No moderno direito processual civil, as relações jurídicas têm se tornado cada vez mais dinâmicas, numerosas e economicamente relevantes, sobretudo no âmbito das demandas coletivas. A quadra atual é marcada pela atuação de sindicatos e associações, na condição de representantes ou substitutos processuais, tutelando interesses de toda uma categoria, em abstrato.
Torna-se bastante comum – sobretudo nas demandas contra a Fazenda Pública – a certificação de direitos a todos os membros de um grupo social, no processo de conhecimento, para posterior ajuizamento de execuções individualizadas, à medida em que forem se manifestando os interessados – servidores públicos de certa carreira ou contribuintes de dado tributo, exempli gratia.
Surge, então, uma perplexidade. Após a formação do título executivo no processo de conhecimento – titularizado comumente por sindicatos de servidores públicos ou associações de contribuintes –, começam a se pronunciar, pouco a pouco, os interessados individuais, requerendo a execução da sentença e a percepção dos valores devidos pela Fazenda Pública.
Mas é de se questionar: até quando são possíveis essas execuções? Qual é o prazo de que dispõem os interessados individuais para executar títulos formados em processos de conhecimento protagonizados por legitimados coletivos? Ou, em outras palavras: qual é o prazo prescricional aplicável à execução de títulos executivos judiciais, em especial aqueles formados contra a Fazenda Pública?
Em verdade, essas mesmas indagações têm lugar em qualquer execução, e não apenas naquelas intentadas por interessados individuais em processos coletivos ajuizados contra a Fazenda Pública. Entretanto, a prática demonstra que, nas ações de conhecimento ajuizadas por legitimados individuais, por sua própria natureza, as execuções quase sempre são deflagradas imediatamente após o trânsito em julgado, o que esvazia quaisquer discussões sobre o lapso prescricional aplicável. Por outro lado, considerando que a maioria das demandas coletivas são manejadas em face do Estado, é mesmo esse o viés da discussão que apresenta maior aplicabilidade cotidiana.
Nas propostas de resposta a essa perplexidade, os extremos se apresentam bastante perigosos. De um lado, a fixação de lapsos prescricionais demasiado exíguos para a execução poderia representar o esvaziamento da tutela coletiva, violando sobremaneira o princípio da efetividade do processo. Nada obstante, a inexistência de prazos prescricionais nessa fase do processo ou a adoção de prazos excessivamente elásticos representaria a eternização de inúmeras lides, violando o próprio princípio fundamental do instituto da prescrição: a estabilização das relações sociais com o decurso do tempo.
Historicamente, buscando a resolução dessa vexata questio, o Supremo Tribunal Federal editou, na década de 1960 – ainda tratando sobre demandas individuais que não envolviam a Fazenda Pública – o Enunciado 150 de sua Súmula, com o seguinte teor: "prescreve a execução no mesmo prazo de prescrição da ação". Na época, ainda se discutia se a execução estava ou não sujeita a prazo prescricional; e, na hipótese positiva, questionava-se se esse prazo seria o mesmo prazo aplicável ao processo de conhecimento ou se seria aplicável o lapso geral de vinte anos, previsto no Código Civil de 1916. À época, o Pretório Excelso entendeu que a execução era prescritível, bem como que o lapso temporal aplicável não era o vintenário, mas sim o mesmo aplicável à ação de conhecimento.
Nos dias atuais, a discussão mudou sua roupagem e passou a incidir especificamente sobre as causas ajuizadas em face da Fazenda Pública. Como sabido, o lapso prescricional aplicável nas demandas contra o Estado é de cinco anos; e, uma vez havendo interrupção desse prazo, voltará ele a correr pela metade, e não em sua integralidade.
Então, questiona-se se, uma vez interrompido o prazo prescricional pelo ajuizamento da ação de conhecimento manejada contra a Fazenda, o interessado individual disporia de mais dois anos e meio para propor a execução (retorno do prazo pela metade) ou se disporia de cinco anos para tal desiderato (retorno do prazo em sua integralidade).
O Superior Tribunal de Justiça tem sólido entendimento jurisprudencial no sentido de que, em hipóteses como essa, o interessado disporá de mais cinco anos, após o trânsito em julgado, para o manejo da execução. Como única justificativa para essa postura, invoca-se o histórico enunciado 150 da Súmula do STF, o qual preceitua, como visto, que "a execução prescreve no mesmo prazo de prescrição da ação".
Nada obstante, em que pese a consolidação do entendimento do Superior Tribunal de Justiça, o argumento não parece coerente, sobretudo quando se analisam os precedentes da Súmula 150, bem como a natureza jurídica dos institutos da prescrição e da pretensão.
