sexta-feira, 27 de julho de 2012

A glosa de créditos de ICMS e a jurisprudência



GUERRA FISCAL

Recentemente, o Supremo Tribunal Federal (STF) negou seguimento ao Mandado de Segurança 21.863-1 e, assim, cassou a medida liminar, em vigor há mais de 18 anos, que suspendia a eficácia de dispositivos da legislação do estado de São Paulo, notadamente, as Portarias CAT-54/93, CAT-85/93 e a Resolução SF-52/93, as quais restringiam o aproveitamento de créditos de ICMS em relação a operações interestaduais com origem no estado do Espírito Santo e destinadas a estabelecimentos paulistas.
A ação em questão remete ao início da chamada Guerra Fiscal, logo após a aprovação da Constituição de 1988. Tal ação foi ajuizada pelo estado do Espírito Santo, em 14 de dezembro de 1993, visando afastar as restrições ao crédito de ICMS impostas pela legislação paulista em razão dos benefícios fiscais concedidos no Estado capixaba por meio do Fundo para o Desenvolvimento das Atividades Portuárias (Fundap).
De pronto, em 17 de dezembro de 1993, o então relator, ministro Sepúlveda Pertence, sem analisar a validade das restrições ao aproveitamento de créditos impostas pelo estado de São Paulo, houve por bem deferir o pedido de liminar e suspender a eficácia das normas paulistas, com base tão somente nas consequências dos resultados do indeferimento da liminar, como se observa no trecho final de sua decisão: “Não obstante, é de ponderar, primeiro, que os atos questionados rompem o status quo de quase 20 anos; em segundo lugar, que as consequências fiscais e econômicas derivadas da ruptura do protocolo afetam em dimensões incomensuravelmente maiores e de modo irreparável o estado requerente (Espírito Santo) do que a manutenção provisória do status quo ante poderia afetar o poderoso estado dirigido pela Ilustre autoridade coatora (São Paulo). Por isso, defiro a liminar.
Pois bem. Passados mais de 18 anos, já sob a relatoria da ministra Cármen Lúcia, a ação foi julgada sem a resolução do mérito. O entendimento consignado na decisão foi o de que o Mandado de Segurança não seria a via adequada para a discussão de lei em tese, razão pela qual foi negado seguimento à ação e cassada a liminar.
Pode ser dito que a análise do mérito do Mandado de Segurança 21.863-1 tem pouco efeito prático, já que (i) a legislação de São Paulo, que impunha restrições aos créditos do ICMS, foi revigorada pela Portaria CAT-36/04, que de forma mais genérica estendeu a restrição a todas aquelas operações em que há desonerações do imposto no estado de origem; e (ii) que, mais recentemente, em 26 de maio de 2012, foi aprovada no Congresso Nacional a Resolução 13/2012, que unificou a alíquota de 4% do ICMS nas operações interestaduais com produtos importados a partir de 2013.
Contudo, vale chamar a atenção para a decisão sob outro prisma. Mais uma vez o STF deixou de apreciar a questão da validade das restrições ao creditamento do ICMS nos casos em que há concessões de benefícios fiscais no estado de origem.
Essa situação pode ser encarada de forma favorável aos contribuintes, uma vez que nos remete diretamente ao posicionamento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) acerca do assunto, o qual já proferiu muitas decisões no sentido de que enquanto os benefícios considerados indevidos não forem declarados inconstitucionais pelo STF, não deve ser admitida a glosa de créditos daqueles que, de boa fé, adquiriram mercadorias.
Dessa forma, consideramos que, aos processos judiciais nos quais exigências fiscais como a tratada neste texto são discutidas, poderiam ser aplicadas as disposições do artigo 557, parágrafo 1º-A, do Código de Processo Civil, que excepcionalmente autorizam o relator a dar provimento monocraticamente a recursos quando a decisão recorrida estiver em manifesto confronto com a jurisprudência dominante dos tribunais superiores.
Portanto, uma vez que a glosa de créditos de ICMS é a face mais visível da guerra fiscal e provavelmente a que mais tem gerado disputas e afetado o bolso dos contribuintes, é possível concluir que a posição do STJ favorável aos contribuintes é de grande relevância e pode ser utilizada para acelerar o julgamento de processos em andamento e a favor dos contribuintes.
William Roberto Crestani é advogado associado da área tributário do Pinheiro Neto Advogados.
Luiz Roberto Peroba Barbosa é advogado, sócio da área tributária do escritório Pinheiro Neto Advogados.
Pedro Colarossi Jacob é advogado associado da área tributário do Pinheiro Neto Advogados.
Revista Consultor Jurídico, 26 de julho de 2012

Nenhum comentário:

Postar um comentário