zavascki, no voto-vista proferido no RMS 13.969/PA (1ª Turma, Rel. Min. Francisco Falcão, DJ de 4.4.2005), esclarece: "o art. 25, § 1º, da LC 87/96 é expresso ao conferir ao contribuinte detentor de saldos credores de ICMS acumulados desde a edição desse diploma legal, em razão de operações de exportação, a faculdade de aproveitá-los mediante transferência a qualquer estabelecimento seu no mesmo Estado (inciso I) e, havendo saldo remanescente, mediante transferência a outro contribuinte do mesmo Estado (inciso II) - utilizando-se, nesse segundo caso, de documento expedido pela autoridade fazendária reconhecendo a existência do crédito. Trata-se de norma de eficácia plena, que dispensa qualquer regulamentação por lei estadual. A legislação estadual é requerida apenas para o reconhecimento do direito à utilização, nas modalidades acima descritas, dos demais saldos credores acumulados a partir da decorrentes de exportações, nos inequívocos termos do § 2º do mesmo dispositivo ". Precedentes.
3. Ante a autoaplicabilidade do § 1º do art. 25 da Lei Complementar n. 87/96, e, sendo os créditos oriundos de operações disciplinadas no art. 3º, inciso II, do mesmo normativo, "não é dado ao legislador estadual qualquer vedação ao aproveitamento dos créditos do ICMS, sob pena de infringir o princípio da não-cumulatividade, quando este aproveitamento se fizer em benefício de qualquer outro estabelecimento seu, no mesmo Estado, ou de terceiras pessoas, observando-se para tanto a origem no art. 3º." (RMS 13544/PA, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 19.11.2002, DJ 2.6.2003, p. 229).
Recurso especial provido (03)."

Como se vê, o direito à manutenção e aproveitamento dos saldos credores decorrentes das operações de exportação de mercadorias é garantido peloart. 155, § 2º, X, "a", da Constituição Federal, sendo que oart. 25, § 1º, II, da Lei Complementar 87/96assegura aos contribuintes a possibilidade de transferência desses créditos sem qualquer limitação de legislação estadual ou das autoridades fiscais.

Assim, os contribuintes que se sentirem prejudicados por qualquer tipo de limitação do direito líquido e certo de transferência desses créditos, poderão se socorrer ao poder judiciário com boas chances de êxito.

Notas

(01) Aprovou o Regulamento do ICMS do Estado de Santa Catarina (RICMS/SC).

(02) STJ, ROMS 13.544-PA, Rel. Min. Eliana Calmon, 2ª Turma, j. em 19.11.2002, DJ 2.6.2003.

(03) STJ, RESP 1.252.683-MA, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª Turma, j. em 21.6.2011, DJe 29.6.2011.

 

Marcos Engel Vieira Barbosa, advogado em São Paulo. Graduação em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP). Cursando especialização em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (COGEAE). Membro da Academia Brasileira de Direito Tributário (ABDT) e da Associação Paulista de Estudos Tributários (APET). Associado ao escritório Mariz de Oliveira e Siqueira Campos Advogados.

 
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Incentivos Empresários e consultores do setor portuário aguardam pacote

Incentivos

Empresários e consultores do setor portuário aguardam pacote

Lyne Santos

Empresários e consultores do setor portuário desconhecem os detalhes do novo pacote de concessões para os portos, que deverá ser lançado pelo Governo Federal nas próximas semanas. Porém, estão cientes das mudanças que precisam ser feitas. Com base em medidas previamente anunciadas pela União, alguns envolvidos no segmento já mostram seus anseios.

O presidente da Associação Brasileira de Terminais Portuários (ABTP), Willen Mantelli, é um dos que se mostrou ansioso pela apresentação das novas regras e tem uma opinião formada sobre os pontos que devem sofrer intervenções. E a questão da renovação dos contratos de arrendamento é vista como a mais delicada. 

A expectativa é de que o tema seja incluído no novo pacote. Há anos se espera uma definição sobre o que ocorrerá com os contratos anteriores à Lei de Modernização dos Portos (8.630/93), se vão ser renovados ou passar por uma nova licitação. Para Mantelli, adaptar é a melhor solução. "A lei mandou, tem que adaptar (à legislação) – seja (ficando válido) por 50 anos, conforme previsto na Lei dos Portos, ou por 10 anos, de acordo com a AGU (Advocacia Geral da União)", afirmou o presidente da ABTP. 

