quinta-feira, 21 de junho de 2018

STF: DIREITO TRIBUTÁRIO – PRESCRIÇÃO. Prazo prescricional e tributo declarado inconstitucional - 2



A Segunda Turma, por maioria, conheceu de agravo para dar provimento a recurso extraordinário em que se discute o termo inicial do prazo prescricional para postular restituição de valores pagos a título de cota de contribuição do café, tributo declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF) (1) sem modulação de efeitos (2) ((Informativo 899)).

Quando do ajuizamento da ação, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendia que o prazo prescricional tinha início a partir da data da declaração de inconstitucionalidade da exação pelo STF no controle concentrado, ou de resolução do Senado Federal (SF), no controle difuso.

Essa foi a orientação utilizada pelo tribunal de origem para superar a arguição de prescrição e declarar a incompatibilidade da cota de contribuição do café, determinando a restituição dos valores indevidamente recolhidos.

Em momento posterior, o STJ promoveu revisão abrupta de sua jurisprudência para considerar que, nos tributos sujeitos a lançamento por homologação, o transcurso do prazo prescricional ocorre a partir do recolhimento indevido, independentemente do STF ou do SF (REsp 435.835/SC).

Esse novel entendimento foi aplicado pelo Tribunal Superior no julgamento do recurso especial para reformar o aresto de segundo grau e julgar prescrito o direito à devolução. O recurso extraordinário foi interposto contra esse acórdão.

Para o colegiado, no entanto, a aplicação imediata de novo entendimento do STJ aos processos em curso representa retroação da regra de contagem do prazo prescricional às pretensões já ajuizadas, em afronta ao princípio da segurança jurídica e aos postulados da lealdade, da boa-fé e da confiança legítima, sobre os quais se assenta o próprio Estado Democrático de Direito.

A modificação na jurisprudência em matéria de prescrição não pode retroagir para considerar prescrita pretensão que não o era à época do ajuizamento da ação, em respeito ao posicionamento anteriormente consolidado.

Toda inflexão jurisprudencial que importe restrição a direitos dos cidadãos deve observar certa regra de transição para produção de seus efeitos, levando em consideração os comportamentos então tidos como legítimos, porquanto praticados em conformidade com a orientação prevalecente, em homenagem aos valores e princípios constitucionais. Com base nesse entendimento, restabeleceu o acórdão de segundo grau que, diante da ausência de prescrição, reconhecera o direito à restituição.

Vencidos os ministros Gilmar Mendes (relator) e Edson Fachin, que negaram provimento ao recurso, ao argumento de que a questão relativa à prescrição repetitória de tributos declarados inconstitucionais possui viés nitidamente infraconstitucional. A alegada ofensa à Constituição, se existente, seria reflexa ou indireta, pois o STJ analisou e interpretou apenas a legislação federal [CTN, art. 168 (3)]. Não cabe à Suprema Corte fiscalizar a jurisprudência do STJ em matéria infraconstitucional para apreciar a tese de que a alteração jurisprudencial teria trazido efeitos concretos prejudiciais ao contribuinte.

(1) RE 408.830/ES, DJ de 4.6.2004.
(2) RE 546.649/PR, DJe de 12.3.2015.
(3) Código Tributário Nacional: "Art. 168. O direito de pleitear a restituição extingue-se com o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contados: I - nas hipóteses dos incisos I e II do artigo 165, da data da extinção do crédito tributário; II - na hipótese do inciso III do artigo 165, da data em que se tornar definitiva a decisão administrativa ou passar em julgado a decisão judicial que tenha reformado, anulado, revogado ou rescindido a decisão condenatória."

STF: Impenhorabilidade do bem de família e contratos de locação comercial



Não é penhorável o bem de família do fiador, no caso de contratos de locação comercial. Com base neste entendimento, a Primeira Turma, por maioria e em conclusão de julgamento, deu provimento a recurso extraordinário em que se discutia a possibilidade de penhora de bem de família do fiador em contexto de locação comercial.

