quinta-feira, 9 de maio de 2013

É NULA FISCALIZAÇÃO QUE QUEBRA SIGILO SEM ORDEM JUDICIAL


Fato comum no cotidiano, a fiscalização tributária tira o sono de muitos empresários e pessoas físicas.  Munidos de Mandado de Procedimento Fiscal, o fisco inicia os procedimentos de fiscalização bombardeando o contribuinte com intimações  solicitando documentos e ameaçando impor multa e sações pela falta de entrega das informações e documentos no prazo solicitado.

 

Ocorre que dentre as inumeras informações e documentos solicitados, em muitas vezes estão exigência ilegais e descabidas, em especial informações sigilosas como extratos bancários e demais informações acerca de depósitos e movimentações financeiras.

No entanto, em que pese a princípio esta prerrogativa do fisco prevista na Lei Complementar n.º 105/2001 em intimar o contribuinte para exibir extratos bancários e demais informações financeiras, o Pleno do Supremo Tribunal Fedral STF, justificando o princípio da dignidade da pessoa humana, atribuiu que o cidadão tem direito constitucional à inviolabilidade de suas informações pessoais, dentre elas, a bancária, de maneira que foi extirpada do ordenamento jurídico a quebra do sigilo bancário sem autorização judicial.

Isto porque , o sigilo, in casu, deriva da inviolabilidade do sigilo de dados, preconizada no art. 5º, XII, da Constituição da República.

 

Portanto,  embora na maioria dos casos alegue o Fisco que a quebra do sigilo bancário ocorre tão somente para fins de acesso aos dados cadastrais do contribuinte, entendemos que a decisão do STF deve ser respeitada e o Fisco deve se abster de tal prática, sob pena de ter seus atos ANULADOS pelo judiciário.

 

Nesse contexto, tendo em vista a decisão proferida mencionada pelo Plenário da Suprema Corte, em que foi dada interpretação conforme a Constituição da República à Lei n.º 9.311/96, à Lei Complementar n.º 105/2001, bem como ao Decreto n.º 3.724/01, para determinar a impossibilidade de afastar-se o sigilo bancário de pessoa natural ou de pessoa jurídica sem autorização judicial, É NULA A FISCALIZAÇÃO QUE QUEBRA SIGILO SEM ORDEM JUDICIAL.

 

Não é outro o entendimento adotado recentemente pelo TRF-3:

 

AGRAVO LEGAL. DECISÃO MONOCRÁTICA. ART. 557, CAPUT, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. FISCALIZAÇÃO TRIBUTÁRIA. QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO SEM PRÉVIA AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTE DO STF.

I - Nos termos do caput e §1°-A, do art. 557, do Código de Processo Civil e da Súmula 253/STJ, o Relator está autorizado, por meio de decisão monocrática, a negar seguimento ou a dar provimento ao recurso e ao reexame necessário, nas hipóteses de pedido inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com a jurisprudência dominante da respectiva Corte ou de Tribunal Superior.

II - O Supremo Tribunal Federal, conferindo interpretação conforme a Constituição da República à Lei n. 9.311/96, à Lei Complementar n. 105/2001, bem como ao Decreto n. 3.724/01, decidiu pela impossibilidade de a Receita Federal quebrar o sigilo bancário do contribuinte sem prévia autorização judicial (cf.: RE 389808/PR, Tribunal Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, j. em 15.12.10).

III - Entendimento incontrastável que se adota para determinar a abstenção do fornecimento da movimentação financeira relativa ao Mandado de Procedimento Fiscal constante dos autos, sem a devida autorização judicial.

IV - Agravo legal improvido.

(TRF3, AC n.º 2001.61.08.003646-0/SP, Rel. Des. Fed. REGINA COSTA, Sexta Turma, j. 06/09/2012, D.E. 21/09/2012)

 

Por fim, deve o contribuinte buscar o judiciário sempre que houver fiscalização e/ou auto de infração que resultar em intimação para quebra de sigilo sem ordem judicial e saber que ante a decisão do Pleno do STF, está desobrigado a juntar seus extratos e demais documentos de movimentação financeira, sem apresentação de ordem judicial competente.

 

AUGUSTO FAUVEL DE MORAES - Advogado do Escritório Fauvel e Moraes Sociedade de Advogados, pós graduado em Direito Tributário pela Unisul, Especialista em Direito Penal Econômico pela Universidade de Coimbra, Presidente da Comissão de Direito Aduaneiro da OAB/SP

quarta-feira, 8 de maio de 2013

O valor aduaneiro define o preço de transferência

CONSULTOR TRIBUTÁRIO


Por Gustavo Brigagão

A vinculação entre as partes de uma mesma transação, quer seja decorrente de vínculo societário, administrativo, pessoal ou contratual, faz com que a legislação de regência de alguns tributos estabeleça regras próprias relativas à definição das respectivas bases de cálculo, de forma a que delas sejam expurgadas as possíveis influências que possam decorrer de tal vinculação.

Busca-se, em outras palavras, evitar que a manipulação indevida de preços de que decorra a atribuição de valores fictícios a operações realizadas por partes relacionadas (distantes daqueles que seriam acordados em uma relação normal de mercado, entre terceiros independentes) possa desnaturar a base de cálculo dos tributos nelas incidentes e, consequentemente, causar prejuízos ao erário.

Isso é feito por meio da aplicação de métodos cujo objetivo é a obtenção do valor que seria adotado em condições normais de mercado (arm's length), à luz do qual a base de cálculo daqueles tributos deverá ser dimensionada.

É o caso, por exemplo, do IPI, cuja legislação determina que a base de cálculo utilizada em operações realizadas entre empresas interdependentes deva ser o preço praticado no mercado atacadista na praça do remetente. Ou do ICMS, cujas regras de incidência determinam que, na hipótese em que o valor do frete seja cobrado por estabelecimento pertencente ao mesmo titular da mercadoria, ou "por outro estabelecimento de empresa que com aquele mantenha relação de interdependência", o montante excedente ao constante de tabelas elaboradas pelos órgãos competentes será considerado como parte do preço da mercadoria.

Nas relações internacionais entre partes relacionadas, há também regras a serem observadas no que concerne à incidência dos tributos que incidem sobre a renda (IRPJ e CSL) e dos que incidem sobre o comércio exterior.

Em relação ao primeiro grupo, relativo aos tributos que incidem sobre a renda, desde 1996, o Brasil instituiu regras específicas de "Preços de Transferência" (PT) que, em relação às importações, visam fixar um limite máximo do preço do bem proveniente do exterior, de forma a impedir que partes relacionadas aumentem artificialmente os custos do contribuinte brasileiro e reduzam indevidamente a renda a ser tributada no país. Tal limite pode ser estabelecido por diversos métodos previstos na legislação, que visam estimar o já mencionado preço arm´s length[1].

No caso dos tributos federais que oneram a importação de bens, como o Imposto de Importação, IPI e PIS/Cofins[2], a respectiva base de cálculo é o Valor Aduaneiro (VA) que, em regra, corresponde ao montante efetivamente atribuído à operação. Contudo, caso haja vínculo entre o comprador e o vendedor, determina-se a verificação da eventual influência dessa vinculação sobre o preço declarado.

Verificada a inexistência dessa influência, o valor aduaneiro se mantém inalterado.

