A decisão tomada em dezembro contra os lápis chineses falsamente importados de Taiwan tem efeito pequeno sobre o volume do comércio exterior, embora seja de forte significado para a política comercial. O governo, ao investigar a denúncia e comprovar que a exportadora estrangeira não fabricava os lápis que supostamente vendera ao Brasil, barrou a licença de importação, no valor de US$ 87 mil, e proibiu a compra de novos produtos da empresa, a Chang Jia, que já era responsável por sete de cada cem lápis importados com origem declarada em Taiwan. O caso é significativo por mostrar, ao mesmo tempo, a importância e os limites das medidas de defesa comercial.
"Vamos aperfeiçoar o processo, reduzir prazos e reforçar a equipe de analistas de comércio exterior", anuncia o diretor de Negociações Internacionais do Ministério do Desenvolvimento, Daniel Godinho. Ele coordena seis investigações que deverão dar resultados ainda no primeiro semestre, e analisa três pedidos de providências contra outros produtos ("alguns vão ter impacto forte", afirma). "A tendência é crescerem exponencialmente os casos de dumping, e, com eles, os de declaração falsa de origem", prevê o diretor.
Em 2011, foram seis casos concluídos, e em pelo menos um deles, o que barrou importações de imãs de ferrite, usados principalmente em alto-falantes, a medida contra os importados foi fundamental para a sobrevivência das empresas fabricantes no país. Como no caso dos lápis, os valores envolvidos são irrisórios se comparados com o volume total das importações brasileiras, de quase US$ 225 bilhões, mas significativos para as empresas envolvidas.
Dos seis casos investigados em 2011 por falsa declaração de origem, um deles, envolvendo um fabricante de escovas, não rendeu o resultado esperado pelos concorrentes brasileiros. A empresa de Taiwan conseguiu mostrar ser a real fabricante do produto aos investigadores brasileiros, que se instalaram por três dias nas instalações taiwanesas e vasculharam a contabilidade da companhia. Godinho teve o cuidado de procurar as autoridades de Taiwan, nesse e em outros casos, para informar que não havia uma ofensiva do Brasil contra o país, mas a legítima defesa contra uma prática ilegal. A iniciativa permitiu ao governo brasileiro ter a cooperação das autoridades locais na busca de documentos e informações.
Até o ano passado, a investigação de declarações de origem era feita somente em caso de produtos vindos de países com os quais o Brasil tem acordos de redução tarifária, os chamados acordos preferenciais de comércio. Desde 2011, adotou-se a prática de investigar também as fraudulentas declarações de origem em produtos sujeitos a medidas antidumping. O governo tem, inclusive, tomado a iniciativa de investigar alguns produtos, antes mesmo das reclamações de concorrentes brasileiros afetados.
A experiência na exploração desse novo campo da defesa comercial é complementada pela ação da Receita Federal, que, agindo com o Ministério de Desenvolvimento, abre investigações para avaliar se os importadores brasileiros foram iludidos ou agiram de má fé. Esse caso é um bom exemplo da qualidade adquirida pelo Brasil na ação contra importações desleais ou ilegais: as investigações são feitas em cooperação entre diversos órgãos públicos, seguem critérios técnicos, praticamente invulneráveis à contestação por parte dos países afetados pelas barreiras no Brasil levantadas contra os importados, e atendem às preocupações das empresas brasileiras prejudicadas.
Ao contrário do que algumas autoridades brasileiras parecem acreditar, porém, dificilmente ações como essa vão ter impacto significativo no volume total de importações do Brasil, e pouco ou nada poderão fazer contra produtos baratos que vêm ao país beneficiados pela agressividade exportadora de países de grande competitividade.
O Brasil não pode confundir política industrial com defesa comercial, nem prejudicar a qualidade e honestidade do trabalho que vem sendo feito nesse campo para compensar a falta de condições adequadas para os produtores nacionais conquistarem compradores no exterior e defenderem sua posição no cobiçado mercado brasileiro.
As ações contra declarações falsas de origem mostram que o Brasil deve reforçar, como vem fazendo, seus mecanismos contra a competição desleal e ilegal. Esse reforço tem de ser acompanhado, no entanto, por uma política clara e coerente de remoção dos entraves aos investimentos e à produção.
Sergio Leo
Valor Econômico 02/01/2012
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