Vencidos os ministros Dias Toffoli (relator) e Roberto Barroso que negaram provimento ao recurso. Ressaltaram que o Supremo Tribunal Federal pacificou o entendimento sobre a constitucionalidade da penhora do bem de família do fiador por débitos decorrentes do contrato de locação. A lógica do precedente é válida também para os contratos de locação comercial, na medida em que — embora não envolva o direito à moradia dos locatários — compreende o seu direito à livre iniciativa. A possibilidade de penhora do bem de família do fiador — que voluntariamente oferece seu patrimônio como garantia do débito — impulsiona o empreendedorismo, ao viabilizar a celebração de contratos de locação empresarial em termos mais favoráveis. Por outro lado, não há desproporcionalidade na exceção à impenhorabilidade do bem de família (Lei nº 8009/1990, art. 3º, VII [1]). O dispositivo legal é razoável ao abrir a exceção à fiança prestada voluntariamente para viabilizar a livre iniciativa.

(1) Lei 8.009/1990: "Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido: (...)VII - por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação."

STF: Condução coercitiva para interrogatório e recepção pela Constituição Federal de 1988 - 2



O Plenário, por maioria, julgou procedente o pedido formulado em arguições de descumprimento de preceito fundamental para declarar a não recepção da expressão "para o interrogatório" constante do art. 260 (1) do CPP, e a incompatibilidade com a Constituição Federal da condução coercitiva de investigados ou de réus para interrogatório, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de ilicitude das provas obtidas, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado ((Informativo 905)).

O Tribunal destacou que a decisão não desconstitui interrogatórios realizados até a data desse julgamento, ainda que os interrogados tenham sido coercitivamente conduzidos para o referido ato processual.

Prevaleceu o voto do ministro Gilmar Mendes (relator).

De início, o relator esclareceu que a hipótese de condução coercitiva objeto das arguições restringe-se, tão somente, àquela destinada à condução de investigados e réus à presença da autoridade policial ou judicial para serem interrogados. Assim, não foi analisada a condução de outras pessoas como testemunhas, ou mesmo de investigados ou réus para atos diversos do interrogatório, como o reconhecimento.

Fixado o objeto da controvérsia, afirmou que a condução coercitiva no curso da ação penal tornou-se obsoleta. Isso porque, a partir da Constituição Federal de 1988, foi consagrado o direito do réu de deixar de responder às perguntas, sem ser prejudicado (direito ao silêncio). A condução coercitiva para o interrogatório foi substituída pelo simples prosseguimento da marcha processual, à revelia do acusado [CPP, art. 367 (2)].

Entretanto, o art. 260 do CPP — conjugado ao poder do juiz de decretar medidas cautelares pessoais — vem sendo utilizado para fundamentar a condução coercitiva de investigados para interrogatório, especialmente durante a investigação policial, no bojo de engenhosa construção que passou a fazer parte do procedimento padrão das investigações policiais dos últimos anos. Nessa medida, as conduções coercitivas tornaram-se um novo capítulo na espetacularização da investigação, inseridas em um contexto de violação a direitos fundamentais por meio da exposição de pessoas que gozam da presunção de inocência como se culpados fossem.

Quanto à presunção de não culpabilidade (CF, art. 5º, LVII), seu aspecto relevante ao caso é a vedação de tratar pessoas não condenadas como culpadas.

A condução coercitiva consiste em capturar o investigado ou acusado e levá-lo, sob custódia policial, à presença da autoridade, para ser submetido a interrogatório. A restrição temporária da liberdade mediante condução sob custódia por forças policiais em vias públicas não é tratamento que possa normalmente ser aplicado a pessoas inocentes. Assim, o conduzido é claramente tratado como culpado.

Por outro lado, a dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III), prevista entre os princípios fundamentais do estado democrático de direito, orienta seus efeitos a todo o sistema normativo, constituindo, inclusive, princípio de aplicação subsidiária às garantias constitucionais atinentes aos processos judiciais.

No contexto da condução coercitiva para interrogatório, faz-se evidente que o investigado ou réu é conduzido, eminentemente, para demonstrar sua submissão à força. Não há finalidade instrutória clara, na medida em que o arguido não é obrigado a declarar, ou mesmo a se fazer presente ao interrogatório. Desse modo, a condução coercitiva desrespeita a dignidade da pessoa humana.

Igualmente, a liberdade de locomoção é vulnerada pela condução coercitiva para interrogatório.