Se, por outro lado, constata-se a referida influência por meio da comparação do preço adotado com aquele obtido com algum dos métodos previstos na legislação aplicável[3] (bastante similares na essência àqueles utilizados para fins de "Preços de Transferência"), o valor declarado pelo importador é substituído por aquele alcançado após a referida comparação.

Repare o leitor que, neste último caso, o Fisco efetivamente interfere no processo de fixação da base de cálculo a ser adotada, e expressamente determina, por meio da aplicação dos métodos previstos no Acordo de Valoração Aduaneira (AVA), o valor que terá o produto a ser importado (VA).

Pergunta-se: poderia o valor aduaneiro obtido pela aplicação dos métodos referidos no parágrafo anterior ser superior ao limite máximo de atribuição de custo dos bens importados obtido por meio da aplicação das regras de PT? Poderia haver divergência na aplicação de métodos tão semelhantes, relativamente à incidência de tributos que são cobrados pelo mesmo ente político tributante?

Em linhas gerais, aqueles que defendem a autonomia desses institutos (VA e PT) fundamentam-se no pressuposto de que as regras de ambos teriam enfoques distintos: o primeiro (VA) teria caráter objetivo, voltado exclusivamente para a apuração do valor do bem importado, enquanto o segundo (PT) teria caráter subjetivo, buscando verificar se uma das partes reduziu artificialmente os seus lucros[4]. Para outros[5], aos quais me associo, esse não parece ser o melhor caminho. É, de fato, natural que se estabeleça uma conexão entre os dois institutos.

Apesar de movidos por interesses distintos e, por vezes, opostos (na aplicação do VA, o Fisco objetiva ampliar a base dos tributos aduaneiros, enquanto que, na do PT, ele busca reduzir os custos de importação; no VA, afere-se o valor do produto em si e, no PT, busca-se constatar se uma das partes da transação obteve desvantagem indevida no negócio, minorando artificialmente os seus lucros; o VA é aplicável a bens, enquanto o PT é aplicável a bens, serviços e direitos), há duas características que vinculam umbilicalmente esses institutos: ambos têm aplicação na apuração da base de cálculo de tributos federais (ou seja, de tributos cobrados pelo mesmo ente político) e, também em ambos, busca-se a valoração de operações entre partes vinculadas, de forma a que elas se tornem isentas das distorções oriundas de tal vinculação (preço arm´s length).

Não é de se esperar nem admitir que, da aplicação de métodos tão semelhantes como aqueles inerentes ao VA e ao PT, relativamente a uma mesma transação — realizada entre as mesmas partes — possa haver alteração do valor que lhe tenha sido atribuído de forma a que (a) a base de cálculo dos tributos incidentes na importação seja inflada e, ao mesmo tempo, (b) sejam limitados os custos da importação para fins de IRPJ, tudo sempre no interesse do Fisco.

Decorre do simples bom senso a conclusão de que o mesmo ente político tributante (União) não pode avaliar de formas díspares um único fato econômico (importação realizada entre pessoas vinculadas) e, daí, obter a maior arrecadação possível de todos tributos da sua competência incidentes sobre o comércio exterior e a renda.

Na medida em que haja efetiva interveniência das autoridades fiscais na apuração do VA, por meio da aplicação de algum dos métodos previstos na legislação aplicável e da consequente substituição do preço originalmente adotado na transação, esse valor poderá e deverá ser tido como custo para o importador para fins de apuração do IR, mesmo que superior ao limite obtido pela aplicação das regras de PT.

Como bem demonstra Miguel Hilú Neto, em excelente artigo sobre a matéria, conclusão contrária representaria ofensa aos princípios constitucionais da igualdade, da capacidade contributiva e da segurança jurídica, além do próprio arm's length, que, apesar de objetivado por ambos os institutos, estaria incoerentemente sendo demonstrado de forma diferenciada. Para o autor, "a valoração aduaneira que implique substituição do valor declarado em operações de importação ou de exportação de partes vinculadas deve ser considerada quando da aplicação e da fiscalização do IRPJ".

Na Conferência da OCDE sobre Preços de Transferência e Valoração Aduaneira ocorrida em Bruxelas, nos dias 3 e 4 de maio de 2006, os métodos de VA e TP foram comparados, de forma a identificar as suas principais similaridades/diferenças e propiciar o debate sobre a necessidade e conveniência da convergência dos dois sistemas de valoração.

Os que foram cautelosos quanto a essa convergência se fundamentaram nos mesmos argumentos levantados pela doutrina especializada nacional citada acima, ou seja, no pressuposto de que os dois institutos teriam enfoques distintos, o que seria demonstrado claramente pelas diferenças entre os métodos de apuração do preço arm´s length.

Os que foram a favoráveis a essa convergência argumentaram que a existência de dois grupos de regras sobre uma mesma valoração, aplicados por uma só entidade governamental, poderia gerar problemas de credibilidade. Além disso, essa duplicidade de regras e a necessidade do seu cumprimento acarretariam um injustificado aumento de compliance costs (custo de adequação/atendimento às exigências fiscais) para os contribuintes, bem como de enforcement costs(custo de imposição/fiscalização das exigências fiscais) para o Governo. Não obstante a divergência apontada acima, a conclusão da Conferência foi no sentido de que é necessário aumentar o diálogo entre as duas fiscalizações, criando fóruns de discussão que permitam a identificação de oportunidades de convergência entre ambos os institutos.

Posição similar foi adotada pela International Chamber of Commerce (ICC) que, em estudo elaborado no ano passado, concluiu que, apesar da existência de diversas diferenças, é indispensável que haja uma harmonização entre os dois institutos, de forma que não sejam alcançados resultados incompatíveis entre si.

Reconheço que o assunto é polêmico, mas espero que, ao final, o bom senso prevaleça.


[1] Em linhas gerais, os métodos aplicáveis para fins de TP são os seguintes:
i) Método dos Preços Independentes Comparados - PIC: a média aritmética ponderada dos preços de bens, serviços ou direitos, idênticos ou similares, apurados no mercado brasileiro ou de outros países;
ii) Método do Preço de Revenda menos Lucro - PRL: a média aritmética ponderada dos preços de venda, no País, dos bens, direitos ou serviços importados, em condições de pagamento semelhantes, feitas diversas deduções, inclusive margem de lucro específica estabelecida na legislação;
iii) Custo de Produção mais Lucro - CPL: o custo médio ponderado de produção de bens, serviços ou direitos, idênticos ou similares, acrescido dos impostos e taxas cobrados na exportação no país onde tiverem sido originariamente produzidos, e de margem de lucro de 20% (vinte por cento), calculada sobre o custo apurado;iv) Método do Preço sob Cotação na Importação – PCI: definido como os valores médios diários da cotação de bens ou direitos sujeitos a preços públicos em bolsas de mercadorias e futuros internacionalmente reconhecidas (aplicável exclusivamente a commodities sujeitas à cotação em bolsas de mercadorias e futuros internacionalmente reconhecidas).

[2] E também o ICMS, no âmbito estadual.

