terça-feira, 20 de março de 2012

Lavagem de dinheiro Banco Central aumenta lista de operações suspeitas

Por Marcos de Vasconcellos

Depósitos em notas úmidas, malcheirosas ou mofadas deverão ser
obrigatoriamente comunicados ao Banco Central como operações
suspeitas, tal qual pagamentos a pessoas no exterior que não estejam
diretamente vinculados a importação ou exportação. As ordens vêm do
Banco Central, que mais que duplicou (de 43 para 106) a lista das
chamadas "movimentações atípicas".

O aumento do número de ações consideradas suspeitas se deu no último
dia 12 de março, por meio de uma carta-circular (3.542/12). As
situações passam a ser obrigatoriamente comunicadas ao BC que, por sua
vez, poderá encaminhar relatórios ao Ministério Público ou à Polícia
Federal, responsáveis por abrir investigação.

As investigações criminais, porém, muitas vezes são feitas sem
fundamento, afirma o criminalista Jair Jaloreto. Segundo ele, muitas
das situações listadas são subjetivas ou acabam "extrapolando" o
universo da lavagem de dinheiro. "Com o aumento do rol de atividades
suspeitas, empresas pequenas e pessoas físicas vão acabar se tornando
suspeitas de lavagem de dinheiro", diz.

Segundo ele, mesmo com a intenção declarada de coibir a lavagem de
dinheiro, que é essencial ao tráfico de armas e de drogas, o mecanismo
poderá tratar como suspeitas pessoas e empresas sem relação com crimes
financeiros, mas que deixaram de observar uma dessas novas normas, que
não foram divulgadas.

A subjetividade dos novos critérios também preocupa o criminalista
Edward Rocha de Carvalho do escritório J. N. Miranda Coutinho &
Advogados. Segundo ele, o aumento das movimentações atípicas
classificadas pelo BC mostra a adoção da "presunção da ilegalidade em
todo e qualquer ato, um controle total do Estado na vida do cidadão."

Entre os critérios que podem ser apontados como subjetivos está a
"alteração inusitada nos padrões de vida e de comportamento do
empregado ou do representante [de instituições financeiras], sem causa
aparente".

Segundo Carvalho, os critérios pouco palpáveis fazem com que processos
criminais possam ser usados como instrumentos de perseguição a
cidadãos e empresas. "Em vez de ter um fato determinado para
investigar, comunicam uma operação atípica, instauram um inquérito
policial, quebram sigilos e deixam o cidadão à mercê do Estado."

O procurador-geral do Banco Central, Isaac Sidney Menezes Ferreira,
concorda que o BC vai passar a ter maior acesso a informações
protegidas pelo sigilo, uma vez que esmiuçou uma série de operações
consideradas suspeitas. Para ele, porém, isso não configura um aumento
da quebra de sigilo, porque nenhum sigilo pode ser posto ao BC desde
2001, quando foi sancionada a Lei Complementar 105, que dispos sobre
sigilo das operações de instituições financeiras.

Ferreira explica que a nova listagem foi motivada por estudos
técnicos, experiências no próprio mercado financeiro brasileiro e
recomendações internacionais para o combate à lavagem de dinheiro. Ele
afirma, porém, que isso não significa que pessoas sem ligação com o
crime terão problemas com o Banco Central. "As operações são
classificadas como suspeitas para serem acompanhadas e tratadas",
explica.

Agências no exterior
Além da Carta-Circular 3.542, a diretoria do BC também aprovou no dia
12 de março as de número 3.583 e 3.584. A primeira determina que
instituições financeiras não devem iniciar qualquer relação de negócio
com clientes, ou dar prosseguimento a relação já existente, se não for
possível identificá-lo plenamente. As normas, segundo o documento,
devem ser estendidas à agências subsidiárias no exterior.

Apesar de o BC não ter poder para determinar como funciona uma agência
em outro país — que deve obedecer às leis da nação em que está —, a
instituição determinou que as instituições informem sobre os locais em
que as normas não possam ser cumpridas. "Assim, quando o cliente
preferir colocar o dinheiro lá fora em vez de no Brasil, ele entrará
no nosso 'radar'", diz Ferreira.

Já a 3.584 afirma que as instituições financeiras brasileiras
autorizadas a operar no mercado de câmbio no Brasil com instituições
financeiras do exterior devem se certificar de que a sua contraparte
no exterior tenha presença física no país onde está constituída,
evitando o uso de empresa fantasma.

Marcos de Vasconcellos é repórter da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico, 20 de março de 2012

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