domingo, 4 de setembro de 2011

trf3: MS. anulação de ato administrativo que aplicou a pena de perdimento, com a consequente liberação e restituição de veículo automotor de sua propriedade, apreendido em razão de estar sendo utilizado para praticar, em tese, crime de descaminho.

Pg. 985. Judicial I - TRF. Tribunal Regional Federal - 3ª Região (TRF3) de 01/09/2011

[...] No. ORIG. : 00050639620094036005 1 Vr PONTA PORA/MS

DECISÃO

Cuida-se de mandado de segurança, com pedido liminar, impetrado por Sérgio Gonçalves Lopes em face da Inspetoria da Receita Federal do Brasil em Ponta Porã/MS, objetivando, em suma, a anulação de ato administrativo que aplicou a pena de perdimento, com a consequente liberação e restituição de veículo automotor de sua propriedade, apreendido em razão de estar sendo utilizado para praticar, em tese, crime de descaminho.

Processado o feito, restou deferida, parcialmente, a medida liminar, para determinar à autoridade administrativa a suspensão da aplicação da penalidade de perdimento, impedindo sua alienação/doação para terceiros.

Prestadas informações pela autoridade coatora a fls. 63/71.

Sentença a fls. 163/165v. concedendo a segurança, para anular a decisão administrativa que impôs a pena de perdimento, determinando à autoridade impetrada a restituição do veículo apreendido ao impetrante, ensejando apelo da União com vistas à sua reforma.

Sentença submetida ao reexame necessário.

Existentes contrarrazões.

Manifestação do Ministério Público Federal a fls. 197/199, opinando pela manutenção da sentença.

Decido.

Estando sedimentada a jurisprudência sobre a matéria em discussão, o feito comporta julgamento nos termos do artigo 557 do Código de Processo Civil.

Com efeito, acerca do tema o C. Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento de que não há que se falar em perdimento de veículo quando houver desproporcionalidade entre o seu valor e o das mercadorias, objeto de contrabando e/ou descaminho, por ele transportadas.

Confiram-se, a respeito, os seguintes julgados:

"PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. DL 37/66. PENA DE PERDIMENTO DE VEÍCULO. DESCAMINHO. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE.

1. Cuida-se de recurso especial pela letra "c", III, art. 105, CF/88 contra aresto assim ementado (fl. 68): "VEÍCULO APREENDIDO. PENA DE PERDIMENTO. ANTECIPAÇÃO DE  TUTELA. LIBERAÇÃO MEDIANTE DEPÓSITO. NÃO-CABIMENTO.

1. Aplica-se a pena de perdimento ao veículo que transportar mercadorias sujeitas à tal penalidade sendo proprietário seu condutor ou, não o sendo, quando demonstrada sua responsabilidade na prática da infração (art. 104, V, do Decreto-Lei 37/66). 2. Respondem pela infração, conjunta ou isoladamente, o proprietário e o consignatário do veículo em relação ao que decorrer do exercício de atividade própria ou, ainda, de ação ou omissão de seus tripulantes (art. 603 do Decreto nº 4543/02 - Regulamento Aduaneiro). 3. Havendo indícios de participação do proprietário do veículo, é acertada a apreensão procedida."

O recorrente pede reforma do decisório alegando dissídio com julgados deste STJ que entendem inaplicável a pena de perdimento quando existir uma desproporcionalidade muito grande entre o valor da mercadoria e o do veículo.

2. No transporte de bens irregularmente importados, a flagrante desproporcionalidade entre o valor do veículo e das mercadorias nele transportadas não dá ensejo à aplicação de pena de perdimento daquele, a despeito do que dispõe o inciso V do art. 104 do DL 37, a saber: "Art. 104 - Aplica-se a pena de perda do veículo nos seguintes casos: (...) V -quando o veículo conduzir mercadoria sujeita à pena de perda, se pertencente ao responsável por infração punível com aquela sanção;"

3. No caso, foram apreendidas mercadorias no valor de R$ 11.311,39 transportadas em veículo particular orçado em R$ 43.500,00. Desta forma, com fundamento nos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, não deve ser aplicada a pena de perdimento.

4. Precedentes jurisprudenciais desta Corte.

5. Recurso especial provido. (destaquei)

(REsp nº 854949/PR, Primeira Turma, Rel. Ministro José Delgado, j. em 21/11/2006, DJ 14/12/2006)
 

RECURSO ESPECIAL - ADMINISTRATIVO - CONTRABANDO DE DOIS RIFLES - APREENSÃO DE VEÍCULO -PENA DE PERDIMENTO DE VEÍCULO CUJO VALOR É QUATRO VEZES SUPERIOR AO DOS RIFLES - NÃO CABIMENTO - APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE.

