O lápis grafite importado da China paga desde 1997 uma pesada sobretaxa antidumping definitiva, de 202,3%. Nos últimos anos, porém, a importação desse produto com origem em Taiwan passou a incomodar os fabricantes nacionais. No ano passado, os taiwaneses foram o segundo maior fornecedor internacional do lápis.
O Brasil importou US$ 3,39 milhões de lápis de Taiwan, quase metade dos US$ 7,62 milhões comprados dos chineses. Em 2010, os taiwaneses chegaram a ultrapassar o fornecimento chinês. De janeiro a junho deste ano, porém, a importação brasileira de lápis de Taiwan foi zerada. Os dados são do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (Mdic).
A drástica mudança no fornecimento de lápis ao Brasil aconteceu devido aos chamados processos de investigação de origem não preferencial. O instrumento, aplicado a partir do segundo semestre de 2010 pelo ministério, começou a fazer mais efeitos agora. Essa investigação, feita após pedido de uma indústria nacional, verifica se a mercadoria vendida por determinada empresa estrangeira provém efetivamente do país declarado.
Os fabricantes nacionais pedem a aplicação do mecanismo quando suspeitam que a mercadoria vem, na verdade, do país submetido à sobretaxa antidumping. Caso o fornecedor estrangeiro não comprove a origem, a declaração é considerada fraude. Com isso, não é liberada a licença de importação para o produto.
O primeiro resultado de investigação de origem saiu em agosto do ano passado. De lá para cá, foram dez investigações finalizadas, e em nove delas não foi comprovada a origem declarada nos documentos de importação. Há, atualmente, oito casos em andamento.
Entre as dez investigações já realizadas sobre origem, nove foram contra fornecedores de Taiwan, sendo quatro processos relativos a lápis de grafite, dois para imãs de ferrite, dois para escovas de cabelo e um para magnésio metálico. Houve mais um processo de magnésio metálico, mas contra fornecedor do Japão.
De forma semelhante ao que aconteceu no lápis grafite, o fornecimento de imãs de ferrite com origem em Taiwan foi zerado com o fim dos processos. Taiwan foi o quarto maior fornecedor dos imãs em 2010. A investigação de fornecimento de magnésio metálico contra um fornecedor taiwanês e um japonês também teve efeito de zerar o fornecimento do produto tanto por Taiwan quanto pelo Japão. No ano passado, Japão e Taiwan apareceram em terceiro e quarto lugar, respectivamente, no ranking dos maiores fornecedor do magnésio.
Em escovas de cabelo foi diferente. Dos dois casos investigados, em um foi comprovada a origem taiwanesa e Taiwan ainda continua o maior fornecedor do produto para o Brasil.
Welber Barral, sócio da Barral M Jorge Consultores, que acompanhou o processo de investigação do magnésio metálico do Japão, diz que em alguns casos há uma suspeita maior de falsa declaração de origem. "Não se tem conhecimento da existência de matéria-prima para o magnésio metálico, por exemplo, no Japão", diz ele. "No início, a empresa alegou que obtinha o magnésio metálico de sucata. Houve a investigação, mas verificou-se que a parte proveniente de sucata era pouco representativa em relação ao total vendido ao Brasil e a agregação de valor local era mínima."
Barral explica que é preciso nacionalização mínima de 60% na regra geral ou salto tarifário para ser comprovada a origem. Ou seja, é preciso que a mercadoria seja transformada o suficiente para mudar de classificação na lista tarifária. Barral lembra que o simples fato de um país passar a fornecer depois que uma sobretaxa antidumping passa a ser aplicada para a China, por exemplo, não significa que há falsa declaração de origem. "A sobretaxa naturalmente dá oportunidade para fornecedores de outros países. A questão é saber se o produto realmente provém do local declarado."
A investigação de origem surgiu praticamente junto com o processo de circunvenção, que analisa se uma mercadoria passa por triangulação para driblar a sobretaxa antidumping. A circunvenção, porém, é menos usada. Até agora, houve dois casos finalizados e não há nenhum em andamento.
Carol Monteiro de Carvalho, sócia da área de comércio exterior do Bichara, Barata e Costa Advogados, explica que os dois processos são aplicados de forma diferente. A circunvenção e a falsa declaração de origem podem existir juntas, ou não. De qualquer forma, diz, o processo de circunvenção é muito mais complexo, porque requer comprovar que um determinado bem faz um percurso específico e passa por triangulação antes de chegar ao Brasil. Na investigação de origem, basta verificar se o produto obedece aos critérios de nacionalização definidos pelo Brasil.
Além disso, diz Carol, o efeito prático dos dois processos é bem diverso. Caso seja comprovada a triangulação, o produto fica sujeito à sobretaxa antidumping. Na investigação de origem, caso seja confirmada a falsa declaração, é simplesmente barrada a importação do fornecedor examinado. A diferença de efeitos acontece porque a falsa declaração de origem é uma fraude, enquanto a circunvenção é considerada apenas uma prática desleal de concorrência.
Todos os casos de investigação de origem encerrados até agora trataram de produtos que, na origem China, pagam sobretaxa por processos antidumping relativamente antigos. Para Barral, isso não surpreende. "São casos de comércio estruturado, em que os fornecedores internacionais já sabem que o produto está sujeito a sobretaxa e alguns exportadores tentam encontrar alguma solução, legal ou não, para a punição antidumping não pesar muito."
Marta Watanabe
Valor Econômico
11/07/2012
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