A Constituição Federal consagra o direito à liberdade de locomoção, de forma genérica, ao enunciá-lo no "caput" do art. 5º. Tal direito pode ser restringido apenas se observado o devido processo legal (CF, art. 5º, LIV) e obedecido o regramento estrito sobre a prisão (CF, art. 5º, LXI, LXV, LXVI, LXVII). A Constituição também enfatiza a liberdade de locomoção ao consagrar a ação especial de "habeas corpus" como remédio contra restrições e ameaças ilegais (CF, art. 5º, LXVIII).

A condução coercitiva representa uma supressão absoluta, ainda que temporária, da liberdade de locomoção. O investigado ou réu é capturado e levado sob custódia ao local da inquirição. Portanto, há uma clara interferência na liberdade de locomoção, ainda que por um período determinado e limitado no tempo.

Ademais, a expressão "para o interrogatório", constante do art. 260 do CPP, tampouco foi recepcionada pela Constituição Federal, na medida em que representa restrição desproporcional da liberdade, visto que busca finalidade não adequada ao sistema processual em vigor.

Por fim, em relação à manutenção dos interrogatórios realizados até a data desse julgamento, mesmo que o interrogado tenha sido coercitivamente conduzido para o ato, o relator consignou ser necessário reconhecer a inadequação do tratamento dado ao imputado, não do interrogatório em si. Argumentos internos ao processo, como a violação ao direito ao silêncio, devem ser refutados.
Assim, não há necessidade de debater qualquer relação da decisão tomada pelo STF com os casos pretéritos, inexistindo espaço para a modulação dos seus efeitos.

O ministro Celso de Mello acrescentou que a impossibilidade constitucional de constranger-se o indiciado ou o réu a comparecer, mediante condução coercitiva, perante a autoridade policial ou a autoridade judiciária, para fins de interrogatório, resulta não só do sistema de proteção das liberdades fundamentais, mas, também, da própria natureza jurídica de que se reveste o ato de interrogatório.

Referido ato processual é qualificável como meio de defesa do acusado, especialmente em face do novo tratamento normativo que lhe conferiu a Lei 10.792/2003. Essa particular qualificação do interrogatório como meio de defesa permite que nele se reconheça a condição de instrumento viabilizador do exercício das prerrogativas constitucionais do contraditório e da plenitude de defesa.

De todo modo, a ausência de colaboração do indiciado ou réu com as autoridades públicas e o exercício da prerrogativa constitucional contra a autoincriminação não podem erigir-se em fatores subordinantes da decretação de prisão cautelar ou da adoção de medidas que restrinjam ou afetem a esfera de liberdade jurídica do réu.

Por fim, afirmou que não haveria como concluir que a condução coercitiva do indiciado ou do réu para interrogatório, independentemente de prévia e regular intimação, justificar-se-ia em face do poder geral de cautela do magistrado penal. Isso porque, diante do postulado constitucional da legalidade estrita em matéria processual penal, inexiste, no processo penal, o poder geral de cautela dos juízes.

Vencidos, parcialmente, os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia (Presidente).

O ministro Alexandre de Moraes julgou parcialmente procedente o pedido formulado nas arguições para declarar a inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, do art. 260 do CPP, unicamente para excluir a possibilidade de decretação direta da condução coercitiva sem a prévia intimação com base no poder geral de cautela do juiz.

Considerou, assim, legitima a utilização do instituto da condução coercitiva para interrogatório, porém, desde que o investigado não tenha atendido, injustificadamente, prévia intimação, permitida a participação do defensor do investigado e resguardados os direitos ao silêncio e a não-autoincriminação.

O ministro Edson Fachin julgou parcialmente procedente o pedido para atribuir interpretação conforme a Constituição Federal ao art. 260 do CPP no sentido de ressalvar a possibilidade de decretação judicial e fundamentada da condução coercitiva em substituição a medidas cautelares típicas mais graves, como a prisão preventiva ou a prisão temporária, desde que integralmente presentes os requisitos legais e constitucionais dessas medidas.

Ademais, declarou a inconstitucionalidade da interpretação ampliativa do dispositivo impugnado, impondo-se a prévia intimação e o não comparecimento injustificado do intimado para a realização da condução coercitiva.

Os ministros Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia (Presidente) acompanharam o ministro Edson Fachin.