[3] A legislação aplicável prevê os seguintes métodos sequenciais para fins de VA:
- 1º Método - Método do valor da transação;
- 2º Método - Método do valor de transação de mercadorias idênticas – o valor de transação de mercadorias idênticas vendidas para exportação para o mesmo país de importação e exportados ao mesmo tempo que as mercadorias objeto de valorarão, ou em tempo aproximado;
- 3º Método - Método do valor de transação de mercadorias similares - o valor de transação de mercadorias similares vendidas para exportação para o mesmo país de importação e exportados ao mesmo tempo que as mercadorias objeto de valoração ou em tempo aproximado;
- 4º Método - Método do valor de revenda (ou método do valor dedutivo) - o preço pelo qual as mercadorias importadas ou as mercadorias idênticas ou similares importadas são vendidas, feitas certas deduções, incluindo margem de lucro usualmente praticada;
- 5º Método - Método do custo de produção (ou método do valor computado) – o valor do custo de produção, feitas certas adições, inclusive referente ao lucro usual na transação;
- 6º Método - Método do último recurso (ou método pelo critério da razoabilidade) - valor determinado com base em critérios razoáveis e condizentes com os princípios e disposições gerais do AVA.

[4] Nesse sentido, Luis Eduardo Schoueri ("Preços de Transferência no Direito Tributário Brasileiro", Dialética, São Paulo, 2006, pg. 17 e 18) e Paulo Roberto Andrade (Revista de Direito Tributário Internacional, Ano 1, n. 1, "Valoração Aduaneira e Preços de Transferência no Brasil: Uma Avaliação Objetiva", Quartier Latin, 2006)

[5] Heleno Taveira Torres ("Direito Tributário Internacional", Revista dos Tribunais, São Paulo, 2001, Páginas 231 e 237) e Miguel Hilú Neto (Preços de Transferência, "O elo jurídico entre a valoração aduaneira e os preços de transferência", Quartier Latin, 2005).

Gustavo Brigagão é sócio do escritório Ulhôa Canto Advogados, secretário-geral da Associação Brasileira de Direito Financeiro (ABDF), diretor do Centro de Estudos das Sociedades de Advogados (Cesa), presidente da Câmara Britânica do Rio de Janeiro e professor na Fundação Getulio Vargas.

Revista Consultor Jurídico, 8 de maio de 2013

http://www.conjur.com.br/2013-mai-08/consultor-tributario-valor-aduaneiro-define-preco-transferencia

 

 

Incidência de IPI sobre importação de veículo para uso próprio é tema de repercussão geral




O Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a existência de repercussão geral do tema abordado no Recurso Extraordinário (RE) 723651, em que se discute a incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) na importação de veículo automotor por pessoa natural e para uso próprio.

Na origem, o processo refere-se a mandado de segurança impetrado contra ato da Alfândega da Receita Federal no porto de São Francisco do Sul (SC), para que se abstivesse de cobrar o tributo sobre um automóvel importado, ano 1964, adquirido pelo recorrente, como colecionador de veículos. Em primeira instância, ele obteve sentença favorável, mas posteriormente o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) decidiu pela incidência do imposto, por entender que é irrelevante a destinação final do produto. Essa decisão é agora contestada no Supremo, por meio do RE.

O caso

Ao exigir o recolhimento do tributo para desembaraço do veículo importado, a autoridade alfandegária apoiou-se nos artigos 153, inciso IV, da Constituição Federal – CF (que trata da competência da União para instituir o tributo) e 46, parágrafo único, do Código Tributário Nacional (CTN, Lei 5.172/1966), que prevê a incidência do IPI quando do desembaraço aduaneiro de produto industrializado importado.

O importador do veículo alega, entretanto, que a exigência conflita com o princípio da não cumulatividade tributária, com isso violando o disposto no artigo 153, parágrafo 3º, inciso II, da CF.

Invoca, além disso, precedentes da Segunda Turma do Supremo nos quais se concluiu pela inconstitucionalidade da incidência do IPI em casos assemelhados (recursos de agravo regimental nos REs 255090, 501773 e 255682, entre outros).

A União, por seu turno, contestou a existência de repercussão geral e a suposta afronta direta à CF. No mérito, sustenta ausência de pronunciamento do STF sobre o tema, com eficácia vinculante. Isso porque as decisões até agora emanadas da Suprema Corte foram tomadas pelas Turmas em grau de recurso. Ressalta também a necessidade de a matéria ser discutida também sob o ângulo das definições do fato gerador e do contribuinte do imposto pelo Código Tributário Nacional.

Repercussão

Ao manifestar-se no sentido de reconhecer a repercussão geral da matéria suscitada, o relator do RE, ministro Marco Aurélio, salientou que o assunto "é passível de repetir-se em inúmeros processos". Lembrou que os precedentes da Corte foram formalizados na apreciação de agravos regimentais e que, na discussão de um deles, no RE 550170, ressaltou que o tema estava a exigir um pronunciamento do Plenário do STF.

Ele observou que o artigo 46 do CTN "tem recebido interpretação linear, além do que o tema é objeto, também, da Lei 4.502/64 (dispõe sobre o Imposto de Consumo) e do Decreto-Lei 34/1966 (dispõe sobre a nova denominação do Imposto de Consumo).

O entendimento do relator foi seguido por maioria no Plenário Virtual da Corte, para que o mérito da questão seja julgado pela Corte.


Processos relacionados
RE 723651

 




terça-feira, 7 de maio de 2013

Confederação ajuíza ADI contra lei mineira que trata de benefícios fiscais de ICMS


A Confederação dos Servidores Públicos do Brasil (CSPB) ajuizou a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4940, com pedido de medida cautelar, no Supremo Tribunal Federal (STF), questionado o artigo 225, caput, e parágrafos 1º a 7º, e o artigo 225-A da Lei mineira 6.763/1975. Segundo a entidade, essa norma promove concessões unilaterais de benefícios e isenções de natureza fiscal, relativos ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

Na ADI, a confederação alega que tais dispositivos possibilitam a interpretação de que o Poder Executivo mineiro está autorizado a conceder benefícios fiscais, independentemente de deliberação do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), o que implica ofensa ao artigo 150, parágrafo 6º e artigo 155, parágrafo 2º, inciso XII, alínea "g", da Constituição Federal.

De acordo com a CSPB, a concessão de benefícios fiscais do ICMS sem a prévia deliberação dos estados e do Distrito Federal, por meio de convênio no âmbito do Confaz, viola diretamente o texto constitucional e é capaz de causar impactos na economia dos demais estados da Federação. "Os dispositivos impugnados contrariam os interesses da economia do país, estabelecendo a chamada "guerra fiscal", criando uma concorrência desigual, desfavorável para muitos Estados, sendo necessária a participação ativa de todos os cidadãos-contribuintes em uma realidade da qual fazem parte, para a reversão do quadro de concentração de rendas e de tributos no Brasil", alega.

A confederação ressalta que o Supremo já se posicionou de forma pacífica acerca da inconstitucionalidade da concessão de benefícios fiscais relativos ao ICMS, sem prévia celebração de convênio entre os estados e o Distrito Federal. Segundo a entidade, embora seja tributo da competência estadual e distrital, o ICMS recebe a conformação nacional pela Lei Complementar 24/1975 – cuja recepção pela CF/1988 foi reconhecida pelo Supremo – que estabelece a prévia celebração de convênio como condição para a concessão de benefícios fiscais.