Esta Corte Superior de Justiça pacificou o entendimento segundo o qual é "inadmissível a aplicação da pena de perdimento do veículo, quando evidente a desproporção entre o seu valor e o da mercadoria de procedência estrangeira apreendida" (REsp n. 109.710/PR, Rel. Min. Hélio Mosimann, DJ de 22.04.97).

Na hipótese em exame foi apreendido veículo no valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), enquanto os dois rifles contrabandeados equivaliam, em conjunto, a R$ 1.000,00 (mil reais). Dessa forma, em respeito aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, não deve ser aplicada ao caso dos autos a pena de perdimento, uma vez que o valor das mercadorias contrabandeadas é muito inferior ao valor do veículo.

Recurso especial ao qual se nega provimento." (destaquei)

(REsp nº 508322/PR, Segunda Turma, Rel. Ministro Franciulli Netto, j. 14/10/2003, DJ 19/12/2003)

Não é outro o entendimento desta Corte, conforme se verifica pelo seguinte trecho do voto proferido pelo eminente Des. Fed. Nery Junior nos autos nº 2001.60.00.005903-4 (DJU de 18/5/2005):

[...] "...

No entanto, a pena administrativa de perdimento, constitucionalmente prevista no art. 5º, XLVI, alínea b, tem natureza jurídica de ressarcimento ao erário, considerando-se o dano causado pelo inadimplemento de obrigação legal, devendo haver proporção entre o valor do veículo transportador e o da mercadoria objeto da apreensão, conforme orientação jurisprudencial, cujo teor transcrevo a seguir:

"ADMINISTRATIVO. PERDIMENTO DE BENS. DESPROPORÇÃO ENTRE O VALOR DO VEICULO TRANSPORTADOR E O DA MERCADORIA APREENDIDA. DIREITO A RESTITUIÇÃO. EQUIVALENTE EM DINHEIRO.

Não se admite a Pena de Perdimento do veículo transportador quando evidente a desproporção entre o seu valor e o da mercadoria apreendida.

Assim, demonstrado, de forma inequívoca, que o valor do veículo transportador, é significativamente maior que o da mercadoria apreendida, e inaplicável a Pena de Perdimento em relação ao primeiro.

A conduta administrativa que, após aplicar a Pena de Perdimento de bens, destinou o veículo à programa de política pública federal, mesmo que necessária a implementação de determinada finalidade pública, causou dano ao requerente, que agora deverá ser ressarcido em seu equivalente em dinheiro, nos termos do que determina o §6º, do artigo 37, da Constituição Federal.

Recurso de apelação e remessa oficial a que se nega provimento.
(TRF - 3ª Região, Quinta Turma, AC 838.893/MS, Rel. Des. Fed. Suzana Camargo, j. 11/3/2003, DJU 3/6/2003, p.551)" ...".

In casu, os termos de apreensão e guarda fiscal revelam que o veículo foi avaliado pela autoridade fazendária em R$ 7.000,00 e a mercadoria em R$ 750,00 (fls. 38 e 30, respectivamente).

Desta feita, evidenciada a desproporcionalidade entre o valor do automóvel apreendido e o da mercadoria por ele transportada, de rigor a manutenção da sentença vergastada.

De outra banda, encontrando-se a matéria pacificada no âmbito do C. Superior Tribunal de Justiça e desta Corte, mostra-se despicienda maiores digressões acerca do tema, mesmo porque "(...) o órgão judicial, para expressar a sua convicção, não precisa aduzir comentários sobre todos os argumentos levantados pelas partes. Sua fundamentação pode ser sucinta, pronunciando-se acerca do motivo que, por si só, achou suficiente para a composição do litígio (...)" (in Theotonio Negrão e José Roberto F. Gouvêa, Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, 39. ed. atual. até 16 de janeiro de 2007. - São Paulo: Saraiva: 2007, p. 698, nota 3 ao art. 535).

Ante o exposto, com fulcro no artigo 557, caput, do CPC, NEGO SEGUIMENTO à remessa oficial e ao apelo interposto, mantendo a sentença recorrida, nos termos da fundamentação.

Decorrido o prazo para interposição de recurso, baixem os autos à Vara de Origem, observadas as formalidades legais. Intimem-se. Publique-se.

São Paulo, 19 de agosto de 2011.

MARCIO MORAES

Desembargador Federal

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