O protesto das Certidões de Dívida Ativa (CDA) constitui mecanismo constitucional e legítimo, por não restringir de forma desproporcional quaisquer direitos fundamentais garantidos aos contribuintes e, assim, não constituir sanção política.
Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, julgou improcedente o pedido formulado em ação direta ajuizada contra o parágrafo único do art. 1º da Lei 9.492/1997, incluído pela Lei 12.767/2012 ("Parágrafo único. Incluem-se entre os títulos sujeitos a protesto as Certidões de Dívida Ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e das respectivas autarquias e fundações públicas").
O Tribunal afastou a alegação de inconstitucionalidade formal do dispositivo atacado. A requerente aduzia ter havido afronta ao devido processo legislativo e à separação de poderes, em virtude de ter sido inserido por emenda na Medida Provisória 577/2012, que versava sobre questões totalmente diversas, relativas ao serviço público de energia elétrica.
Observou que o Supremo Tribunal Federal, ao julgar a ADI 5.127 (DJE de 27.9.2016), entendeu que a prática de introduzir emendas sobre matérias estranhas às medidas provisórias, consolidada no Congresso Nacional, constitui costume contrário à Constituição.
Entretanto, diante dos consideráveis efeitos adversos que adviriam da declaração de inconstitucionalidade de todas as medidas provisórias já aprovadas, ou ainda em tramitação, com vício semelhante, e do fato de estar-se a afirmar um novo entendimento sobre a matéria, a Corte atribuiu eficácia "ex nunc" à decisão. Ficaram, assim, preservadas, até a data daquele julgamento, todas as leis oriundas de projetos de conversão de medidas provisórias com semelhante vício, já aprovadas ou em tramitação no Congresso Nacional, incluindo o dispositivo impugnado na presente ação direta.
No que se refere às impugnações materiais, a tese central defendida é a de que o protesto da Certidão de Dívida Ativa pelo fisco constitui "sanção política" – pois seria uma medida extrajudicial que restringe de forma desproporcional os direitos fundamentais dos contribuintes ao devido processo legal, à livre iniciativa e ao livre exercício profissional – imposta, de forma indireta, para pressioná-los a quitar seus débitos tributários.
Ponderou que, de acordo com a jurisprudência desta Corte sobre o tema, é possível concluir não bastar que uma medida coercitiva do recolhimento do crédito tributário restrinja direitos dos contribuintes devedores para que ela seja considerada uma sanção política. Exige-se, além disso, que tais restrições sejam reprovadas no exame de proporcionalidade e razoabilidade.
Afirmou que a utilização do instituto pela Fazenda Pública não viola o princípio do devido processo legal. Rememorou que, no regime jurídico atual, a execução fiscal constitui o mecanismo próprio de cobrança judicial da Dívida Ativa (Lei 6.830/1980, art. 38). No entanto, embora a Lei 6.830/1980 eleja o executivo fiscal como instrumento típico para a cobrança da Dívida Ativa em sede judicial, ela não exclui a possibilidade de instituição e manejo de mecanismos extrajudiciais de cobrança. Por sua vez, o protesto é justamente um instrumento extrajudicial que pode ser empregado para a cobrança de certidões de dívida, com expressa previsão legal, nos termos do parágrafo único do art. 1º da Lei 9.492/1997.
Segundo assentou, não há, assim, qualquer incompatibilidade entre ambos os instrumentos. Eles são até mesmo complementares. Frustrada a cobrança pela via do protesto, o executivo fiscal poderá ser normalmente ajuizado pelo fisco. E mais: em relação à cobrança de créditos de pequeno valor, o protesto será, muitas vezes, a única via possível. Diversas Fazendas optaram por autorizar o não ajuizamento de execuções fiscais nos casos em que o custo da cobrança judicial seja superior ao próprio valor do crédito. Mesmo na ausência de lei sobre o tema, alguns juízes e tribunais locais passaram a extinguir execuções fiscais por falta de interesse processual na hipótese.
Além disso, o protesto não impede o devedor de acessar o Poder Judiciário para discutir a validade do crédito tributário ou para sustar o protesto. Tampouco exclui a possibilidade de o protestado pleitear judicialmente uma indenização, caso o protesto seja indevido. Inexiste, assim, qualquer mácula à inafastabilidade do controle judicial. Por esses motivos, não se vislumbra fundamento constitucional ou legal que impeça o Poder Público de estabelecer, por via de lei, o protesto como modalidade extrajudicial e alternativa de cobrança de créditos tributários. Portanto, o protesto de Certidões da Dívida Ativa não importa em qualquer restrição ao devido processo legal.
Ademais, o protesto de Certidões de Dívida Ativa não representa um efetivo embaraço ao regular exercício das atividades empresariais e ao cumprimento dos objetos sociais dos administrados. Sua principal finalidade é dar ao mercado conhecimento a respeito da existência de débitos fiscais e permitir a sua cobrança extrajudicial. Desse modo, a medida não impacta diretamente a vida da empresa. Diversamente dos casos julgados por esta Corte em que se concluiu pela violação à livre iniciativa, o protesto não compromete a organização e a condução das atividades societárias – tal como ocorre nas hipóteses de interdição de estabelecimento, apreensão de mercadorias, restrições à expedição de notas fiscais e limitações à obtenção de registros ou à prática de atos necessários ao seu funcionamento – nem restringe, efetivamente, a livre iniciativa e a liberdade de exercício profissional. Quando muito, ele pode promover uma pequena restrição a tais direitos pela restrição creditícia, que, justamente por ser eventual e indireta, não atinge seus núcleos essenciais.