Por esses motivos, a confederação pede a suspensão dos dispositivos da lei mineira, "sustando liminarmente qualquer interpretação que, fundada nos artigos questionados torne possível a edição de atos normativos, por parte do Estado de Minas Gerais e de seu governador, que outorguem benefícios fiscais ou financeiros, bem assim incentivos compensatórios pontuais, dos quais resulte redução ou eliminação, direta ou indireta, do respectivo ônus tributário em matéria de ICMS, sem que tais medidas sejam procedidas da necessária celebração de convênio no âmbito do Confaz".
No mérito, a autora solicita a procedência da ação direta para declarar a inconstitucionalidade do artigo 225, caput, e parágrafos 1º a 7º, e do artigo 225-A, da Lei mineira 6.763/1975. A ministra Rosa Weber é a relatora dessa ação direta.
ADI 4940


Reafirmada jurisprudência sobre ilegitimidade do MP para questionar tributos em defesa dos contribuintes

STF
 
 
Em análise do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 694294, o Supremo Tribunal Federal (STF), por meio de deliberação no Plenário Virtual, reafirmou jurisprudência no sentido de que o Ministério Público não tem legitimidade processual para requerer, por meio de ação civil pública, pretensão de natureza tributária em defesa dos contribuintes, visando questionar a constitucionalidade de tributo. A decisão da Corte ocorreu por maioria dos votos e teve repercussão geral reconhecida. 

Na origem, o Ministério Público de Minas Gerais (MP-MG), por sua promotoria de Justiça na Comarca de Santa Bárbara, propôs contra este mesmo município uma ação civil pública de responsabilidade por cobrança inconstitucional de taxa de iluminação pública. Solicitava o reconhecimento incidental da inconstitucionalidade das Leis Municipais 1.146/2001 e 998/1997, por afronta ao artigo 145, inciso II e parágrafo 2º, da Constituição Federal. 

Pedia também a suspensão imediata da cobrança, com fixação de multa em caso de descumprimento e a condenação do município para a devolução retroativa dos valores cobrados aos contribuintes. Em primeira instância, o processo foi extinto sem resolução de mérito, ao fundamento de que o autor carecia de legitimidade ativa para a causa. Contra a sentença, o MP-MG recorreu ao Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (TJ-MG), que negou provimento ao recurso. 

Entre outros fundamentos, a Corte mineira entendeu que "a relação estabelecida entre o município de Santa Bárbara e os contribuintes não é de consumo, mas, tão somente, jurídico-tributária, sem quebra da individualidade de cada um destes; que o MP não tem legitimidade para defesa de direitos individuais homogêneos identificáveis e divisíveis". Em seguida, o MP-MG interpôs recurso extraordinário, que foi inadmitido pelo TJ-MG e originou o presente agravo, para que o caso fosse apreciado pelo Supremo. 

O MP-MG aponta violação ao artigo 5º, inciso LIV; artigo 93, inciso IX; artigo 127 e artigo 129, inciso III, da Constituição Federal. Sustenta que a ação civil pública "destina-se a ser um dos mais importantes instrumentos de defesa de interesses difusos e coletivos, principalmente porque a ordem jurídica está evoluindo no sentido de buscar, por meio de ações coletivas, a solução para os conflitos de massa". "Entretanto, lamentavelmente, interpretações equivocadas têm sido utilizadas para afastar a atuação ministerial, prejudicando, assim, o interesse da coletividade", completa. 

Jurisprudência 

Segundo o relator, ministro Luiz Fux, a matéria sob exame há muito tempo vem sendo objeto de discussão no âmbito do Supremo. Por isso, conforme ele, há necessidade de pronunciamento definitivo da Corte quanto à existência de repercussão geral do tema, por entender que ultrapassa os interesses subjetivos da causa. 

O ministro salientou que a jurisprudência da Corte pacificou entendimento segundo o qual "falece ao Ministério Público legitimidade ativa ad causam para deduzir em juízo pretensão de natureza tributária em defesa dos contribuintes, visando a questionar a constitucionalidade/legalidade de tributo". Ele citou como precedentes os REs 206781, 559985, 248191, 213631 e o Agravo de Instrumento (AI) 327013. 

"Tenho, pois, que o tema constitucional versado nestes autos é relevante do ponto de vista econômico, político, social e jurídico, pois alcança uma quantidade significativa de ações em todo o país", ressaltou o relator. Ele se manifestou pela existência de repercussão geral e pela reafirmação da jurisprudência sobre o tema e foi acompanhado pela maioria dos votos. 

De acordo com o artigo 323-A do Regimento Interno do STF (atualizado com a introdução da Emenda Regimental 42/2010), o julgamento de mérito de questões com repercussão geral, nos casos de reafirmação de jurisprudência dominante da Corte, também pode ser realizado por meio eletrônico.

segunda-feira, 6 de maio de 2013

Multa de 80% sobre dívida fiscal é confisco, diz decisão

EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE


Por Livia Scocuglia

A multa moratória, para que cumpra sua função de desencorajar a elisão fiscal, não pode ser tamanha que gere um confisco. Com esse entendimento, firmado pelo Supremo Tribunal Federal, a Vara da Fazenda Pública de São Carlos (SP) acatou Exceção de Pré-Executividade e reduziu uma multa de 80% sobre valor de ICMS devido por um restaurante. 

Segundo a juíza Gabriela Müller Carioba Attanasio, autora da decisão, a multa é desproporcional por se tratar de um contribuinte que é empresa de pequeno porte. "Embora a multa tenha previsão legal e vise a dissuadir e punir, no percentual adotado, 80% do valor do tributo, conforme constou do fundamento legal da CDA, se mostra desproporcional e com efeitos confiscatórios, mormente em se considerando que se trata de empresa de pequeno porte, podendo, então, ser mitigada, pois não se coaduna com a razoabilidade à qual se deveria ater o órgão autuante", diz o despacho. 

A Fazenda paulista alegou a validade da certidão de dívida ativa, afirmando que ela contém todos os requisitos exigidos pela legislação. Além disso, afirmou que a multa não é de mora, mas sim de caráter punitivo pelo descumprimento da obrigação tributária.

A defesa da empresa foi assinada pelo tributarista Augusto Fauvel de Moraes. O advogado alegou que a multa tem efeitos confiscatórios e pode implicar o encerramento das atividades da empresa, o que terá impacto social e econômico no município de São Carlos. Para ele, a decisão é uma resposta do Judiciário ao abuso e ilegalidade do Fisco em exigir um valor quase maior do que o do próprio tributo.

Na decisão, a juíza afastou ainda a aplicação da taxa de juros estabelecida no artigo 96 da Lei 6.374/1989 — alterada pela Lei 13.918/2009 — por, segundo ela, não estar de acordo com a Constituição. "O padrão da taxa Selic, que veio a ser adotado para a recomposição dos créditos tributários da União a partir da edição da Lei 9.250/1995, não pode ser extrapolado pelo legislador estadual. A taxa Selic já se presta a impedir que o contribuinte inadimplente possa ser beneficiado com vantagens na aplicação dos valores retidos em seu poder no mercado financeiro, bem como compensar o custo do dinheiro eventualmente captado pelo ente público para cumprir suas funções."

A juíza decidiu que a multa deve ser reduzida a 50% sobre a base de cálculo representada pelo imposto e determinou a utilização da taxa Selic, afastando a aplicação taxa de juros da Lei 13.918/2009.

Clique aqui para ler a decisão.

Livia Scocuglia é repórter da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico, 5 de maio de 2013

 http://www.conjur.com.br/2013-mai-05/justica-entende-multa-80-valor-tributo-confisco

sexta-feira, 3 de maio de 2013

DIREITO ADMINISTRATIVO. APLICAÇÃO DA PENA DE PERDIMENTO A VEÍCULO OBJETO DE LEASING QUE SEJA UTILIZADO PARA A PRÁTICA DE DESCAMINHO OU CONTRABANDO.


