segunda-feira, 16 de abril de 2012

AUTUAÇÃO COM BASE EM DEMONSTRATIVOS DE MOVIMENTAÇÃO BANCÁRIA. POSSIBILIDADE.

PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. LANÇAMENTO POR ARBITRAMENTO. AUTUAÇÃO COM BASE EM DEMONSTRATIVOS DE MOVIMENTAÇÃO BANCÁRIA. POSSIBILIDADE. LEI 8.021/90 E LEI COMPLEMENTAR 105/2001. APLICAÇÃO IMEDIATA. EXCEÇÃO AO PRINCÍPIO DA IRRETROATIVIDADE. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 182/TFR. VIOLAÇÃO DO ART. 535, I e II, DO CPC. INOCORRÊNCIA.

 

1. O Codex Tributário, ao tratar da constituição do crédito tributário pelo lançamento, determina que as leis tributárias procedimentais ou formais têm aplicação imediata (artigo 144, § 1º, do CTN), pelo que a Lei 8.021/90 e a Lei Complementar 105/2001, por envergarem essa natureza, atingem fatos pretéritos. Assim, por força dessa disposição, é possível que a administração, sem autorização judicial, quebre o sigilo bancário de contribuinte durante período anterior a vigência dos aludidos dispositivos legais. Precedentes da Corte: AgRg nos EDcl no REsp 824.771/SC, DJ 30.11.2006; REsp 810.428/RS, DJ 18.09.2006; EREsp 608.053/RS, DJ 04.09.2006; e AgRg no Ag 693.675/PR, DJ 01.08.2006).

2. A Lei 8.021, de 12 de abril de 1990, que dispõe sobre a identificação dos contribuintes para fins fiscais, em seus artigos 6º, 7º e 8º, preceitua que: (i) "O lançamento de ofício, além dos casos já especificados em lei, far-se-á arbitrando-se os rendimentos com base na renda presumida, mediante utilização dos sinais exteriores de riqueza"; (ii) "Considera-se sinal exterior de riqueza a realização de gastos incompatíveis com a renda disponível do contribuinte.": (iii) "O arbitramento poderá ainda ser efetuado com base em depósitos ou aplicações realizadas junto a instituições

financeiras, quando o contribuinte não comprovar a origem dos recursos utilizados nessas operações. (Revogado pela lei nº 9.430, de 1996)"; (iv) "A autoridade fiscal do Ministério da Economia, Fazenda e Planejamento poderá proceder a exames de documentos, livros e registros das Bolsas de Valores, de mercadorias, de futuros e assemelhadas, bem como solicitar a prestação de esclarecimentos e informações a respeito de operações por elas praticadas, inclusive em relação a terceiros"; e (v) "Iniciado o procedimento fiscal, a autoridade fiscal poderá solicitar informações sobre operações realizadas pelo contribuinte em instituições financeiras, inclusive extratos de contas bancárias, não se aplicando, nesta hipótese, o disposto no art. 38 da Lei n° 4.595, de 31 de dezembro de 1964.".

3. Ademais, em 10 de janeiro de 2001, sobreveio a Lei Complementar 105, que revogou o artigo 38, da Lei 4.595/64, que condicionava a quebra do sigilo bancário à obtenção de autorização judicial.

4. A LC 105/2002 dispõe sobre o sigilo das operações de instituições financeiras, determinando que não constitui violação do dever de sigilo, entre outros, o fornecimento à Secretaria da Receita Federal de informações necessárias à identificação dos contribuintes e os valores globais das respectivas operações - artigo 11, § 2º, da Lei 9.311/96, que instituiu a CPMF -, e a prestação de informações nos termos e condições estabelecidos nos artigos 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 7º, e 9º, da lei complementar em tela (artigo 1º, § 3º, III e VI).

5. Em seu artigo 6º, o referido diploma legal, estabelece que: "As autoridades e os agentes fiscais tributários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios somente poderão examinar documentos, livros e registros de instituições financeiras, inclusive os referentes a contas de depósitos e aplicações financeiras, quando houver processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso e tais exames sejam considerados indispensáveis pela autoridade administrativa competente. Parágrafo único. O resultado dos exames, as informações e os documentos a que se refere este artigo serão conservados em sigilo, observada a legislação tributária.".

6. Nesse segmento, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça está assentada no sentido de que: "a exegese do art. 144, § 1º do Código Tributário Nacional, considerada a natureza formal da norma que permite o cruzamento de dados referentes à arrecadação da CPMF para fins de constituição de crédito relativo a outros tributos, conduz à conclusão da possibilidade da aplicação dos artigos 6º da Lei Complementar 105/2001 e 1º da Lei 10.174/2001 ao ato de lançamento de tributos cujo fato gerador se verificou em exercício anterior à vigência dos citados diplomas legais, desde que a constituição do crédito em si não esteja alcançada pela decadência" e que "inexiste direito adquirido de obstar a fiscalização de negócios tributários, máxime porque, enquanto não extinto o crédito tributário a Autoridade Fiscal tem o dever vinculativo do lançamento em correspondência ao direito de tributar da entidade estatal." (REsp 685.708/ES, Primeira Turma, Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 20.06.2005).

7. Tese inversa levaria a criar situações em que a administração tributária, mesmo tendo ciência de possível sonegação fiscal, ficaria impedida de apurá-la.

8. Deveras, ressoa inadmissível que o ordenamento jurídico crie proteção de tal nível a quem, possivelmente, cometeu infração.

9. Isto porque o sigilo bancário não tem conteúdo absoluto, devendo ceder ao princípio da moralidade pública e privada, este sim, com força de natureza absoluta. A regra do sigilo bancário deve ceder todas as vezes que as transações bancárias são denotadoras de ilicitude, porquanto não pode o cidadão, sob o alegado manto de garantias fundamentais, cometer ilícitos. O sigilo bancário é garantido pela Constituição Federal como direito fundamental para guardar a intimidade das pessoas desde que não sirva para encobrir ilícitos.

10. A violação do art. 535, I e II, CPC, não efetivou-se na hipótese sub examine. Isto porque, o Tribunal de origem pronunciou-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta nos embargos de declaração, estando o decisum hostilizado devidamente fundamentado. Saliente-se, ademais, que o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão, como de fato ocorreu no voto condutor do acórdão de apelação às fls. 119/130, além de a pretensão veiculada pela embargante, consoante reconhecido pelo Tribunal local, revelar nítida pretensão de rejulgamento da causa (fls. 142/145).

11. Recurso especial provido.

(REsp 943304 / SP, Ministro LUIZ FUX, Órgão Julgador, PRIMEIRA TURMA

Data do Julgamento 06/05/2008, Data da Publicação/Fonte DJe 18/06/2008)

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