quinta-feira, 15 de setembro de 2011
VALOR ECONÔMICO - LEGISLAÇÃO & TRIBUTOS
Num julgamento que pode afetar milhões de contribuintes do país, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) começou a analisar, na tarde de ontem, quem tem o direito de entrar na Justiça para discutir a incidência de tributos, além de pedir a restituição de valores já pagos. Embora o julgamento tenha sido interrompido após um voto, três ministros manifestaram a intenção de rediscutir o posicionamento atual da Corte.
O caso em discussão é um recurso da construtora F. Rozental, do Rio de Janeiro, que questiona a cobrança de um adicional de 5% do ICMS destinado ao Fundo Estadual de Combate à Pobreza - que elevou a alíquota do imposto para 30%. A construtora pede para deixar de pagar o adicional, e que o Estado devolva os valores já recolhidos. Mas, antes, terá que defender o direito de fazer esse questionamento na Justiça.
Em 2010, ao julgar um caso envolvendo o IPI pago por distribuidoras de cerveja, a 1ª Seção do STJ concluiu que somente o "contribuinte de direito" - aquele responsável por fazer o recolhimento de tributos ao Fisco - pode pedir a devolução de tributos pagos indevidamente. Por exemplo: nas contas de luz, é o consumidor final que arca com os custos do ICMS. Mas são as distribuidoras de energia que repassam os valores ao Fisco - são elas, portanto, os contribuintes de direito, que estabelecem a relação jurídica com o órgão arrecadador.
Nesse exemplo, segundo a jurisprudência atual do STJ, apenas as distribuidoras podem entrar na Justiça pedindo a restituição do imposto. Embora seja o consumidor final que arque efetivamente com os custos, ele é impedido de mover ações pedindo a devolução. Como o precedente de 2010 foi tomado pelo sistema do recurso repetitivo, a tese deve ser replicada em todos os casos semelhantes.
Mas, ao analisar o recurso da construtora F. Rozental, o ministro Teori Albino Zavascki, relator do caso, sugeriu uma nova discussão sobre o tema. Ele afirmou que, embora o precedente de 2010 tratasse somente da devolução de impostos, as turmas do STJ vêm aplicando o mesmo entendimento para a discussão de tributos de maneira geral. Ou seja, o consumidor final não teria o direito nem de entrar com ações para questionar tributos já pagos, nem para deixar de recolher. "Ocorre que as turmas passaram a negar a legitimidade do contribuinte de fato não só quanto à repetição (pedido de devolução), mas também quanto à incidência do tributo", afirmou.
O ministro manifestou "reservas" quanto ao precedente que impediu os contribuintes de fato de pedir a devolução de impostos. Mas ponderou que, como o assunto foi objeto de decisão por meio de um recurso repetitivo, há cerca de um ano, evitaria colocá-lo novamente em discussão. Por isso, em seu voto, Zavascki optou por uma posição intermediária: defendeu que a construtora tem legitimidade para discutir somente os tributos a serem pagos - mas não para pedir a devolução do que já foi recolhido. O julgamento foi interrompido por um pedido de vista do ministro Mauro Campbell Marques.
Mas antes que a discussão terminasse, dois ministros sugeriram uma reavaliação completa da matéria - envolvendo também a possibilidade do consumidor final pedir a devolução. "A 1ª Seção manifestou um posicionamento por 20 anos e não teve nenhum constrangimento de alterar seu entendimento, de uma hora pra outra", afirmou o ministro Cesar Asfor Rocha, em referência ao precedente do ano passado, durante o qual não estava presente, pois ainda não integrava a 1ª Seção. "Eu não tenho nenhum constrangimento em reapreciar essa questão." O ministro opinou que, pelo entendimento atual da Corte, as empresas não teriam motivos para entrar com ações nesses casos, pois não arcam com o ônus do imposto e prefeririam evitar o "desgaste político" de mover processos contra o Fisco.
O ministro Napoleão Maia Filho reforçou a sugestão, sustentando que o artigo 166 do Código Tributário Nacional (que trata da restituição de tributos) não impede o contribuinte de fato de entrar com ações pedindo a devolução. "E, se impedisse, seria inconstitucional, pois o acesso ao Judiciário é assegurado", afirmou.
Maíra Magro - De Brasília
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