GUERRA FISCAL
Recentemente, o
Supremo Tribunal Federal (STF) negou seguimento ao Mandado de
Segurança 21.863-1 e, assim, cassou a medida liminar, em vigor há mais de
18 anos, que suspendia a eficácia de dispositivos da legislação do estado de
São Paulo, notadamente, as Portarias CAT-54/93, CAT-85/93 e a Resolução
SF-52/93, as quais restringiam o aproveitamento de créditos de ICMS em relação
a operações interestaduais com origem no estado do Espírito Santo e destinadas
a estabelecimentos paulistas.
A ação em questão
remete ao início da chamada Guerra Fiscal, logo após a aprovação da
Constituição de 1988. Tal ação foi ajuizada pelo estado do Espírito Santo, em
14 de dezembro de 1993, visando afastar as restrições ao crédito de ICMS
impostas pela legislação paulista em razão dos benefícios fiscais concedidos no
Estado capixaba por meio do Fundo para o Desenvolvimento das Atividades
Portuárias (Fundap).
De pronto, em 17 de
dezembro de 1993, o então relator, ministro Sepúlveda Pertence, sem analisar a
validade das restrições ao aproveitamento de créditos impostas pelo estado de
São Paulo, houve por bem deferir o pedido de liminar e suspender a eficácia das
normas paulistas, com base tão somente nas consequências dos resultados do
indeferimento da liminar, como se observa no trecho final de sua decisão: “Não obstante, é de ponderar, primeiro, que os atos questionados rompem o
status quo de quase 20 anos; em segundo lugar, que as consequências fiscais e
econômicas derivadas da ruptura do protocolo afetam em dimensões incomensuravelmente
maiores e de modo irreparável o estado requerente (Espírito Santo) do que a
manutenção provisória do status quo ante poderia afetar o poderoso estado
dirigido pela Ilustre autoridade coatora (São Paulo). Por isso, defiro a
liminar.”
Pois bem. Passados
mais de 18 anos, já sob a relatoria da ministra Cármen Lúcia, a ação foi
julgada sem a resolução do mérito. O entendimento consignado na decisão foi o
de que o Mandado de Segurança não seria a via adequada para a discussão de lei
em tese, razão pela qual foi negado seguimento à ação e cassada a liminar.
Pode ser dito que a
análise do mérito do Mandado de Segurança 21.863-1 tem pouco efeito prático, já
que (i) a legislação de São Paulo, que impunha restrições aos créditos do ICMS,
foi revigorada pela Portaria CAT-36/04, que de forma mais genérica estendeu a
restrição a todas aquelas operações em que há desonerações do imposto no estado
de origem; e (ii) que, mais recentemente, em 26 de maio de 2012, foi aprovada
no Congresso Nacional a Resolução 13/2012, que unificou a alíquota de 4% do
ICMS nas operações interestaduais com produtos importados a partir de 2013.
Contudo, vale
chamar a atenção para a decisão sob outro prisma. Mais uma vez o STF deixou de
apreciar a questão da validade das restrições ao creditamento do ICMS nos casos
em que há concessões de benefícios fiscais no estado de origem.
Essa situação pode
ser encarada de forma favorável aos contribuintes, uma vez que nos remete
diretamente ao posicionamento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) acerca do
assunto, o qual já proferiu muitas decisões no sentido de que enquanto os
benefícios considerados indevidos não forem declarados inconstitucionais pelo
STF, não deve ser admitida a glosa de créditos daqueles que, de boa fé,
adquiriram mercadorias.
Dessa forma,
consideramos que, aos processos judiciais nos quais exigências fiscais como a
tratada neste texto são discutidas, poderiam ser aplicadas as disposições do
artigo 557, parágrafo 1º-A, do Código de Processo Civil, que excepcionalmente
autorizam o relator a dar provimento monocraticamente a recursos quando a
decisão recorrida estiver em manifesto confronto com a jurisprudência dominante
dos tribunais superiores.
Portanto, uma vez
que a glosa de créditos de ICMS é a face mais visível da guerra fiscal e provavelmente
a que mais tem gerado disputas e afetado o bolso dos contribuintes, é possível
concluir que a posição do STJ favorável aos contribuintes é de grande
relevância e pode ser utilizada para acelerar o julgamento de processos em
andamento e a favor dos contribuintes.
Luiz Roberto Peroba Barbosa é advogado, sócio da área
tributária do escritório Pinheiro Neto Advogados.
Pedro Colarossi
Jacob é advogado associado da área tributário do Pinheiro Neto Advogados.
Revista Consultor Jurídico, 26 de julho de 2012
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