Há duas formas gerais para examinar o tema: a primeira é defender-se que há uma pretensão de conhecimento e uma outra pretensão – autônoma e independente – de execução. Assim, a pretensão de conhecimento teria lapso temporal de cinco anos, e, após o trânsito em julgado, nasceria uma outra pretensão – desvinculada da primeira –, cujo prazo seria de mais cinco anos.
Já a segunda visão acerca da matéria é preconizar-se a existência de uma única pretensão, que nasce com a violação ao direito subjetivo da parte, interrompe-se com a citação válida e volta a correr após o fim do processo de conhecimento. Contudo, como, no caso específico da Fazenda Pública, após toda interrupção do curso prescricional, o lapso volta a correr pela metade, o interessado disporá de dois anos e meio para a promoção da execução.
Nessa linha, a tese atualmente adotada pelo Superior Tribunal de Justiça – no sentido de que, após o trânsito em julgado, o interessado disporia de mais cinco anos para promover a execução – somente se sustentaria caso se admitisse a existência de duas pretensões e prescrições autônomas e distintas (uma para o conhecimento e outra para a execução), e não de uma única pretensão e de uma única prescrição, que se inicia na lesão ao direito material da parte, interrompe-se com a citação e volta a correr após o trânsito em julgado.
Contudo, o fato é que os precedentes da Súmula 150 do STF – utilizados pelo STJ como único fundamento para suas decisões – indicam justamente que só há uma pretensão e uma prescrição, ou seja: os precedentes da Súmula 150 – e a própria Súmula, por conseguinte – quando examinados com minúcia, terminam por militar em favor do prazo de dois anos e meio para promoção da execução, e não do lapso prescricional de cinco anos após o trânsito em julgado, adotado pelo STJ.
O fundamento utilizado pelo STJ (Súmula 150 do STF), em vez de justificar as decisões que vêm sendo adotadas (prazo prescricional de cinco anos para a execução), conduz à conclusão diametralmente oposta (prazo de dois anos e meio para a promoção executiva).
Explica-se. Conforme dispõem o Decreto 20.910/32 e o Decreto-Lei 4.597/42, o prazo prescricional da pretensão contra a Fazenda Pública é de cinco anos, e, uma vez interrompido, volta a correr pela metade.
O Código de Processo Civil e o Código Civil, por seu turno, preceituam que a citação do Réu na ação de conhecimento interrompe o fluxo do prazo prescricional, o qual volta a correr (em regra, para as partes em geral, pela sua totalidade) após o trânsito em julgado da sentença. Exatamente por isso é que o Supremo Tribunal Federal editou a Súmula 150, a qual preceitua que o prazo prescricional para a execução da sentença é o mesmo prazo prescricional que havia se deflagrado para o ajuizamento da ação de conhecimento.
Ocorre que, com relação especificamente à Fazenda Pública, essa regra tem outra aplicação. O artigo 9º do Decreto 20.910/32 deixa claro que, interrompida a prescrição da pretensão contra a Fazenda Pública, o prazo volta a correr pela metade, e não integralmente, como ocorreria com as partes em geral.
Assim, no que concerne à Fazenda Pública, a interpretação da Súmula 150 do STF tem outro reflexo: de fato, o prazo prescricional para a execução da sentença é o mesmo que havia se deflagrado para o ajuizamento da ação de conhecimento (como determina o verbete); mas, justamente porque se trata da segunda fluência desse prazo (que já foi interrompido quando da citação da Ré e recomeçou a correr após a sentença), então correrá ele pela metade, em atenção à regra especial do Decreto 20.910/32.
Com efeito, a tese utilizada pelo Superior Tribunal de Justiça para justificar o lapso prescricional de mais cinco anos para a execução – ou seja, a tese das duas pretensões autônomas, uma de conhecimento e outra de execução – não encontra lastro sólido, quer sob o prisma da Teoria Geral do Direito; quer pelas disposições expressas do Código Civil (arts. 189 e 202); quer, sobretudo, em razão dos precedentes da própria Súmula 150 do STF (RE 49.434).
Conforme ensina a Teoria Geral do Direito, a pretensão nasce com a violação ao direito subjetivo e consiste no poder jurídico conferido ao titular do direito violado, no sentido de cobrar coercitivamente do devedor o adimplemento da obrigação. Frise-se: a pretensão nasce sempre da violação a um direito material.
O trânsito em julgado da sentença de conhecimento não representa nenhum tipo de violação a direito material, e é exatamente por isso que ele não faz nascer uma nova pretensão, mas tão-somente faz voltar a correr o prazo prescricional da pretensão (única) que nasceu quando da violação ao direito subjetivo discutido em Juízo. É exatamente nesse sentido que dispõe claramente o Código Civil:
Art. 189. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206....