É possível a aplicação da pena de perdimento de veículo objeto de contrato de arrendamento mercantil com cláusula de aquisição ao seu término utilizado pelo arrendatário para transporte de mercadorias objeto de descaminho ou contrabando. A propriedade do veículo submetido ao arrendamento mercantil é da instituição bancária arrendadora, de sorte que, em regra, o arrendatário tem a opção de adquirir o bem ao final do contrato. Com efeito, durante a vigência do contrato, com a tradição do bem, o arrendatário passa a ser o seu possuidor direto, portanto responsável por sua guarda e conservação, ficando a arrendadora exonerada da fiscalização por sua utilização irregular. Dessa forma, tem-se que a apreensão do veículo, bem como a aplicação da pena de perdimento, não causam prejuízos tão somente à instituição financeira, mas sim ao próprio arrendatário, na medida em que a referida sanção não interfere no contrato entre este e a arrendadora, mormente porque, segundo a regulamentação do negócio jurídico entre eles firmado, a perda do bem não exonera o arrendatário da obrigação em face da arrendadora. Além do mais, a instituição financeira arrendadora possui meios de reparar eventual prejuízo que venha a sofrer com o mau uso do bem pelo arrendatário, o qual está contratualmente vinculado à instituição financeira e deve cumprir as obrigações perante ela assumidas. Nesse contexto, admitir que o veículo objeto de leasing não possa ser alvo da pena de perdimento seria verdadeiro salvo-conduto para a prática de ilícitos fiscais com veículos sujeitos a tal regime contratual, o que poderia estimular que os referidos delitos sejam realizados por veículos objeto de leasing, pois ao arrendatário nunca seria aplicada a pena em questão. Precedente citado: REsp 1.153.767-PR, Segunda Turma, DJe 26/8/2010.REsp 1.268.210–PR, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 21/2/2013.

STF confirma possibilidade de desistência de mandado de segurança após decisão de mérito


Por maioria de votos, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quinta-feira (2) que a desistência do mandado de segurança é uma prerrogativa de quem o propõe e pode ocorrer a qualquer tempo, sem anuência da parte contrária e independentemente de já ter havido decisão de mérito, ainda que favorável ao autor da ação.

A decisão ocorreu no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 669367, com repercussão geral reconhecida, em que a empresa Pronor Petroquímica S/A questionava decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que não admitiu a desistência de um mandado de segurança movido pela empresa contra a Comissão de Valores Imobiliários (CVM).

De acordo com o entendimento da maioria dos ministros, o mandado de segurança é uma ação dada ao cidadão contra o Estado e, portanto, não gera direito a autoridade pública considerada coatora, pois seria "intrínseco na defesa da liberdade do cidadão".

Quem abriu a divergência foi a ministra Rosa Weber, ao destacar que "o mandado de segurança, enquanto ação constitucional, é uma ação que se funda no alegado direito líquido e certo frente a um ato ilegal ou abusivo de autoridade". Em seu voto, a ministra citou jurisprudência da Corte que já aplica o entendimento segundo o qual a desistência é uma opção do autor do mandado de segurança. Para ela, eventual má-fé na desistência deve ser coibida por meio de instrumento próprio, avaliando cada caso. Seu voto foi seguido pelos ministros Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes, Celso de Mello e pelo presidente em exercício, ministro Ricardo Lewandowski.

Relator

Já o relator do caso, ministro Luiz Fux, ponderou que seria "inviável" a desistência da ação quando já houver decisão de mérito, sendo possível apenas renunciar ao direito em que se funda a ação. "A parte não pode ter o domínio de, depois que o Estado se desincumbiu da prestação judicial, desistir de tudo aquilo quanto induzira o Estado", afirmou.

De acordo com o ministro Fux, essa medida seria necessária para impedir que empresas desistam de ações com o intuito de prejudicar o Poder Público. Ele citou casos em que a parte obtinha o benefício almejado para a liberação de uma mercadoria, por exemplo, e depois desistia da ação. Segundo ele, essa medida caracterizava um artifício contra o Poder Público.

O relator ainda citou o artigo 267 do Código de Processo Civil segundo o qual "a desistência, depois de decorrido o prazo da resposta, tem que ter anuência do réu, mas desde que seja antes do saneamento, porque a partir dali o processo é do Estado, que tem interesse em pacificar a ordem social e definir o litígio". Ele ainda destacou que na ação de mandado de segurança deve-se aplicar analogicamente esse dispositivo.

"O que não parece razoável é que se possa assentar a possibilidade de a parte desistir do mandado de segurança como regra geral e isso possa ser utilizado para obter benefícios contra o Poder Público", afirmou.

Seu voto foi acompanhado pelo ministro Marco Aurélio.

sexta-feira, 26 de abril de 2013

STJ suspende decisão sobre local de cobrança de ISS


Estão suspensas todas as medidas judiciais de acerto, bloqueio ou repetição de quantias pagas a título de Imposto Sobre Serviços (ISS) que estejam sendo tomadas com amparo no acórdão da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que definiu a competência para a cobrança do tributo em operações de leasing.

Em julgamento no ano passado, a Seção decidiu que cabe ao município onde fica a sede da empresa financeira realizar a cobrança do ISS sobre essas operações. 

Como o acórdão ainda não transitou em julgado, o ministro Napoleão Nunes Maia Filho, em decisão monocrática, entendeu prudente a concessão de medida liminar solicitada em embargos de declaração pelo município de Tubarão (SC), para evitar prejuízos e futuras discussões na Justiça. 

O município alega que a decisão da Primeira Seção representa perda de quantias expressivas na receita tributária de ISS sobre operações de leasing. No pedido de liminar, afirmou que a abrupta mudança na jurisprudência do STJ tem forte impacto financeiro nos cofres municipais e invocou o princípio da segurança jurídica para justificar a necessidade de suspensão dos efeitos do acórdão. 

Com a liminar, os efeitos do acórdão ficarão suspensos até o julgamento dos embargos declaratórios pela Primeira Seção. 
REsp 1060210

quarta-feira, 24 de abril de 2013

EMBARGOS PENDENTES STJ suspende decisão sobre local de cobrança de ISS


Por Livia Scocuglia

O Superior Tribunal de Justiça suspendeu acórdão que afirma que a cobrança do Imposto Sobre Serviços (ISS) sobre arrendamento mercantil deve ser feita no município da sede da empresa prestadora do serviço, e não no município da prestação. O motivo apontado pelos ministros foi "evitar prejuízos e futuras discussões, considerando a ausência de definitividade do provimento jurisdicional exarado", segundo a decisão. O acórdão, alvo de Embargos de Declaração do município, agora terá efeitos somente após o julgamento do recurso.

Em novembro do ano passado, a 1ª Seção do STJ decidiu que o ISS, no caso de leasing financeiro, deve ser cobrado no local da prestação do serviço, mas que, nesse tipo de operação, "o serviço em si, que completa a relação jurídica, é a decisão sobre a concessão, a efetiva aprovação do financiamento", o que ocorre nos "grandes centros financeiros" — ou seja, no município onde geralmente fica a sede da empresa. 