Um dos argumentos a favor dessa linha de ação é a demora para licitar os terminais, o que acaba gerando insegurança nos investidores e deixando regiões como as do Norte e Nordeste desabastecidas.

 

Segundo Mantelli, as concorrências demoram muito para serem concluídas. Como exemplos, ele mencionou as licitações realizadas para os arrendamentos do antigo terminal da Vopak, na Ilha Barnabé, no Porto de Santos – em andamento há mais de um ano –, e de instalações nos complexos de Sepetiba (RJ) e Manaus (AM), iniciadas há oito anos e ainda não concluídas. 

"Com a inércia do Governo, os terminais acabam perdendo seu valor. No Norte e no Nordeste, os terminais de combustíveis são fundamentais. Não há outra solução para abastecer", explicou Mantelli.

As questões da Praticagem, da gestão dos portos e dos investimentos também foram abordadas pelo presidente da ABTP. "É preciso aumentar a oferta de práticos para reduzir custo e facilitar a negociação", destacou.

Créditos: Arquivo - Carlos Nogueira

Consultores defendem gestão portuária com menor interferência das autoridades


Willen Mantelli também aponta um excesso de "interferência" na administração dos complexos. Ele observa que há "muita autoridade" nos portos e não está vendo nada que indique uma reestruturação das Docas. "São em torno de oito ou dez ministérios que atuam. É muita autoridade para dizer não. Precisamos reduzir a interferência. Já temos a SEP (Secretaria de Portos, da Presidência da República), a Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários)".

Para o presidente da ABTP, a reestruturação das Docas também traria como vantagem a redução de custos, uma das propostas do Governo. "Há muitas tarefas obsoletas. Em Santos, Itatinga, por exemplo, deveria ser entregue à iniciativa privada. A administradora tem que cuidar do Porto, dos acessos, dragagem, licitações".

Quando o assunto são os investimentos, Mantelli é objetivo. "Para aumentar os investimentos, é preciso dar segurança jurídica, reduzir burocracia, gerar confiança nos investidores", garantiu.

Carga própria

O consultor portuário Marcos Vendramini resumiu em um item qual deveria ser o foco dos planos do Governo para os portos: eliminar a necessidade de carga própria para novos terminais, instituída pela Lei 6.620/ 2008. "Isso foi uma invenção e, se for eliminada, vai ajudar também a diminuir os custos. Mas é necessário que venha acompanhada da prorrogação dos contratos por mais 25 anos. Cortar custos é fazer competição", disse Vendramini. 

A revisão dos contratos de arrendamento para incentivar investimentos também foi vista como necessária pelo especialista. "A taxa de arrendamento hoje é muito alta, dando mais dinheiro ao Governo. Isso prejudica o investidor". 

Em relação ao incentivo à cabotagem (navegação entre portos da costa) previsto pela União, Vendramini lembrou que ainda há empecilhos para o crescimento do setor e observou que é necessário fazer uma pesquisa entre origem e destino das cargas. "Entre 60% e 80% das cargas no Brasil ficam entre o Sul e o Sudeste. Vai fazer cabotagem entre Santos, Rio de Janeiro e Paranaguá (PR), que são bem servidas de meios ferroviários e rodoviários? Quando tiver mais cargas no Norte e Nordeste, aí sim ela se tornará mais interessante", disse.

Iniciativa privada

O advogado especialista em Direito Aduaneiro Felippe Breda vê o aumento da participação da iniciativa privada nos portos como uma saída para alavancar os investimentos e modernizar o setor. Ele acredita que as empresas podem desenvolver projetos com maior celeridade, resolvendo assim questões estruturais dos complexos, como acessos insuficientes, a necessidade de scanners e a implantação da cobertura em terminais para a operação de cargas a granel, entre outros.

"Mas também é importante que haja o rompimento do sistema jurídico", comentou Breda, se referindo à necessidade de remodelação do formato de arrendamento que hoje oferece pouca margem para investimento. "Atualmente também há excesso de burocracia, o sistema é engessado, tudo tem que estar escrito".

 

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