Art. 202. A interrupção da prescrição, que somente poderá ocorrer uma vez, dar-se-á: I - por despacho do juiz, mesmo incompetente, que ordenar a citação, se o interessado a promover no prazo e na forma da lei processual; (...)
Parágrafo único. A prescrição interrompida recomeça a correr da data do ato que a interrompeu, ou do último ato do processo para a interromper.
É dizer: a pretensão nasce com a violação ao direito material (art. 189) e se extingue pelo decurso do prazo prescricional. Esse prazo, por seu turno, interrompe-se com a citação no processo de conhecimento (art. 202, I) e volta a correr da data do último ato desse processo: a sentença, após o trânsito em julgado (art. 202, parágrafo único).
A Lei não aduz, em nenhum momento, que nasce uma nova pretensão ou que se inicia um novo prazo após o último ato do processo de conhecimento. Pelo contrário: ela deixa claro que, após o último ato do processo, "a prescrição interrompida recomeça a correr" (frise-se: a mesma prescrição, cujo prazo havia se iniciado antes, recomeça a correr; e não uma nova prescrição autônoma, surgida somente após o final do processo do conhecimento, começa a correr).
O legislador foi claro e não deixou lacunas.
Note-se que nem ao menos se poderia afirmar que a Fazenda Pública estaria violando novamente o direito material do particular ao não pagar espontaneamente o crédito, após o trânsito em julgado, e isso faria surgir uma nova pretensão. Como sabido, a Fazenda, ao não pagar espontaneamente o débito reconhecido por sentença transitada em julgado, não está praticando qualquer sorte de violação ao Direito Material, mas, pelo contrário, está cumprindo o mandamento jurídico expresso no ordenamento pátrio (art. 100 da CF, arts. 730 e 731 do CPC), no sentido de que a Fazenda Pública somente pode pagar débitos derivados de sentença transitada em julgado após o ajuizamento de ação de execução e a expedição de precatórios.
Naturalmente, não se pode dizer que o Estado, ao cumprir o ordenamento jurídico pátrio (art. 100 da CF, arts. 730 e 731 do CPC) esteja, ao mesmo tempo, fazendo nascer uma nova pretensão, pois toda pretensão legítima (afronta efetiva a direito subjetivo) nasce somente de uma violação ao ordenamento jurídico, e não do seu cumprimento.
Com efeito, a pretensão surgiu quando o Estado, originariamente, deixou de pagar o crédito, e foi justamente por essa atuação desconforme ao Direito que ele foi condenada na sentença. Tudo que advém depois – inclusive a necessidade de ajuizamento de ação de execução após o trânsito em julgado – é mero reflexo das regras processuais pátrias para que o particular possa exercer essa sua pretensão reparatória única e indivisa contra a Fazenda.
É exatamente no sentido ora defendido que se configuram os precedentes da própria Súmula 150 do STF, a qual, com as vênias de praxe, tem sido indevidamente interpretada pelo Superior Tribunal de Justiça.
O voto condutor do RE 49.434 (um dos três precedentes do verbete) afirma expressamente que a sentença e o seu respectivo trânsito em julgado não fazem surgir qualquer tipo de nova pretensão, mas tão-somente encerram a interrupção e reiniciam o curso do prazo prescricional da mesma pretensão (única) que havia nascido antes do processo de conhecimento, quando a Fazenda violou o direito material da parte.
Dispõe o voto do Relator, Ministro Victor Nunes Leal:
"Conheço do recurso pela letra d, reportando-me ao citado precedente do Supremo Tribunal. Também recordo, a respeito, a lição de Amilcar de Castro, Com. Ao Cód. Proc civil, v. 10, p. 426: 'A sentença não opera novação, nem cria direitos: é ato judicial meramente interruptor da prescrição. E, assim sendo, desde sua data recomeça a correr a prescrição do direito e, demorando a execução, ou suspensa em qualquer ponto a instância da execução, por tanto tempo quanto tenha a lei fixado para a prescrição do direito declarado na sentença, prescrito ficará esse direito. Assim, conhecendo do recurso, dou-lhe provimento para declarar prescrita a execução" (RE 49.434, Rel. Min. Victor Nunes, DJ 24.05.1962).
Como visto, o precedente da Súmula 150 do STF não afirmou que a sentença faria surgir uma nova pretensão ou um novo prazo prescricional apartado e independente do primeiro. Pelo contrário: ele afirmou que a sentença é mera interrupção da prescrição e faz recomeçar o mesmo prazo prescricional que havia começado a correr quando da violação ao direito material da parte.