"As grandes empresas de crédito do país estão sediadas ordinariamente em grandes centros financeiros de notável dinamismo, onde centralizam os poderes decisórios e estipulam as cláusulas contratuais e operacionais para todas suas agências e dependências. Fazem a análise do crédito e elaboram o contrato, além de providenciarem a aprovação do financiamento e a consequente liberação do valor financeiro para a aquisição do objeto arrendado, núcleo da operação. Pode-se afirmar que é no local onde se toma essa decisão que se realiza, se completa, que se perfectibiliza o negócio. Após a vigência da LC 116/2003, assim, é neste local que ocorre a efetiva prestação do serviço para fins de delimitação do sujeito ativo apto a exigir ISS sobre operações de arrendamento mercantil", diz o acórdão. 

Prosseguindo, a Seção aplicou o entendimento ao arrendamento de automóveis. "O tomador do serviço, ao dirigir-se à concessionária de veículos, não vai comprar o carro, mas apenas indicar à arrendadora o bem a ser adquirido e posteriormente a ele disponibilizado. Assim, a entrega de documentos, a formalização da proposta e mesmo a entrega do bem são procedimentos acessórios, preliminares, auxiliares ou consectários do serviço cujo núcleo — fato gerador do tributo — é a decisão sobre a concessão, aprovação e liberação do financiamento."

O pedido de suspensão dessa decisão foi feito pelo município de Tubarão contra a empresa Potenza Leasing S/A Arrendamento Mercantil. Para o município, a cobrança do ISS deve ser feita no local da prestação. Em suas alegações em Embargos de Declaração, a Prefeitura afirma ter havido uma ruptura na jurisprudência firmada pelo STJ há décadas, de que o local da prestação definia o município arrecadador. Assim, o município alegou necessidade de conferir "segurança jurídica para as relações já anteriormente estabelecidas". 

Na prática, o município pediu que o novo entendimento seja considerado válido somente a partir da data da publicação do futuro acórdão nos Embargos, "mantendo o entendimento anterior consolidado pela jurisprudência da corte em relação às ações já ajuizadas ou outro marco temporal que o STJ entenda como garantidor da segurança jurídica".

Nos Embargos, o município alega ter havido "mutação abrupta da jurisprudência consolidada por mais de 20 anos sem que tenha havido mutação legislativa ou fática no que pertine o serviço de leasing." A peça afirma que a segurança jurídica é "fator de confiança aos jurisdicionados, que não podem ser prejudicados por uma lateração jurisprudencial sem que haja, no mínimo, modulação dos efeitos da decisão, a fim de não se atingir aqueles municípios que cobraram as exações com avais judiciais, em muitos casos, do próprio STJ ou do STF, como é o caso do município de Tubarão".

Para o relator do pedido, ministro Napoleão Nunes Maia Filho, a suspensão é necessária para evitar prejuízos e futuras discussões, "considerando a ausência de definitividade do provimento jurisdicional exarado", e concedeu a medida liminar para suspender qualquer medida judicial em relação às quantias pagas a título de ISS até o julgamento dos Embargos Declaratórios. O julgador fundamentou sua decisão com o artigo 798 do Código de Processo Civil, que autoriza o juiz a "determinar as medidas provisórias que julgar adequadas, quando houver fundado receio de que uma parte, antes do julgamento da lide, cause ao direito da outra lesão grave e de difícil reparação".

Pagamento ISS
A discussão sobre o local de pagamento do ISS é uma das questões tributárias de mais difícil estabilização. Em coluna publicada na ConJur, o tributarista Igor Mauler Santiago lembra que a discussão começou com o Decreto-lei 406/68, que atribuía o poder tributário de forma praticamente exclusiva ao município de estabelecimento do prestador, excetuando apenas os casos de construção civil e de exploração de rodovias pelo pedágio. Depois, a Emenda Constitucional 37/2002 autorizou a lei complementar a fixar alíquota mínima para o ISS e a definiu em 2%. Nessa época, o STJ firmou posição pela competência invariável do município onde o serviço é prestado, qualquer que fosse sua natureza. A regra foi reiterada pelo artigo 3º da Lei Complementar 116/2003.

A Lei Complementar 116 define que o ISS é devido do local do estabelecimento prestador do serviço e não no município onde o serviço é efetivamente prestado. No caso de arrendamento mercantil de automóvel, por exemplo — um dos que mais causa disputa entre as prefeituras —, o estabelecimento prestador do serviço de leasing financeiro é o da empresa de leasing, e não o da concessionária.

Também em coluna publicada na ConJur, o tributarista e professor da USP Heleno Taveira Torres afirma que a possível mudança de jurisprudência do STJ sobre o local do fato jurídico tributário do ISS no caso do arrendamento mercantil "equivale não apenas a uma afetação aos direitos do contribuinte, mas principalmente a uma mudança do sujeito ativo das obrigações principais do ISS."

Ainda de acordo com Torres, "seria extremamente danoso ao federalismo, com amplo favorecimento à guerra fiscal, caso essa fácil manipulação do local do estabelecimento, como o de arrendamento mercantil de bens móveis, pudesse ter sua cobrança vinculada unicamente ao local do estabelecimento da administração dos contratos, em prejuízo do critério do local da prestação, como sempre foi admitido pelo STJ, ao longo de toda a aplicação do artigo 12 do Decreto-lei 406/68, e da LC 116/2003."

Clique aqui para ler o acórdão da 1ª Seção.
Clique aqui para ler a decisão pela suspensão dos efeitos do acórdão. 

Recurso Especial 1.060.210

Livia Scocuglia é repórter da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico, 24 de abril de 2013


 http://www.conjur.com.br/2013-abr-24/stj-suspende-decisao-local-cobranca-iss-leasing

 

Governo reduz alíquota de tributos da indústria química




Fernanda Bompan

SÃO PAULO - O ministro da Fazenda, Guido Mantega, fez o anúncio de mais medidas ontem. Uma delas foi a redução das alíquotas de PIS e Cofins da indústria química, como proposta para elevar o crescimento do setor, que é a sexta maior do mundo, e que representa 2,5% do Produto Interno Bruto (PIB) segundo a Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim) - patamar registrado em 2009, 2010 e 2011.
Segundo o ministro, a alíquota será diminuída de 5,6% para 1% na compra de matérias-primas (Nafta, HLR, Etano, Propano, Butano) para as chamadas primeira (Eteno, Propeno, Buteno, Butadieno, Ortoxileno, Benzeno, Tolueno, Isopropeno e Paraxileno) e segundas gerações (Resinas, termoplásticas, Polietilento, Polipropileno, PVC, Poliésteres, Oxido de eteno, entre outros).
O setor ainda continuará com o direito de receber um crédito tributário de 9,25%, conforme era o pleito de entidades manifestadas no inicio deste mês. Com isso, disse Mantega, o ganho real sobe de 3,65% (diferença entre 5,6% de impostos e 9,25% de crédito) para 8,25% no caso da primeira geração. Na segunda geração, essa etapa passa a ter um ganho neste ano, enquanto que em 2012 não existia esse crédito. "Estamos reduzindo o tributo dos principais elos da cadeia produtiva do setor químico para viabilizar mais competição com os produtos fabricados nos Estados Unidos", afirmou o ministro.
Ele afirmou que a redução de tributo irá vigorar até 2018, quando a alíquota de PIS e Cofins voltará ao patamar atual. Os tributos ficarão em 1% em 2013, 2014 e 2015. A partir de 2016, a alíquota volta a subir até atingir o patamar atual em 2018. Desta forma, os ganhos para o setor (nas duas gerações) serão de 6,25%, recuando para 4,25% em 2017 e chegando a 3,65%, no ano seguinte.
Segundo o Ministério da Fazenda, a renúncia fiscal prevista é de R$ 670 milhões por ano. Em 2013, o custo esperado dessa medida para o governo é de R$ 1,1 bilhão. "Será um período que a indústria terá um custo menor para alcançar o custo das concorrentes", disse Mantega.
Ao comentar o anúncio, a diretora de economia e estatística da Abiquim, Fátima Ferreira, disse que a desoneração da produção é importante para a indústria como um todo e, assim, para a economia. "Estamos com 80% da capacidade instalada, com ociosidade elevada e riscos elevados", afirmou. Para ela, a medida veio em "excelente hora", pois dá "certo alívio" ao setor.
O consultor da Methode, Adriano Gomes, que atua no setor, afirmou que a repercussão foi positiva. "Ainda não há previsão de crescimento com a medida, mas conversei com dois clientes que mostraram estar animados. Era um pleito bastante antigo."
Segundo ele, não só as empresas da primeira e segunda geração devem ser beneficiadas. "Essas companhias poderão reduzir os custos de vendas para as próximas etapas da cadeia. Uma empresa que vende sacola, por exemplo, vai poder aumentar sua margem de lucro e, isso, vai permitir que ela invista mais, contribuindo para o crescimento da indústria em geral e do PIB neste ano", prevê o especialista.
Além disso, Gomes comenta outra vantagem da medida de ontem é que as importações para abastecer a indústria química com insumos não fabricados no País ou que produzem "nem a metade" do que o setor precisa também poderão ser vendidas com alíquota de 1%. "Ou seja, beneficia o mercado nacional e internacional", conclui.

