Não obstante o poder regulamentar em nosso sistema jurídico servir apenas para (i) o fiel cumprimento das leis e (ii) atender ao princípio da igualdade – (art. 84, inciso IV, CRFB/88), não raro, em matéria tributária e aduaneira, verificamos absoluto descumprimento dessa regra jurídica.
Como bem parodiava o mestre de todos nós, Prof. Geraldo Ataliba, em matéria tributária e aduaneira não vige apenas o princípio da legalidade, mas, sim, o da estrita legalidade.
Essa percepção é de fácil compreensão, pois todos os elementos da regra de tributação (material, temporal, espacial, passivo e quantitativo) devem vir expressamente previstos em Lei (formal e material).
Simples leitura do Texto Constitucional reforça essa assertiva:
"Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça; (g.n.)"
"Art. 146. Cabe à lei complementar:
I - dispor sobre conflitos de competência, em matéria tributária, entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;
II - regular as limitações constitucionais ao poder de tributar;
III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:
a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes;
b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários; (g.n.)."
Como em matéria aduaneira adotamos três principais relações jurídicas: (i) relação jurídica de cunho formal (fazer ou deixar de fazer algo em virtude do interesse da fiscalização e arrecadação); (ii) relação jurídica de dar (pagar tributos); e (iii) relação jurídica sancionadora (aplicação de penalidades decorrentes de infrações).
A previsão de penalidade (multas) em matéria aduaneira deve vir disciplinada em lei (formal e material), ainda que se defenda um regramento próprio ao Direito Aduaneiro, não sujeito a regras específicas de Direito Tributário, em pretexto da soberania nacional (art. 327, da CRFB/88).
Nesse sentido, o Dec. Federal nº 7.213/2.010 alterou o art. 703, §§ 1º e 2º, do Regulamento Aduaneiro (nº 6.759/09), prevendo aplicação de multas em descompasso àquelas previstas pela legislação de regência (DL 37/66, e MP 2.158-35/01).
Assim, entendemos, a nosso sentir, ser incabível ao Decreto previsão dissonante daquela conferida pela lei específica (DLs 37/66 e 1.455/76), especialmente ao criar penalidade vinculada a base de cálculo dos tributos aduaneiros.
Acreditamos que as autuações que vierem a se concretizar, haverão de ser julgadas improcedentes.
Segue legislação para compreensão:
Art. 703. Nas hipóteses em que o preço declarado for diferente do arbitrado na forma do art. 86 ou do efetivamente praticado, aplica-se a multa de cem por cento sobre a diferença, sem prejuízo da exigência dos tributos, da multa de ofício referida no art. 725 e dos acréscimos legais cabíveis (Medida Provisória no 2.158-35, de 2001, art. 88, parágrafo único). (Redação dada pelo Decreto nº 7.213, de 2010).
§ 1o A multa de cem por cento referida no caput aplica-se inclusive na hipótese de ausência de apresentação da fatura comercial, sem prejuízo da aplicação de outras penalidades cabíveis (Lei no 10.833, de 2003, art. 70, inciso II, alínea "b", item 2, e § 6o). (Redação dada pelo Decreto nº 7.213, de 2010). § 2o O disposto neste artigo não prejudica a aplicação da penalidade referida no inciso VI do art. 689, na hipótese de ser encontrada, em momento posterior à aplicação da multa, a correspondente fatura comercial falsificada ou adulterada. (Redação dada pelo Decreto nº 7.213, de 2010). *Felipe Breda é Advogado, consultor e professor, especialista em Direito Tributário e Aduaneiro, professor do Curso de Pós-Graduação (Lato Sensu) da PUC/SP, gerente jurídico da área Aduaneira do Emerenciano, Baggio & Advogados – Associados. Email: Felippe.Breda@emerenciano.com.br |
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