O desempenho das importações foi melhor que o da produção nacional em 18 de 20 setores da indústria de transformação no acumulado de janeiro a julho deste ano, em comparação com o mesmo período de 2010. Em seis dessas 18 "vitórias", o volume importado cresceu enquanto a fabricação doméstica diminuiu, segundo cruzamento da Pesquisa Industrial Mensal, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (PIM-IBGE), com a série de volume importado da Fundação Centro de Estudos de Comércio Exterior (Funcex).
A valorização do real perante o dólar é o principal fator que explica essa perda de espaço da indústria na opinião de representantes de setores. A moeda americana desvalorizou-se 9,65% de janeiro a julho de 2011 em relação ao mesmo período do ano passado - a comparação não alcança a recente valorização do dólar. O dólar mais fraco encarece o produto nacional, dificultando as exportações e barateia o importado, podendo tornar-se uma espécie de ameaça à produção do país.
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Na opinião de Julio Gomes de Almeida, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda e hoje consultor do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), o maior problema é o momento em que as importações avançam: "O impacto das importações sobre a indústria é maior quando a economia está desaquecida. Antes, o crescimento econômico interno atenuava o avanço das importações e a perda de espaço para a importação era relativa, e não absoluta, como ocorre agora."
Em alguns setores, a crise internacional prejudicou diretamente as exportações do Brasil, outro fator que desestimula a produção nacional. "A desaceleração no consumo de países europeus e Estados Unidos, assim como a queda na produção, impulsiona o excedente de estoques, o que afeta negativamente a criação de empregos", diz Milton Cardoso, presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados). Além da perda da exportação, os sinais de que o produto nacional está sendo substituído pelo importado também preocupam.
Os números do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) mostram isso: entre maio e junho de 2010, o setor criou 4.700 vagas, enquanto no mesmo bimestre de 2011 houve uma redução de 5.100 pessoas no quadro de empregados. "Houve forte crescimento na importação do calçado desmontado. Somente a montagem, realizada no Brasil, agrega pouco valor ao produto e emprega menos gente", diz Cardoso. Enquanto a produção nacional de calçados caiu 7,4% no acumulado de janeiro a julho deste ano, as importações subiram 31,3% em relação a igual período de 2010.
"O Brasil caminha para um grave processo de desindustrialização e vai pagar caro por isso", afirma Aguinaldo Diniz Filho, o presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), outro setor em que as importações crescem enquanto a produção nacional cai. Na sua opinião, a indústria têxtil no país carece de incentivos como os encontrados na China, apontada como o maior concorrente. "No desfile do dia 7 de Setembro, os soldados vestiram fardas fabricadas na China. Nós poderíamos produzi-las, mas importamos a maior parte", diz.
Também no setor, os efeitos da desindustrialização foram sentidos na criação de empregos. Na comparação entre o acumulado de janeiro a julho de 2011 e 2010, houve uma desaceleração de 67% na geração de empregos, que foi de 51 mil nos primeiros sete meses do ano passado e 17 mil no mesmo período de 2011, segundo a Abit.
As atividades que sentem os efeitos das importações vão da produção de metal à produção de alimentos e bebidas, do refino de petróleo e combustíveis à indústria química. Apenas nos setores de metalurgia básica e de equipamentos médico-hospitalares, de automação industrial e de precisão, a importação registrou queda frente ao desempenho da produção nacional. "O nosso mercado interno é bom. Lá fora, há um excesso de oferta. A soma desses fatores explica a atração de parceiros comerciais", diz Almeida, do Iedi.
Entre as indústrias em que há maior distanciamento entre o aumento da importação e a produção está a de mobiliário. As importações no setor cresceram 24,4% entre janeiro e julho de 2011 em comparação com o mesmo período de 2010, enquanto a produção local cresceu só 1,7%.
Apesar de a produção da indústria farmacêutica ter crescido no acumulado do ano de 2011 (6,1%), a importação de produtos químicos em geral - inclusive farmacêuticos - aumentou de modo mais acelerado: 11,8% no mesmo período, em comparação com o acumulado de janeiro a julho de 2010. De acordo com dados da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim), o quadro é ainda mais grave. "A importação de produtos que poderiam ter sido produzidos no Brasil cresceu 30,6% no acumulado do ano até julho. Esse número nos preocupa mais que o déficit comercial, que deve fechar 2011 em US$ 25 bilhões, ante US$ 20 bilhões negativos em 2010" diz Denise Naranjo, diretora de Comércio Exterior da Abiquim.
De acordo com a própria associação, o consumo de produtos químicos em geral cresceu 7,1% no acumulado de 2011, mas as vendas internas desses produtos caíram 4,6%. E a importação explica a diferença. "A produção no setor químico exige grandes investimentos. Nos últimos anos, indústrias desativaram unidades de produção principalmente devido à concorrência com o importado, em especial o chinês", diz Naranjo.
Já o presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) não vê o forte crescimento nas importações como ameaça à indústria nacional. De acordo com os dados da Funcex e do IBGE, no acumulado de 2011 até julho, houve um aumento de 19,8% das importações no setor, enquanto a produção cresceu 5,6% na comparação com o mesmo período de 2010. "Os números refletem um grupo de produtos que não afeta a produção nacional. Precisamos tomar cuidado para que as importações não subam ainda mais, investindo em inovação, pesquisa e, principalmente, no setor de autopeças", diz Cledorvino Belini.
Valor Econômico/Por Carlos Giffoni | De São Paulo
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