A última alegação da requerente é a de que o protesto de CDAs violaria o princípio da proporcionalidade, pois tal instrumento constituiria meio inadequado para alcançar as finalidades do instituto, e desnecessário, uma vez que o fisco teria meios especiais e menos gravosos para a satisfação do crédito tributário.
Em relação à adequação da medida, cabe verificar se o protesto de Certidões de Dívida Ativa é idôneo para atingir os fins pretendidos, isto é, se as restrições impostas aos direitos fundamentais dos devedores são aptas a promover os interesses contrapostos.
Com a edição da Lei 9.492/1997, registrou-se sensível ampliação do rol de títulos sujeitos a protesto, que passou a incluir, além dos cambiais, "títulos e outros documentos de dívida". Hoje, portanto, podem ser protestados quaisquer títulos executivos, judiciais ou extrajudiciais, desde que dotados de liquidez, certeza e exigibilidade, nos termos do art. 783 do Código de Processo Civil de 2015.
A partir dessa alteração legislativa, o protesto passou também a desempenhar outras funções além da meramente probatória. De um lado, ele representa instrumento para constituir o devedor em mora e comprovar o descumprimento da obrigação. De outro, confere ampla publicidade ao inadimplemento e consiste em meio alternativo e extrajudicial para a cobrança da dívida.
Portanto, a remessa da Certidão da Dívida Ativa a protesto é medida plenamente adequada às novas finalidades do instituto. Ela confere maior publicidade ao descumprimento das obrigações tributárias e serve como importante mecanismo extrajudicial de cobrança, contribuindo para estimular a adimplência, incrementar a arrecadação e promover a justiça fiscal, impedindo que devedores contumazes possam extrair vantagens competitivas indevidas da sonegação de tributos. Por evidente, a origem cambiária do instituto não pode representar um óbice à evolução e à utilização do instituto em sua feição jurídica atual.
O protesto é, em regra, mecanismo que causa menor sacrifício ao contribuinte, se comparado aos demais instrumentos de cobrança disponíveis, em especial a Execução Fiscal. Por meio dele, exclui-se o risco de penhora de bens, rendas e faturamentos e de expropriação do patrimônio do devedor, assim como se dispensa o pagamento de diversos valores, como custas, honorários sucumbenciais, registro da distribuição da execução fiscal e se possibilita a redução do encargo legal.
Assim, o protesto de Certidões de Dívida Ativa proporciona ganhos que compensam largamente as leves e eventuais restrições aos direitos fundamentais dos devedores. Daí por que, além de adequada e necessária, a medida é também proporcional em sentido estrito. Ademais, não configura uma "sanção política", já que não constitui medida coercitiva indireta que restrinja, de modo irrazoável ou desproporcional, direitos fundamentais dos contribuintes, com o objetivo de forçá-los a quitar seus débitos tributários. Tal instrumento de cobrança é, portanto, constitucional.
Por fim, em atenção aos princípios da impessoalidade e da isonomia, é recomendável a edição de regulamentação, por ato infralegal que explicite os parâmetros utilizados para a distinção a ser feita entre os administrados e as diversas situações de fato existentes.
A declaração de constitucionalidade do protesto de Certidões de Dívida Ativa pela Administração Tributária traz como contrapartida o dever de utilizá-lo de forma responsável e consentânea com os ditames constitucionais. Assim, nas hipóteses de má utilização do instrumento, permanecem os juízes de primeiro grau e os demais tribunais do País com a prerrogativa de promoverem a revisão de eventuais atos de protesto que, à luz do caso concreto, estejam em desacordo com a Constituição e com a legislação tributária, sem prejuízo do arbitramento de uma indenização compatível com o dano sofrido pelo administrado.
Vencidos os ministros Edson Fachin, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio, que julgavam procedente o pedido. Pontuavam tratar-se de sanção política a afrontar a atividade econômica lícita, o devido processo legal e o direito de ampla defesa do contribuinte. Ressaltavam que o protesto seria um ato unilateral da administração, sem qualquer participação do contribuinte e teria como único objetivo constranger o devedor. Frisavam haver outros meios menos onerosos para a cobrança dos débitos. Ademais, no momento que a CDA fosse submetida a um protesto, o contribuinte sofreria cerceamento de crédito, o que restringiria suas atividades do dia a dia.
O ministro Marco Aurélio, além do aspecto material, reconhecia a inconstitucionalidade formal da norma em razão de ofensa ao devido processo legislativo, pois a emenda que resultou no dispositivo atacado não tinha pertinência com a matéria tratada na medida provisória. Além disso, não participou da fixação da tese.
ADI 5135/DF, rel. Min. Roberto Barroso, 3 e 9.11.2016. (ADI-5135)
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http://www.stf.jus.br//arquivo/informativo/documento/informativo846.htm#Protesto de CDA e sanção política
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