Importância 
Para se ter uma ideia da importância da área, é o quarto maior setor industrial brasileiro e, sozinha, a indústria química representa 6% das exportações brasileiras e 19% das importações nacionais totais. Ainda segundo a Abiquim, o faturamento líquido estimado do segmento no ano passado foi de R$ 293 bilhões, alta de 12,4%.
Porém, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a indústria de transformação, da qual o químico faz parte, recuou 2,5% em 2012. Essa queda contribui para a retração de 0,8% do setor industrial em geral no ano passado, o que ajudou no fraco crescimento de 0,9% do PIB.
 

 
Fonte: DCI – SP

Disputa Tributária. Taxa dos EUA ajuda a compreender guerra fiscal brasileira



Por André Luiz dos Santos Pereira e Gustavo Perez Tavares

No dia 28 de março de 2013, a Court of Appeals do Estado de Nova Iorque (semelhante aos Tribunais de Justiça estaduais brasileiros) julgou o que pode ser o leading case sobre o critério espacial (e, consequentemente, a possibilidade de cobrança) da Sales Tax americana (equivalente do nosso ICMS) para vendas pela internet, quando a loja onlinnão se encontrar fisicamente no estado de destino das mercadorias.

A busca de alguns estados americanos de diminuir os seus "prejuízos" nas vendas online se assemelha à questão brasileira inaugurada com o famigerado Protocolo ICMS 21[1] – subscrito pelos estados do Acre, Alagoas, Amapá, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Roraima, Rondônia e Sergipe, além do Distrito Federal, o qual exige o recolhimento de ICMS aos estados de destino das mercadorias, nas vendas não presenciais – e, atualmente, se encontra amplamente contestado perante o Supremo Tribunal Federal, por meio de diversas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (entre elas, a ADI 4713, ajuizada pela Confederação Nacional da Indústria).

Com efeito, algumas das questões suscitadas no âmbito da Court of Appeals do Estado de Nova Iorque a respeito da Sales Tax americana para vendas pela internet guarda fortes aproximações com as que se estão a travar no âmbito de outras Ações Diretas de Inconstitucionalidade em trâmite no STF, em que se questionam as normas instituídas pelos entes federados para a cobrança do ICMS nas operações interestaduais por meios não presenciais[2].

Por meio da chamada Commerce Clause[3], a Constituição americana prevê que, para que um estado possa exigir a sales tax em uma venda de mercadorias, é necessário que essa venda tenha um nexo causal e substancial direto com o referido estado. Esse chamado nexo substancial era configurado pela jurisprudência, até recentemente, pela presença física do vendedor no território do estado.

O precedente até então aplicado a essas situações foi julgado pela Supreme Court (equivalente americano ao Supremo Tribunal Federal brasileiro) em 1967, no caso National Bellas Hess, Inc. v. Department of Revenue of Illinois ("Bellas Hess") envolvendo a venda de mercadorias via catálogo enviado pelos correios, em que se decidiu pela impossibilidade da cobrança pelos estados de destino, pois a única relação entre comprador e vendedor seria via correios. Esse posicionamento foi reafirmado em 1992, no caso Quill Corp. v. North Dakota, tendo a Supreme Court consignado que a presença física do vendedor seria um critério razoável de limitação para a tributação pelos estados.

No caso Amazon.com, LLC, et al. v. New York State Department of Taxation and Finance, et al.", julgado no final de março de 2013, a gigante americana de vendas online busca a declaração de inconstitucionalidade (tanto abstrata quanto incidental) da legislação tributária do estado de Nova Iorque que exige o recolhimento da sales tax nas vendas decorrentes (originárias) de espaços publicitários em sites locais (a chamada Internet tax). Na prática, o dono de um site novaiorquino (um jornal local, por exemplo) disponibiliza um anúncio da Amazon em seu site e recebe uma porcentagem (comissão) pelas vendas finalizadas no site da loja, que tiveram início no seu banner ou link.

O objetivo do Estado de NY é, como se observa, dar uma nova interpretação para a Commerce Clause (a qual, vale relembrar, encontra previsão na própria Carta Constitucional americana) diante da realidade atual de vendas pela internet, visando a diminuir uma suposta defasagem na arrecadação com a diminuição, ano a ano, das vendas em lojas físicas em detrimento das vendasonline.

Objetivo parecido é o dos estados subscritores do referido Protocolo ICMS 21, que se sentem prejudicados com o recolhimento integral do imposto para o estado de origem física das mercadorias em vendas não presenciais e, em razão disso, buscam uma forma de aumentarem sua arrecadação em uma época em que cresce consideravelmente no Brasil o volume de vendas por esses meios.

Voltando ao caso americano, a Court of Appeals do Estado de Nova Iorque julgou, por maioria, constitucional a exigência da sales tax, apesar de ter se reportado ao caso "Bellas Hess", afirmando que o fato de a Amazon buscar sites essencialmente voltados para a população do estado configuraria o nexo substancial necessário para a configuração da Commerce Clause e, portanto, constituiria uma presunção válida da atuação da empresa no estado, preenchendo, assim, os requisitos autorizadores para a cobrança do tributo estadual.

Apesar de afirmar que apenas a Suprema Corte seria competente para rever seu entendimento quanto ao critério da presença física como requisito para configurar a Commerce Clause, a Corte de Apelações novaiorquina mostra seu entendimento no sentido de que o comércio virtual se desenvolveu substancialmente nas últimas décadas e merece flexibilização dos conceitos fixados anteriormente[4].

Em voto de divergência, o juiz Smith entendeu que o objetivo dos donos dos sites novaiorquinos não seria o de promover as vendas da Amazon, como faria um representante comercial, mas apenas de financiar o seu site, nos moldes do que os donos de jornais impressos fazem quando vendem anúncios ou classificados para as empresas. Apesar de a forma de pagamento pelo anúncio ser mais próxima àquela de uma comissão de venda, para o juiz Smith, "um link ainda é apenas um anúncio"[5], não podendo ser presumido pela legislação como representação comercial.

