Sacha Calmon
Na hora de encerrar suas atividades no Brasil, as empresas são obrigadas a enfrentar exigências burocráticas para concluírem o processo. E só conseguem se livrar dos empecilhos por meio do Poder Judiciário. Recente decisão judicial assegurou a uma empresa estrangeira no Brasil o direito de encerrar suas atividades, mesmo sem ter passado o período de cinco anos que a Receita Federal tem para fiscalizar as compensações tributárias. Na decisão, a juíza da 2ª vara de Araraquara da Seção Judiciária de São Paulo determinou à Receita Federal que, no prazo de 120 dias, finalizasse os processos com os pedidos de compensação apresentados pela empresa nos últimos cinco anos de atividade. Formalizado o pedido de compensação de débito tributário, ele é homologado tacitamente e o crédito é extinto definitivamente, no prazo de cinco anos, de acordo com a lei 9.430 (clique aqui), de 1996. No caso, porém, a empresa queria encerrar as atividades no Brasil antes de transcorrido esse período. Apesar de estar em situação regular perante a Receita, não conseguia dar baixa no CNPJ.
O motivo era esse prazo de cinco anos, ainda não terminado. "Realmente não é razoável exigir do contribuinte que ele fique à mercê do Fisco", afirmou a magistrada na decisão. Especialistas chamam esse tipo de situação de constrição política. São exigências feitas pelos órgãos de fiscalização para obrigar o contribuinte a pagar os impostos que supostamente deve. Assim como no encerramento da atividade, nas incorporações as empresas também sofrem. Há decisões judiciais da Justiça Federal que liberam as incorporadas de apresentar certidão negativa de débitos à Junta Comercial para registro da operação. A incorporada também precisa dar baixa no CNPJ junto à Receita Federal. Nesse sentido, liminar da 14ª vara Federal do Rio de Janeiro: "Trata-se de sanção política porque a Receita tem outros meios, como a execução fiscal, para cobrar tributos".
Aliás, um país que arrecada R$1,3 trilhão (União, Estados e municípios), valor equivalente a 38% do PIB, pode se queixar? O Estado no Brasil, além de inepto administrativamente falando, cobra tributos demais, mas nos presta péssimos serviços públicos. O povo não tem saúde, segurança, educação e saneamento. Além disso, não paga o que deve, nos três níveis da Federação. Aliás, os precatórios não pagos são mais elevados que a dívida ativa. Ao contrário dos precatórios, que são derivados de sentenças judiciais irrecorríveis, líquidos e certos, 80% das execuções fiscais são ínfimas, os devedores sumiram ou o tributo não é devido, nasceu do arbítrio. Isso mostra que o Estado é o maior transgressor das leis em nosso país, caso contrário não teria tantas condenações. Como se não bastasse, atrapalha a vida dos contribuintes, os que fazem o país crescer. Precisamos, presidente Dilma, de uma nova Secretaria Nacional de Desburocratização.
A Receita tem muitos processos, mas executa pouco (converte 20% em renda). Tentam vender instrumentos de cobrança, tipo execução administrativa. O melhor é evitar autuações indevidas, digitalizar os controles e reduzir as interpretações fiscalistas da lei. Aliás, 15% das empresas garantem 90% da arrecadação Federal. Chega de burocracia e perseguição tributária a aterrorizar a iniciativa privada, motor do crescimento do país.
Uma reforma tributária que acabe paulatinamente com o IPI e recrie o ICMS, neutro, não cumulativo, com alíquotas únicas, sem qualquer tipo de exoneração fiscal, um grande e abrangente imposto sobre consumo de bens e serviços envolvendo as três ordens de governo se faz urgente. Uma forma inteligente de financiamento da seguridade social (assistência social, saúde, previdência), assim como maior progressividade, sem exageros, sobre a renda e o patrimônio é o que o país necessita.
Quanto aos pequenos e médios negócios: o simples, como predica a Constituição. No mais, certos Estados membros estão prejudicando a Federação e os demais Estados. Reduzem o ICMS/importação, em seus portos, dos insumos destinados a outros Estados. A China fica satisfeita. O ICMS extrafiscal é pior que a saúva, o inimigo público nº 1 de um sistema tributário sadio, assim como os desgraçados PIS e Cofins que são impostos sobre a renda bruta, a tributar o caixa das empresas, mesmo que tenham prejuízos no balanço. Nova CPMF, nem pensar. A saúde e a previdência contam com a Cofins, as contribuições sobre a folha de salários e as contribuições de autônomos, empregadores e empregados, além da contribuição social sobre o lucro das empresas. Na verdade, há desvio de finalidade e falta gestão. Governadores rápeces querem tirar a sardinha da brasa com mão alheia. Melhor fariam se se limitassem a governar. Que Vossa Excelência, presidente, não se deixe embair pelas vingativas vozes dos jacobinos a querer tributar as grandes fortunas. O país precisa delas, são ariscas e fugidias e ficam onde se lhe reconheçam mérito e serventia.
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*Sacha Calmon é advogado tributarista e sócio do escritório Sacha Calmon - Misabel Derzi Consultores e Advogados. Professor titular de Direito Financeiro e Tributário da UFRJ e presidente da Associação Brasileira de Direito Financeiro (ABDF)
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