O Brasil poderá voltar a fabricar trilhos ferroviários pelas mãos da Vale. A mineradora estuda montar uma usina em Governador Valadares (MG) com capacidade para produzir 500 mil toneladas anuais de trilhos destinados a abastecer suas próprias ferrovias e ao mercado em geral. Atualmente, todos os trilhos utilizados no país são importados. Além da Vale, o grupo Gerdau também examina produzir trilhos, aproveitando o laminador de perfis que possui desde 2002 na usina siderúrgica de Ouro Branco (MG), a Açominas).
O projeto da Vale já virou notícia na imprensa mineira, embora a empresa, consultada, prefira não falar do assunto. O subsecretário de Política Mineral e Energética da Secretaria de Desenvolvimento Econômico do Estado de Minas Gerais, Paulo Sérgio Machado Ribeiro, informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que o projeto existe, mas "ainda não está detalhado".
A ideia de a Vale construir uma usina siderúrgica para fabricar trilhos em Governador Valadares está inserida na política introduzida pelo ex-governador Aécio Neves (PSDB) de agregar valor à produção mineral do Estado, a maior do Brasil. No caso específico, a fábrica seria uma contrapartida à liberação do Projeto Apolo para a produção de minério de ferro na Serra da Gandarela, entre os municípios de Caeté e Santa Bárbara.
O Brasil não produz trilhos desde 1996, quando a CSN desativou seu laminador de perfis em Volta Redonda (RJ)
Outro projeto inserido na mesma política é o da construção de uma siderúrgica em Juiz de Fora pela mineradora Ferrous, em troca da licença para construir um mineroduto destinado a escoar até 50 milhões de toneladas de minério de ferro por ano por um porto a ser construído no Sul do Espírito Santo. Embora a Ferrous esteja negociando a compra de terreno na cidade da Zona da Mata mineira, o projeto ainda não decolou.
O Brasil não produz trilhos desde 1996, quando a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), recém-privatizada, desativou seu laminador de perfis em Volta Redonda (RJ) por falta de demanda. A indústria ferroviária do país vivia uma profunda crise, que, naquele ano, levou à privatização de suas várias malhas. Com a retomada dos projetos de expansão nos últimos anos, como o da conclusão da Ferrovia Norte-Sul e o de construção da Transnordestina, o assunto voltou a entrar em pauta.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva considerava "um absurdo" que o país dependesse exclusivamente de importação de um insumo fundamental para seu projeto de ampliação da malha ferroviária do país e estimulou estudos para que o Brasil voltasse a fabricar trilhos.
O problema é que dos 29,7 mil quilômetros de malha ferroviária existentes atualmente no país, cerca de dois terços não estão sendo utilizados, segundo cálculos do próprio governo. O porte previsto para a fábrica de trilhos da Vale é o mínimo considerado viável para a instalação de um laminador de perfis. A Vale é a maior operadora ferroviária do Brasil e a cidade de Governador Valadares é cortada pelos trilhos da Estrada de Ferro Vitória a Minas (EFVM), de propriedade da mineradora.
Em 2009, as concessionárias de ferrovia do país e a estatal Valec, que montou a Norte-Sul e está instalando a Oeste-Leste, gastaram US$ 170,1 milhões com a importação de 147,2 mil toneladas de barras de aço (trilhos). No ano passado, com a queda de preço, esse volume mais que triplicou, saltando para 496,4 mil toneladas. Foram gastos US$ 429 milhões com entrada de trilhos.
Especialistas do setor estimam que uma fábrica de trilhos de 500 mil toneladas pode custar US$ 1,5 bilhão
O material é procedente de países da Europa, como a Polônia, e da Ásia, com destaque para China.
A cidade mineira sempre reclamou da falta de investimentos da Vale. Logo que assumiu a prefeitura, há dois anos, Elisa Maria Costa (PT), procurou costurar uma "agenda positiva" com a mineradora, ainda na gestão do então presidente Roger Agnelli. O projeto da construção de uma fábrica de trilhos, divulgado agora pelo governo mineiro, chegou a ser conversado e proposto a Elisa na ocasião, mas até hoje estava em "banho maria".
Do que foi acertado com a prefeita, em 2009, a única coisa que saiu do papel foi a obra de construção de uma grande passagem de nível no centro da cidade. Outras duas estão em andamento, uma no bairro Sotero Ignacio Ramos (SIR) e outra no bairro Santa Rita. A população de Valadares ainda passa por cima dos trilhos da Vitoria a Minas nesses bairros, correndo risco de vida.
Outras promessas da Vale, agendadas com a Prefeitura local, são a de fazer um parque municipal ao pé da Pedra de Ibituruna, um dos locais mais famosos de Valadares e revitalizar a Praça da Estação.
O valor do investimento não foi revelado, mas em reportagem do Valor sobre o tema este ano, um ex-dirigente da Valec informou que uma fábrica de trilhos exige investimentos em torno de US$ 1,5 bilhão. A produção das barras de aço carbono exige tratamento refinado para evitar riscos de fragilidade do material. No processo de fabricação, o trilho demanda, por exemplo, por tratamento térmicos especiais, como a vácuo.
Valor Econômico
10.08.2.011
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