Apesar de a situação julgada nos Estados Unidos ser peculiar à própria legislação americana e, ademais, ainda precisar ser abordada em nível federal (se assim entender a Suprema Corte), o caso da Amazon mostra que a situação brasileira com o Protocolo ICMS 21 não é isolada, mas, aparentemente, uma tendência, e que os países terão que abordar mais cedo ou mais tarde para adaptar a legislação criada em uma época em que o comércio online praticamente não existia.

Prova disso é o fato de que o fundamento (ainda que velado) utilizado pela corte novaiorquina para declarar constitucional a Internet tax é praticamente idêntico ao fundamento apresentado pelos estados brasileiros para a subscrição do Protocolo ICMS 21. Confira-se:

"considerando que a sistemática atual do comércio mundial permite a aquisição de mercadorias e bens de forma remota;

considerando que o aumento dessa modalidade de comércio, de forma não presencial, especialmente as compras por meio da internet, telemarketing e showroom, deslocou as operações comerciais com consumidor final, não contribuintes de ICMS, para vertente diferente daquela que ocorria predominante quando da promulgação da Constituição Federal de 1988;

considerando que o imposto incidente sobre as operações de que trata este protocolo é imposto sobre o consumo, cuja repartição tributária deve observar esta natureza do ICMS, que a Carta Magna na sua essência assegurou às unidades federadas onde ocorre o consumo da mercadoria ou bem;

considerando a substancial e crescente mudança do comércio convencional para essa modalidade de comércio, persistindo, todavia, a tributação apenas na origem, o que não coaduna com a essência do principal imposto estadual, não preservando a repartição do produto da arrecadação dessa operação entre as unidades federadas de origem e de destino, resolve celebrar o seguinte" (grifamos)

A flexibilização conceitual promovida pela Court of Appeals novaiorquina quanto ao critério da presença física (physical presence), admitindo a "projeção virtual" (virtual projection via the Internet) para fins de aplicação da Commerce Clause não difere, substancialmente, da pretensão das unidades federadas signatárias do Protocolo ICMS 21 de redefinir alguns conceitos da legislação brasileira sobre o imposto estadual.

Em especial, o conceito de estabelecimento adotado pela Lei Complementar 87/96, cujos elementos definidores seriam suficientemente amplos para albergar uma possível "releitura" à luz dos influxos trazidos pelo comércio virtual[6].

Por ocasião do referendo da medida cautelar concedida na Ação Direta de Inconstitucionalidade 4565, o Relato, ministro Joaquim Barbosa, citando a decisão proferida no caso Quill Corp. v. North Dakota a respeito das vendas por correios mediante catálogos postais, consignou que as facilidades do comércio eletrônico não teriam o condão de "deslocar fisicamente" os estabelecimentos remetentes para a porta do consumidor[7].

Posteriormente, no julgamento do referendo da medida cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade 4705, o ministro Gilmar Mendes, embora acompanhando o relator, chegou a mencionar a possibilidade de avaliar uma mutação constitucional a partir da modificação do contexto das operações comerciais a partir da Internet. Na prática, pode-se dizer que se formulou questionamento muito semelhante àquele que inspirou a decisão recentemente proferida no caso Amazon.

Entretanto, é necessário ponderar que a complexidade e o nível de detalhamento da legislação do ICMS representa um sério entrave à adoção da solução da Court of Appeals novaiorquina. A ficção jurídica de uma operação local no domicílio do consumidor final não poderia ser criada sem que, necessariamente, fossem alteradas as competências tributárias.

Cabe lembrar que, de acordo com o art. 155, §2º, II, b, da Constituição Federal, o ICMS incidente sobre as operações interestaduais destinadas a consumidor final cabe à unidade da Federação em que domiciliado o remetente. Apenas quando o destinatário for consumidor do imposto é que a unidade da Federação do adquirente da mercadoria fará jus ao imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual (art. 155, §2º, VIII, da Constituição Federal).

Esse quadro constitui, a nosso ver, um sério obstáculo à adoção desta ficção, uma vez que implicaria afastar a competência tributária da unidade da Federação do remetente, permitindo, na prática, uma nova hipótese de "diferencial de alíquotas" não prevista constitucionalmente e poderia, até mesmo, violar a própria não-cumulatividade do imposto ante a cobrança em duplicidade do tributo por duas unidades da Federação.

Resta clara, portanto, uma tendência dos países em rever suas legislações tributárias no sentido de melhor repartir as receitas advindas do comércio online e, se a recente decisão da Court of Appeals novaiorquina pode ser tomada como um indicativo, mesmo com suas peculiaridades, podemos estar na eminência de uma mudança de entendimento.

No caso brasileiro, caberá ao STF decidir a questão. Apesar de a forma usada pelos subscritores do Protocolo ICMS 21 não ser a mais difícil de ser derrubada judicialmente, certamente surgirão outras tentativas dos estados em buscar sua parcela desse mercado que só tende a crescer, visando à satisfação da sede arrecadatória que, como sabemos, é inesgotável. As propostas vão sugerir que a solução mais acertada venha a ser a modificação do texto constitucional no que concerne à competência para arrecadar o ICMS incidente em tais operações, e não a "criação" de uma nova incidência tributária.


[1] Apenas para lembrar, nas operações interestaduais de mercadorias com destino ao consumidor final, o ICMS é integralmente devido ao estado de origem das mercadorias. O Protocolo ICMS 21, por usa vez, exige adicionalmente um percentual de ICMS ao estado de destino dos bens, em verdadeira inovação e criação de tributo sem lei, em nosso sentir.

[2] Nesse sentido, nos reportamos aos julgamentos dos referendos das medidas cautelares concedidas nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade 4.565 e 4.705.

[3] United States Constitution (Article I, Section 8, Clause 3): The Congress shall have power (…)To regulate Commerce with foreign Nations, and among the several States, and with the Indian Tribes;

[4] "The world has changed dramatically in the last two decades, and it may be that the physical presence test is outdated. An entity may now have a profound impact upon a foreign jurisdiction solely through its virtual projection via the Internet. That question, however, would be for the United States Supreme Court to consider."

[5] "It was no doubt true before the internet existed that advertising was usually sold for a flat fee, while sales agents usually worked on commission, but that has changed. When an advertisement takes the form of a link on a website, it is easy, as well as efficient, for the advertiser to compensate the website on the basis of results. But the link is still only an ad"

[6] Art. 11, §3º: § 3º: "Para efeito desta Lei Complementar, estabelecimento é o local, privado ou público, edificado ou não, próprio ou de terceiro, onde pessoas físicas ou jurídicas exerçam suas atividades em caráter temporário ou permanente, bem como onde se encontrem armazenadas mercadorias (...)".

[7] "A facilidade de comunicação criada pela internet evidentemente é incapaz de deslocar fisicamente estabelecimentos comerciais ou industriais à porta dos consumidores, assim como as antigas vendas por correio a partir de catálogos postados ou vendidos em bancas de jornal também não criavam entreposto comercial no território de cada estado ou município consumidor."

André Luiz dos Santos Pereira é advogado da área de contencioso do escritório Machado Associados

Gustavo Perez Tavares é advogado da área de Contencioso do escritório Machado Associados.

Revista Consultor Jurídico, 22 de abril de 2013