(1) CPP: "Art. 260.  Se o acusado não atender à intimação para o interrogatório, reconhecimento ou qualquer outro ato que, sem ele, não possa ser realizado, a autoridade poderá mandar conduzi-lo à sua presença."
(2) CPP: "Art. 367. O processo seguirá sem a presença do acusado que, citado ou intimado pessoalmente para qualquer ato, deixar de comparecer sem motivo justificado, ou, no caso de mudança de residência, não comunicar o novo endereço ao juízo."

STF: ICMS: ED e modulação de efeitos em ADI



O Plenário, por maioria e em conclusão de julgamento, rejeitou embargos de declaração opostos com vistas à modulação dos efeitos da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) que julgara procedente o pedido formulado na ação direita inconstitucionalidade, por ofensa ao art. 155, § 2º, XII, "g" (1), da Constituição Federal (Informativo 423).

Naquela assentada, foi aplicada interpretação conforme à Constituição ao inciso I do art. 5º da Lei paraense 6.489/2002, no sentido de determinar a exclusão do seu âmbito de aplicação dos créditos relativos ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) que não tivessem sido objeto de convênio anterior.

O Colegiado asseverou que a proposta de modulação de efeitos foi enfrentada e recusada no próprio julgamento de mérito.

Vencidos os ministros Dias Toffoli e Edson Fachin, que acolheram os embargos. Para eles, o Tribunal deveria modular os efeitos da decisão, diante do entendimento atual do STF sobre modulação nos casos de guerra fiscal, o fato de a norma estar em vigor há muitos anos e a edição da Lei Complementar 160/2017.

(1) CF: "Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: (...) § 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: (...) XII - cabe à lei complementar: (...) g) regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados."

STF: ADI e vinculação de receitas de impostos - inconstitucionalidade



São inconstitucionais as normas que estabelecem vinculação de parcelas das receitas tributárias a órgãos, fundos ou despesas, por desrespeitarem a vedação contida no art. 167, IV (1), da Constituição Federal (CF).


Com esse entendimento, o Plenário julgou procedente pedido formulado em ação direta para declarar a inconstitucionalidade do art. 226, § 1º (2) (renumeração do art. 223), da Constituição do Estado do Rio de Janeiro, que cria o Fundo de Desenvolvimento Econômico e a ele destina recursos provenientes do Fundo de Participação dos Estados.


O Colegiado julgou, ainda, prejudicada a ação quanto ao art. 56 (3) do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição estadual por se tratar de norma cuja eficácia se exauriu há dezoito anos.

(1) CF: "Art. 167. São vedados: (…) IV – a vinculação de receita de impostos a órgão, fundo ou despesa, ressalvadas a repartição do produto da arrecadação dos impostos a que se referem os arts. 158 e 159, a destinação de recursos para as ações e serviços públicos de saúde, para manutenção e desenvolvimento do ensino e para realização de atividades da administração tributária, como determinado, respectivamente, pelos arts. 198, § 2º, 212 e 37, XXII, e a prestação de garantias às operações de crédito por antecipação de receita, previstas no art. 165, § 8º, bem como o disposto no § 4º deste artigo."
(2) Constituição do Estado do Rio de Janeiro: "Art. 226 – Fica criado o Fundo de Desenvolvimento Econômico, voltado para o apoio e estímulo de projetos de investimentos industriais prioritários do Estado. § 1º – Ao Fundo de Desenvolvimento Econômico serão destinados recursos de, no mínimo, 10% (dez por cento) do total anualmente transferido para o Estado, proveniente do Fundo de Participação dos Estados, previsto no artigo 159, inciso I, letra 'a', da Constituição da República, dos quais 20% (vinte por cento) se destinarão a projetos de microempresas e de empresas de pequeno porte."
(3) Ato das Disposições Constitucionais Transitórias do Estado do Rio de Janeiro: "Art. 56 – Durante dez anos o Estado aplicará, no mínimo, 10% (dez por cento) dos recursos do Fundo para o Desenvolvimento de que trata o artigo 226 nos projetos de infra-estrutura para industrialização, assegurando o desenvolvimento econômico das regiões norte e noroeste fluminenses, de acordo com os planos municipais e regionais de desenvolvimento, ficando assegurada aos Municípios do noroeste fluminense a metade dos recursos destinados às regiões."