Como os três precedentes da Súmula 150 se referiam a processos entre particulares, naturalmente o reinício do prazo prescricional, após a interrupção, se dava novamente pela integralidade do prazo. Mutatis mutandis, em se tratando de prescrição contra a Fazenda Pública, aplica-se o art. 9º do Dec. 20.910/32, o qual afirma que, uma vez interrompida a prescrição, volta ela a correr pela metade do prazo de cinco anos.
A questão fundamental, entretanto, é entender que se trata de mero recomeço do prazo prescricional originário (após a interrupção), e não de nascimento de uma nova pretensão e de um novo prazo prescricional – e nesse sentido, o precedente da Súmula 150 do STF (RE 49.434) não deixa quaisquer dúvidas sobre a procedência da tese ora exposta pela Fazenda Pública.
Assim, se não se trata do nascimento de uma nova pretensão (pois não houve nova violação a direito material com o trânsito em julgado), então, no caso específico da Fazenda Pública, o prazo há de voltar a correr pela metade, após o término da interrupção causada pelo processo de conhecimento.
Na mesma linha do quanto disposto pelo Código Civil e pelos precedentes da Súmula 150 do STF, é necessário notar que o art. 3º do DL 4.597/42 determina expressamente que a prescrição das pretensões contra a Fazenda Pública ocorre dois anos e meio após o trânsito em julgado da sentença. Frise-se: a lei afirma, de forma literal, que o prazo é de dois anos e meio após o trânsito em julgado. É o que se observa:
Art. 3º. A prescrição das dívidas, direitos e ações a que se refere o Decreto nº 20.910, de 6 de janeiro de 1932, somente pode ser interrompida uma vez, e recomeça a correr, pela metade do prazo, da data do ato que a interrompeu, ou do último do processo para a interromper; consumar-se-á a prescrição no curso da lide sempre que a partir do último ato ou termo da mesma, inclusive da sentença nela proferida, embora passada em julgado, decorrer o prazo de dois anos e meio.
Em síntese: afirmar que a prescrição para executar a sentença contra a Fazenda seria de cinco anos após o trânsito em julgado (supostamente com base na Súmula 150 do STF) é absolutamente contra legem. Constitui violação a dispositivo legal expresso e literal (que determina ser a prescrição de dois anos e meio após o trânsito em julgado), tomando como único lastro a interpretação equivocada de uma Súmula cujos precedentes, em verdade, ao contrário de infirmarem o quanto disposto no art. 3º do DL 4.597/42, reafirmam e corroboram esse preceito legal.
O exame minucioso dos precedentes da Súmula 150 do STF, em cotejo com o artigo 9º do Decreto 20.910/32; com o artigo 3º do DL 4.597/42; com os artigos 189 e 202, parágrafo único, do CC; bem como com os preceitos da Teoria Geral do Direito; revela ser mais acertada a tese de que, após a interrupção gerada pelo processo de conhecimento, o prazo prescricional para cobrar dívidas da Fazenda Pública recomeça a correr pela metade (dois anos e meio), e não integralmente (cinco anos), como tem afirmado o Superior Tribunal de Justiça.
Trata-se de uma única pretensão, que nasce com a violação ao direito material da parte, interrompe-se com a citação válida do processo de conhecimento e volta a correr após o término do processo. Considerando que, nos termos do artigo 9º do Decreto 20.910/32 e do artigo 3º do DL 4.597/42, o lapso prescricional em face da Fazenda Pública volta a correr pela metade após qualquer tipo de interrupção, é de se concluir que esse prazo – originalmente de cinco anos – volta a fluir por mais dois anos e meio após o trânsito em julgado.
Não há razoabilidade em se falar que a pretensão de execução é uma pretensão apartada da de conhecimento, pois, consoante a Teoria Geral do Direito, toda pretensão somente nasce com a violação a um direito material, e o simples trânsito em julgado de uma sentença não constitui qualquer violação a direito material.
Violação houve, apenas, na origem, quando a Fazenda deixou de pagar o que devia no prazo correto, ainda antes do processo de conhecimento. Tudo que adveio depois é mera concretização da pretensão (única e indivisível) surgida nesse momento. Ela foi exercida com o ajuizamento da ação, teve seu prazo prescricional interrompido pela citação, voltou a fluir pela metade após o trânsito em julgado e, por fim, há de ser concretizada mediante promoção da execução, no preciso lapso legal de dois anos e meio após o referido trânsito em julgado.
É essa a postura mais consentânea com o ordenamento jurídico, a Teoria Geral do Direito e a própria origem histórica do Enunciado 150 da Súmula do Supremo Tribunal Federal.
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